terça-feira, 3 de dezembro de 2013

POLÍTICA: Eu também me confesso «mau» socialista!

Já não bastava António José Seguro colocar-se a jeito para a sempre repetitiva condenação da direita quanto á governação socialista de José Sócrates - dando assim o flanco numa batalha para a qual o adversário não revela o mínimo escrúpulo em mentir, caluniar e deturpar - e continuamos a constatar um conjunto de intervenções mediáticas de alguns socialistas, que têm muito pouco de … socialismo!
Os textos publicados por Luís Amado, Francisco Assis ou Correia de Campos podem dar muita satisfação a quem da direita se dá ao trabalho de os ler, mas surgem a contracorrente do que pensa a grande maioria dos socialistas, que se vão manifestando através das redes sociais. O que justifica o artigo hoje publicado por Manuel Alegre no «Público», onde elenca um conjunto de características atribuíveis aos «bons socialistas», tais quais a direita e os interesses por ela representados gostariam de ver maioritários na oposição, em contraponto com as que são assumidas pelos «maus socialistas» em que se integra ele, e decerto todos quantos estiverem presentes na sessão da Aula Magna promovida por Mário Soares ou desejariam ter podido ali deslocar-se.
Não admira que Manuel Alegre se coloque do lado dos «maus socialistas», a exemplo de muitos outros socialistas, que já deram muito ao partido e ao país, e continuam a ser referências para a maioria dos militantes, exceto para algumas mentes Brilhantes, que por ali acolitam o secretário-geral.
Dado que para a direita o «bom» socialista é, no dizer do poeta, aquele que:
· em diferentes circunstâncias diz as coisas sensatas que a direita gosta de ouvir: que é preciso rever a Constituição, fazer um pacto de regime, negociar um consenso com o Governo sobre as medidas de austeridade.
· defende que “ o arco da governabilidade” se restringe à direita e ao PS.
· revela abertura para um eventual governo de coligação com os partidos da direita, ou só com o CDS, ou uma reedição do “bloco central”.
· aceita as “reformas” que tendem a transformar em assistencialismo a garantia de direitos sociais pelo Estado.
· colabora em medidas que desvalorizam o trabalho em nome de um pretenso aumento da competitividade.
· dá prioridade à estabilidade financeira em prejuízo do desenvolvimento económico e da coesão social.
· aceita o aumento das desigualdades como consequência inevitável da globalização e considera que não há alternativa.
· pensa que a divisão entre esquerda e direita não passa de um arcaísmo.
· tem um vocabulário cuidado e evita palavras inconvenientes, não diz roubo, diz cortes, não diz desemprego, diz requalificação, não diz empobrecimento, diz ajustamento.
· respeita a duração dos mandatos, haja o que houver, pois acha que a estabilidade política é um fim em si mesmo,  ainda que à custa de instabilidade e crise em todos os sectores.
· obviamente não critica o senhor Presidente da República, nem a troika, nem os mercados, nem as instituições europeias, nem a bondade das políticas da senhora Merkel, mesmo que elas levem o país à ruina.
· procura dizer frases que o ponham com setas para cima nos jornais ditos de referência.
· acredita que o estatuto de bom político só lhe pode ser conferido pela direita.
· não pode sequer ouvir falar de convergência com os partidos à esquerda do PS.
· acha que o dr. Mário Soares é o maior político português, mas não devia ir para a Aula Magna promover iniciativas tendentes à convergência e mobilização dos descontentes com a política do governo.
Por seu lado, e na mesma lógica do que interessa à direita, o «mau» socialista será aquele que:
· teima em defender a Constituição, o Tribunal Constitucional e coisas tão arcaicas com o Serviço Nacional de Saúde, a Escola Pública, a Segurança Social, os direitos laborais, o direito à cultura, a igualdade de oportunidades.
· persiste em dizer a palavra socialismo, repete constantemente a palavra esquerda, opõe-se a governo de coligação dentro do “arco da governabilidade” e recusa-se a fazer do PS o terceiro partido da direita.
· acha que os direitos sociais são inseparáveis dos direitos políticos e que não há estabilidade política sem estabilidade e coesão social.
· entende que nenhum órgão de soberania deve andar com outro ao colo e que o papel essencial do Presidente da República é ser o garante do regular funcionamento das instituições e o Presidente de todos os portugueses.
· defende que a confiança dos eleitores é mais importante que a confiança dos mercados e que estes não podem sobrepor-se nem à democracia nem ao Estado.
· vê a Europa como um projeto de paz e de prosperidade entre Estados soberanos e iguais e não como uma submissão dos mais frágeis ao mais forte.
· tem a indiscrição de querer saber perante quem é que a troika responde e quem avalia as suas políticas.
· pensa que neste momento o processo democrático e institucional da construção europeia está interrompido.
· acredita que ser europeu não é dissolver a Pátria.
· continua a considerar que a razão histórica de ser do socialismo é a emancipação politica, social, económica e cultural dos trabalhadores e de todos os desfavorecidos e oprimidos.
· dá razão ao Papa Francisco quando este denuncia que o atual poder económico está a transformar-se numa nova tirania.
· é politicamente incorreto e sustenta que há sempre alternativas.
Depois dessa separação de águas entre o que a direita considera um «bom» socialista de um «mau» socialista, Manuel Alegre conclui com o orgulho, que se lhe conhece: sou um mau socialista.
E o que Manuel Alegre confessa é o que, nesta altura, subscrevem milhares de socialistas apostados em verem o seu partido fazer oposição com mais determinação e coragem.


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