sábado, 31 de dezembro de 2022

D'Alema di' qualcosa di Sinistra

 

1. Não sei se Carmo Afonso tem razão quando identifica uma das especificidades da arte de ser português: “bons a conseguir o impossível, péssimos a gerir uma situação de vantagem”. Mas António Costa tem-no sobejamente demonstrado no ano em curso: em vez de aproveitar as excecionais condições suscitadas pela maioria absoluta para melhor superar os condicionalismos impostos pela pandemia e pela guerra na Ucrânia, perdeu quase um ano a gerir casos e casinhos, que uma central de conspiração das direitas tem vindo a plantar habilidosa e cirurgicamente. E  somando-se-lhe um presidente que até se baba por o ter na mão, lembrando-lhe que a arma atómica está ao seu dispor e usá-la-á tão só sinta Passos Coelho ou outro qualquer dos seus acólitos em condições ideais para dar esse golpe.

2. Não é que a choruda indemnização a Alexandra Reis fizesse falta para o sabermos, mas ela só confirma o despautério dos betos da Iniciativa Liberal, quando ululam quanto à existência de um tenebroso «socialismo» à frente da máquina do Estado. Como escreveu João Rodrigues no blogue Ladrões de Bicicletas estamos em neoliberalismo puro e duro. Estamos perante as consequências de décadas de redução dos direitos laborais e do poder sindical, correlativos de aumentos dos direitos patronais: paraquedas dourados para os de cima, presumindo-se que os de baixo sabem voar. E daí a conversa peçonhenta do empreendedorismo.”

Não estamos muito longe da conhecida cena do filme de Nanni Moretti em que ele vê o líder da esquerda italiana na televisão e lhe pede para que diga algo de acordo com esse suposto posicionamento político. E, associando-o a António Costa, acrescentemos-lhe mais um pedido: que o faça, provando que o socialismo não é só uma palavra, mas uma ideologia transformadora do muito que está mal e é urgente ser alterado!

sexta-feira, 30 de dezembro de 2022

Recuperar a liberdade de mudar e decidir

 

Lamentaria a saída de Pedro Nuno Santos do governo se acreditasse na sua morte política. Mas nem as direitas partidárias, muito menos as da comunicação social, que o têm erigido em alvo preferencial, se iludem com essa possibilidade. Fica a exceção do jagunço do costume, mas esse só é para levar a sério enquanto demagogo mentiroso, que engana, e enganará, o lumpen ao serviço dos que, por trás dele, se acoitam como verdadeira e sempiterna ameaça.

Haverá quem se satisfaça com a vitória nesta pequena escaramuça, mas sem comemorações a sério porque sabem serem outros os contornos da verdadeira guerra lançada contra quem foi o melhor e mais competente ministro deste governo. Porque, ao invés de António Costa, que quer mudar o país passo-a-passo, Pedro Nuno anseia pelas transformações desejadas por aqueles que não esquecem a canção do Sérgio Godinho sobre ser urgente o fluir da torrente para quem tem sentido a vida parada. Precisamente por responsabilidade maior dos que são titereiros dos que, multiplicam contínuos dislates manipulatórios, que acabarão por fartarem os ouvidos de quem desconfia não ser verdade a repetitiva elocução das mentiras.

Doravante como deputado, e com a liberdade de prosseguir o trabalho de contacto com os militantes e simpatizantes socialistas de norte a sul do país, Pedro Nuno Santos fará o seu caminho para revigorar um partido, que arriscaria ficar anémico se não viesse a ser estimulado com a sua  determinação para melhorar a vida dos portugueses. 

quarta-feira, 28 de dezembro de 2022

Quando os yuppies são nomeados para o governo

 

O que mais lamento no triste caso da curta passagem de Alexandra Reis pelo governo é a falta de exigência imposta por António Costa em quem convida para a sua equipa.  Somam-se os exemplos de quem, agindo supostamente dentro da legalidade que os contorcionismos interpretativos possibilitam, faz-se convidado para onde não só se impõe irrepreensível seriedade, mas também, como à mulher de César, indubitável aparência em assim ser. É o conflito entre a lei e a ética, que, como Carmo Afonso, hoje reconhece, suscita um sentimento de injustiça, quando apreciado à luz de demasiados princípios.

Não estranho que surjam muitas Alexandras deste tipo nos palcos políticos e sociais: se as gerações que viveram a Revolução de Abril ainda envergaram preocupações ideológicas, as que lhes sucederam depois do triunfo do reaganismo e do thatcherismo sobre as utopias igualitárias, passaram a defender, sob a falácia meritocrática, o “sucesso” de uma economia apostada em dar menos aos pobres para melhor premiar os que anseiam ser ricos. Daí nos não admirarmos por a ex-secretária de Estado ter-se tão bem feito premiar depois do seu papel ativo na redução dos rendimentos dos trabalhadores da TAP. O egoísmo desta geração de tecnocratas exclui qualquer sentimento de generosidade, solidariedade e empatia com os que menos recebem. 

Daí a incompatibilidade de Alexandra Reis com um governo, que se diz socialista. Embora nos deva preocupar a escolha que, a seguir, Costa e Medina, farão para a substituir. É que o seu histórico de opções anda a ser posto em causa com inquietante frequência para que aceitemos de bom grado as responsabilidades da tal «bolha mediática», que se limita a aproveitar os tiros nos pés por eles autoinfligidos! 

segunda-feira, 26 de dezembro de 2022

A corrupta Eva e o impoluto Barroso

 

Só soube da existência de Eva Kaili, aquando das notícias sobre o raide da polícia belga ao seu apartamento, lá encontrando resmas de dinheiro de proveniência duvidosa. Pretexto para que as vozes mais mediáticas do PPE entoassem hossanas por se tratar de alguém do grupo Socialista, logo suspeito de generalizada venalidade.

É provável que a Eva em causa seja uma alma gentil sentada num nada etéreo assento, e ainda atónita com acontecimentos sobre os quais só pode penalizar-se pela cândida inépcia. É que são tão óbvios os negócios escuros alimentados pela multidão de lobistas nos corredores do Parlamento Europeu, que não se veria talhada para chamariz incumbido de desviar atenções daqueles que lucram muitos milhões em vez dos seus ridículos milhares.

Poderia ter aprendido, por exemplo, com o Prémio Sakharov deste ano, capaz de aliar a autopromoção quotidiana, enquanto «herói» da resistência das «Democracias» europeias à agressão da ditadura putinista, com as lautas contas em paraísos fiscais, que insuspeito consórcio internacional de jornalistas denunciou no âmbito dos Panama Papers.

Ou, melhor ainda, imitar Durão Barroso, cujo «impoluto» curriculum incluiu a milionária remuneração na Goldman Sachs, parte significativa do pacote de contrapartidas por ser uma das mais esforçadas marionetas ao serviço do Pentágono e da Casa Branca no esforço de manter a Europa avassalada aos seus interesses, desarmada do seu potencial para ascender a superpotência rival. A recente notícia da sua substituição no banco em causa significará a desvinculação dos mais comprometedores laços para entrar na corrida pela sucessão de Marcelo em 2026?

 A pobre Eva é uma espécie de espantalho metido vistosamente no meio de pífia leira para que as aves de rapina do costume se deleitem com a habitual e despreocupada pilhagem dos fecundos campos que mais lhes interessam. 

sexta-feira, 23 de dezembro de 2022

Ma che cosa ci posso fare?

 

Estamos quase no Natal e desconheço se ainda existe um espetáculo italiano de canções infantis, que via no tempo em que a minha filha tinha meia dúzia de anos: o Zecchino d’Oro.

Desse tempo ficou-me uma canção, cujo título parece ajustar-se, como uma luva, ao atual líder da oposição: Ma che cosa ci posso fare?

O homem bem se esforça a andar numa azáfama de norte a sul do país multiplicando discursos para os telejornais, mesmo não se lhe conhecendo uma única ideia, uma ideiazinha que fosse!, para o país. Mas os resultados andam pífios como fica evidenciada na sondagem agora conhecida e assinada pelo ISCTE para o Expresso. Apesar do assumido desconforto dos portugueses com o governo, que entendem aquém do que se lhe poderia exigir nesta altura, acaso houvessem eleições lá teríamos a forte probabilidade de recomposição da Geringonça que, no seu todo sobe acima aos 50%, porque aos 49 somados entre o PS, o Bloco e a CDU ainda há a contar com o Livre metido na amálgama dos Outros, que equivalem a mais 5%.

Montenegro, pelo contrário, poderia associar os seus 29% aos 9 do Chega e aos 2 da Iniciativa Liberal para superar a irrelevante barra dos 40%, contando que  só a superaria se, a exemplo do partido de Rui Tavares à esquerda, tivesse o de Nuno Melo à direita.

Em suma as direitas enleiam-se nos seus conhecidos labirintos: entre mais ou menos populismo e spins de imaginativa irregularidade, não conseguem cheirar o pote a distância bastante para lhe adivinharem o conteúdo. E a argúcia do primeiro-ministro, apoiada nos dinheiros do PRR, ajudarão a suplantar as contrariedades suscitadas por uma inflação, que tende a estabilizar-se e por uma guerra que Biden sabe não poder prolongar por muito tempo se quiser segurar a Casa Branca daqui a dois anos.

Adivinham-se muitas frustrações lá para as bandas alaranjadas, fascistas ou, indisfarçavelmente, betinhas.

quinta-feira, 22 de dezembro de 2022

Uma fútil viagem para gáudio de algumas majorettes

 

Sempre fugi da leitura das guerras em que os norte-americanos estão envolvidos - diretamente como sucedeu no Iraque ou, indiretamente, na Ucrânia como agora se verifica! - através das reportagens dos jornalistas e comentadores das televisões lusas.

O tom heroico, outrora usado pelos Albarrans de serviço, continua a ser o mesmo do que agora o assume gente apenas capaz de olhar para os factos numa descolorida paleta de cores, só com o preto e o branco como alternativas. Quando se adivinha que, por serem duas faces de uma mesma moeda - como a ilegalização de partidos da oposição - Putin e Zelenski se equivalem em práticas nada conformes com a “democracia” dita liberal...

Agora o comediante ucraniano foi aos Estados Unidos para limitar os danos de haver uma nova maioria no Congresso bem menos simpática para si do que o tem sido a dos democratas. Ciente do seu papel de provedor dos interesses dos anfitriões no seu invadido país, invocou que não será caridade as armas e, sobretudo, o dinheiro a ele confiados. Embora sem dar garantias que uma parte desses dólares não vá parar ao sítio onde os jornalistas do consórcio internacional descobriram ter escondido os seus, conforme explicitados nos dados referentes aos Panama Papers. E, na visita à Casa Branca até poderá ter abordado com Biden Sr. as condições para que o seu júnior prossiga com os negócios em Kiev, que Trump tentou utilizar em seu proveito, quando os classificou de duvidosos numa lógica de se ser fundamentado juiz quem por si mesmo se julga... 

Ao que leio nas redes sociais houve jornalistas do género feminino, que exultaram com a visita em causa com o histérico entusiasmo das majorettes. E não terá sido provavelmente menor o entusiasmo dos dois marretas (Milhazes & Rogeiro), que lhes vão servindo de coro!

Azar o dos ucranianos, sabedores do que se seguirá: quando o urso do Kremlin se sente picado desata a atirar com todos os mísseis que tem disponíveis sem olhar contra quem nem onde. E isso traduzir-se-á em mais uns quantos mortos, civis e militares, a acrescentar ao longo rol de vítimas de uma guerra iniciada por conta de um antigo império que, na irreversível decadência, decidiu dar um derradeiro assomo da suposta e perdida grandeza numa desenfreada tentativa de expansão, que tem tudo para lhe correr mal...

E, no entanto, continua a faltar quem dê a Guterres a oportunidade para cumprir o seu papel, calando as armas e juntando a comunidade internacional numa séria iniciativa de paz. Azar o seu - e o dos ucranianos, dos russos e até nosso por lhe sofrermos os efeitos colaterais! - os norte-americanos continuam dispostos a investir no seu mandarete aquilo que recusaram a outro que, porventura, poderiam ter em Cabul e evitasse às raparigas afegãs a triste sina imposta pelos sinistros talibãs. Mas, por estes dias, embora muita gente continuara a morrer na Síria, no Iémen e outras geografias, as atenções centralizam-se nas que o Pentágono maior interesse tem em que isso suceda!