segunda-feira, 31 de maio de 2021

Espingardices, vociferações, cacarejices e xexejices

 

Eu sei que Marcelo espingardou, Rio vociferou, Catarina cacarejou e até Pinto da Costa xéxéxizou. Mas daqui a uma semana alguém se lembra da Liga dos Campeões nas Antas ou do comportamento dos hooligans ingleses, provavelmente até bem mais comedidos do que de costume?

Se alguém poderá recordar este súbito afluxo turístico serão os que beneficiarão com a boa imagem de marketing transmitida por um país, que tem a pandemia relativamente controlada e onde é seguro vir passar férias. Porque, nas reportagens televisivas, não faltaram elogios à beleza da cidade do Porto e à simpatia dos portugueses, valendo por si muitas e dispendiosas campanhas publicitárias além-fronteiras.

Mas que fazer, quando Marcelo & Cª julgam possível repetir com António Costa aquilo que fizeram com Sócrates há década e meia atrás: esse permanente chorrilho de insinuações, notícias deturpadas e outras coisas que tais capazes de operarem na imagem do governo a das dunas permanentemente assoladas por vagas dispostas a fazê-las desaparecer.

O problema com esses detratores é António Costa ser mais racional e contido do que o «animal feroz», que então procurava dar um rumo visionário para o país, levando-o da sua retrógrada condição (não queriam as direitas transformá-lo numa espécie de Bangladesh europeu capaz de cativar investidores estrangeiros à conta da mão-de-obra barata?) para a de economia próspera e desenvolvida. Aquela para onde António Costa aponta o caminho tão-só se vença o constrangimento destes últimos dois anos. E que todas as sondagens demonstram ser objetivo da grande maioria dos portugueses.

As direitas não aprendem que uma receita bem sucedida com o governo que demoliram até ao PEC4 dificilmente se repetirá outra vez! 

sábado, 29 de maio de 2021

Se o Manuel o diz...

 

Foi muito natural que a data de 28 de maio tenha sido escolhida pelos saudosistas da ditadura salazarista para iniciarem o seu congresso, ademais numa cidade que lhes dera agruras e as voltou a repetir ao som da palavra de ordem “Ninguém atura o facho do Ventura!”. Muito embora se quisesse iludir com a falsa decuplicação dos votos em pouco tempo, o cabeça-de-cartaz, cujo inchado ego o levou à tribuna umas quantas vezes, ou se sabe vigarista ao nível do mais serôdio vendedor de banha-da-cobra, ou há-de descobrir-se como um daqueles casos de patológica megalomania, ganhando lugar ao lado dos que andam de mão ao peito e afiançam ser Napoleão ou olham para os ramos das árvores e juram ver ali senhoras brilhantes a anunciarem segredos tão palpitantes quanto os dos pastorinhos de Fátima.

Para já, e sinalizando o empalidecimento que o espera, convidou Matteo Salvini para com ele partilhar o momento culminante do evento. Ainda ninguém lhe terá contado que o bufão da Liga do Norte está em queda acentuada nas sondagens e tem uma tal Georgia Meloni, ainda mais fascista do que ele, a morder-lhe as canelas. Convidasse-a a ela e sempre poderia tentar as apregoadas artes do Zézé Camarinha junto das inglesas no Algarve, ganhando-se daí alguma coisa (a sempre sensata hipótese de só se estragar uma casa em vez das duas onde tentam perorar!).

Quem pode carpir-se com o espetáculo das direitas durante esta semana é o diretor do «Público», que não deixa de revelar assinalável lucidez ao escrever que elas vão vagueando “entre o sebastianismo encarnado por Passos Coelho, o discurso cavernícola da demagogia ou o saudosismo revisionista do Estado Novo”. Se é o Manuel Carvalho a constatá-lo, de que vale nós acrescentarmos mais o que quer que seja?

sexta-feira, 28 de maio de 2021

Sinais do que tende a acontecer

 

Existem fotografias e pequenas notícias, que parecem valer pouco, mas comportam uma carga simbólica, que indiciam as incontornáveis tendências futuras. A imagem acima, de cumplicidade entre dois antigos presidentes brasileiros, que muito discordaram entre si enquanto Bolsonaro não ocupou o Palácio do Planalto, é bem reveladora do que se anuncia: sentindo imprestável do atual titular do cargo para os seus interesses a burguesia tucana, que Fernando Henrique representa, sabe inevitável o regresso de Lula da Silva e apresta-se a dar-lhe o aval. Razão para os militares e os latifundiários da industria agroalimentar, que destroem a Amazónia e o Pantanal, sentirem-se cada vez mais isolados, não só porque demonstraram à saciedade a sua patética incompetência como desclassificaram o Brasil de prometedor Bric numa ainda mais subdesenvolvida e miserável realidade.

Por seu lado a Irlanda foi o primeiro país europeu a chamar os bois pelos nomes considerando «anexação» aos colonatos israelitas na Cisjordânia. Se a isso somarmos a intenção do governo de Macron em considerar a forte probabilidade de se instalar o apartheid nas cidades israelitas onde judeus e árabes têm vivido num ambiente de iminente guerra civil, convenhamos que, mesmo com Biden a nada alterar do que foi a política de Trump para o conflito em causa, a posição sionista tende a fragilizar-se.

A concluir fico-me com o editorial de Ana Sá Lopes no «Público» de hoje quando quer atribuir ao verdadeiro vencedor da Convenção das direitas uma qualquer explicação esotérica: “Não deve haver na história da política portuguesa um cidadão com mais sorte do que António Costa. (...) Costa deve ter nascido sob uma conjugação astral diferente da do comum dos mortais.”

Para a jornalista em causa seria fácil dar a devida importância àquilo que ela reconhece nas entrelinhas do seu texto: que a moção de estratégia de António Costa ao Congresso tem uma Visão para o país, que as direitas nem com lentes duplas conseguem divisar. A sua credibilidade advém de saber para onde irmos para que, enquanto sociedade fiquemos mais prósperos, resilientes às mudanças e com menos desigualdades. E isso é algo que mais ninguém consegue sugerir para quem vota. Por isso não admira o grande sinal que as sondagens reiteradamente preveem.

Petulâncias convencionais

 

Razões pessoais têm-me impedido de dar à política, a atenção que costumava dedicar-lhe quando aquelas não tinham a atual pertinência. Por isso mesmo surpreendo alguns amigos, quando me telefonam em busca de novidades e, depois de as enfileirar de acordo com as circunstâncias do momento, me pedem opinião sobre um qualquer assunto de primeira página e eu nem sequer sei do que estão a falar. As mais das vezes constato que têm precisamente alguma relevância mediática nesse dia, mas logo acabam esquecidos, porque não chegam a pegar o rastilho intentado pelos seus candidatos a incendiários. Porque as mais das vezes são fake news ou, no mínimo, suposições infundamentadas, que pretenderiam comprometer algum membro do governo e, muito particularmente, António Costa.

Porque não conseguem expandi-las para além dos habituais círculos complotistas antigoverno acabam cingidas à sua nula importância.

Ontem, porém, dediquei-me a ler o jornal da Sonae de fio a pavio para constatar o quanto as nossas direitas incorrem na mesquinha petulância, bastando para tal olharmos para os discursos dos participantes dessa coisa esdrúxula ocorrida ali para os lados da Junqueira.

Em aparência não faltou quem subisse ao púlpito com a atitude arrogante e vaidosa de quem possuiria alguma qualidade merecedora de ser enfatizada. O exemplo mais evidente foi o de quem na véspera fora condenado por ofensas a pessoas de bem e disse-se representante da terceira maior força política em Portugal sem a qual as direitas não chegarão ao pote. Faltando ainda muita lavagem dos cestos logo se verá qual será o seu efetivo peso eleitoral quando  ocorrer essa vindima. Em fanfarronice não há quem o vença por esta altura.

Mas convenhamos que sendo a falta de predisposição para o diálogo outra das características dos petulantes todos os líderes das forças parlamentares das direitas deram sobejas provas das razões que levaram muitos comentadores a referir que o maior vencedor desta convenção foi ... António Costa! Porque as direitas andam a segmentar-se de modos tão singulares que todas parecem convergir no ataque prioritário a quem supostamente estaria em condições delas se lhe subordinarem acaso pudessem imitar os Açores enquanto modelo de governo sem ideias, sem projeto, mas fundamentalmente concebido para atribuir sinecuras e prebendas.

Sabe-se, também, que o petulante é um ser inseguro, ansioso por ver acariciada a autoestima e valorizado o ego. Desde um que disse nada ter a ver com o centro, que está no próprio nome do partido, até ao que ficou aliviado por tirarem da sua vista a palavra «Direita», com a qual não quer ser confundido, muito embora ninguém duvide do lado para que pende inequivocamente a sua orientação ideológica, a Convenção em causa acabou por ser uma indigesta busca de Godot com o sofá do tio Sigmundo a fazer ali muita falta para resolver umas quantas dúvidas quanto à própria identidade.

Houve ainda outro tipo de petulância, aquela que se confunde com a superioridade, julgando heroicos os feitos passados bastando cultivar o silêncio e a aparente humildade de só ter comparecido para ouvir os demais para cultivar o mito do sebastião desaparecido em dia de nevoeiro, mas pronto a regressar assim por ele suspirem os órfãos das prometidas derrotas futuras.

No fundo os únicos que não se revelaram petulantes ao comparecerem à chamada foram os quatro «socialistas», que serviram de berloques nas lapelas dos organizadores. Mas esses, coitados, ainda que merecedores de qualitativo a começar por p, não justificaram o uso de tantas letras. Foram simplesmente parvos.

A grande novidade da leitura do jornal em causa acabou por ser a crónica da última página, aquela que é confiada a João Miguel Tavares e em que ele conclui que, relativamente à sentença favorável à família do Bairro Jamaica, “o tribunal tem toda a razão. A demagogia às vezes sai cara — e chegou a hora de Ventura pagar.” O que significa basicamente isto: prevendo que aquela excrescência partidária anticonstitucional não tem grande futuro, o articulista já se está a querer dela pôr-se a milhas. O que não deixa de ser elucidativo!

terça-feira, 25 de maio de 2021

Os tempos não correm de feição para aquelas bandas

 

É mais da ordem do simbólico do que do efetivo dano para os bolsos de André Ventura a condenação judicial a que foi sujeito face à reclamação de uma família do Bairro Jamaica a quem ofendeu durante um debate presidencial. Se até agora as suas difamações e declarações anticonstitucionais tinham gozado de reiterada impunidade por parte de quem as deveria averiguar e punir, ele poderá ver-se-confrontado com crescentes limitações a esse extravasar da sua detestável índole tão-só haja quem imite os ofendidos em causa e o faça comparecer em tribunal tantas vezes quantas as necessárias. Porque outra ameaça se perfilará, então, no horizonte e é o seu maior medo: que se acumulem argumentos e provas em como a legalidade do Chega é injustificável perante tão reiteradas violações do que prescreve o nosso texto constitucional. E talvez não lhe seja particularmente favorável à imagem a condição de fora-da-lei. Até porque, mesmo com Marine Le Pen ainda fortemente candidata a ganhar as presidenciais francesas do próximo ano, as auras vencedoras de outros líderes das extremas-direitas vão empalidecendo, sobretudo a partir do momento em que Trump deixou de ser-lhes uma espécie de amuleto sagrado.

É por isso mesmo que não sendo ainda a sanção judicial que o país merece - a definitiva ilegalização do Chega - a sentença agora anunciada poderá representar o início do fim deste execrável epifenómeno. 

segunda-feira, 24 de maio de 2021

Eles prometeram travar um eventual governo das direitas!

 

Terei ficado satisfeito com o discurso final de Catarina Martins na Convenção do Bloco de Esquerda e em que volta a fazer profissão de fé na convergência das esquerdas? Posso dizer que fiquei no nim: nem agradavelmente impressionado, nem propriamente insatisfeito.

Constato, porém, que a lista vencedora teve menos percentagem de votos que no encontro anterior, indiciando um aumento de implantação dos mais radicais, aqueles que preferem deitar tudo a perder em proveito de uma agenda intransigente capaz de lhes satisfazer os umbigos, mas prenunciadora de derrotas dolorosas para a maioria da população, Quem andou por essas extremas - e eu também por lá andei nos verdes anos! -, sabe bem quão pródigas são em gente do tipo quanto pior melhor!

Ridícula igualmente a insistência de Louçã ao prever maravilhas quando «Mariana Mortágua for Ministra das Finanças». O facto dela ser uma parlamentar competente e, sobretudo diligente nas Comissões Parlamentares, não lhe confirmam competências para sentar-se na cadeira de Centeno ou de João Leão. Sobretudo, porque lhe falta a maturidade para ter o sentido das realidades e compreender quanto importa caminhar para os objetivos com passos porventura mais curtos do que se desejariam, mas que evitam indesejáveis recuos.

No balanço fica a expetativa de ver o Bloco coibir-se de repetir o erro clamoroso de 2011, que nunca esqueceremos: se Passos Coelho assumiu as funções do governo que queria ir além da troika a Louçã o devemos. E isso é mácula de que não se livra o atual conselheiro de Estado.