Em 1985, quando regressei ao Partido Socialista depois de uma passagem fortuita por esquerdas mais extremas - mas relativizada, porque passei grande parte desses dez anos a navegar pelos oceanos desse mundo do que propriamente nesta específica geografia! - João Cravinho teve um papel determinante. Na época, ouvi-lo na sede do Rato a dar verdadeiras lições de estratégia política e de visão quanto ao futuro, fez-me convencer que deveria replicar-lhe a capacidade de análise, conciliando a formação de base científica com a de economia. Por isso tomei-o como modelo ao decidir-me a complementar o currículo de engenheiro com a de gestor, matriculando-me no então ISEG (embora depois transitasse para o ISCTE).
Vítor Constâncio era o secretário-geral, o gabinete de estudos tinha vários grupos a funcionar com regularidade e o cavaquismo, então emergente, parecia ser epifenómeno com termo anunciado muito embora se adivinhasse que aproveitaria os milhões vindos da Europa, por que Mário Soares tanto porfiara, mas, no seu ignóbil oportunismo, a direita acabaria por deles se aproveitar.
Nesses anos sempre vi e ouvi João Cravinho com gosto, sentindo que algo aprendia com o que afirmava. Por isso me custa tanto vê-lo, de há uns anos a esta parte, a deixar-se aproveitar pelas direitas, tornando-se seu instrumento quando se trata de atacar o Partido, que seria seu dever prezar. O fanatismo populista obnubilou-lhe a lucidez, porque deixou de o enquadrar dentro de uma lógica de direitos e deveres constitucionais e numa abrangência que exclui toda a arquitetura estratégica, que António Costa e o governo do Partido Socialista andam a implementar e que conseguirá o que ele proclama aos berros com a subtileza devida aos feitos que produzem efetivamente resultados.
É possível que Cravinho se insurja com a pequena corrupção, que é possível de detetar nalguns responsáveis locais do Partido e que tanto prejudicam a sua imagem. Mas parece que ela o incomoda bem mais do que a Corrupção com maiúscula que é apanágio dos grandes capitalistas e especuladores e merecem da generalidade da imprensa o beneplácito dado aos falsos heróis. Porque quem não se lembra dos anos de Cavaco em que se proclamava a excelência dos principais gestores portugueses? Hoje todos eles estão maculados com a ignomínia de que revestiram os seus atos, ou passam de mansinho por entre os pingos da chuva, mantendo as práticas e subsidiando lautamente a Iniciativa Liberal ou o Chega para que lhes assegurem futuro tão proveitoso quanto tem sido o seu passado,
Há uns dias quando vi João Cravinho num programa da SIC só pude lamentar a figura a que se presta, sendo evidente que é o putativo idiota útil para que se maldiga o Partido a que pertence. E eu que tanto o admirei só posso lamentar que tenha envelhecido tão mal e já não tenha a clarividência que, em tempos, me merecia rendida adesão...
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