quinta-feira, 23 de junho de 2011

A anunciada crise inglesa


David Cameron tem constituído um exemplo citado pelos colunistas de direita como político em vias de resolver os problemas do seu país. O que é uma tremenda mistificação, já que ele exerce o poder para garantir a preservação dos interesses dos mais privilegiados: a minoria está amplamente representada no governo conservador e liberal, já que conta com dezoito milionários entre os seus vinte e nove membros.
Ora, segundo estatísticas da OCDE, em 1980, os rendimentos dos 10% de britânicos mais ricos equivaliam a um pouco menos de três vezes os rendimentos dos 10% mais pobres. Em 2008, por efeito das políticas de Tatcher, Major e Blair, esse índice era de 3,6.
Não se espera de Cameron, que inverta essa tendência, que é particularmente penosa para os seus dois milhões e meio de desempregados.

Federalismo europeu: uma necessidade

Manuel Maria Carrilho publicou uma crónica no «Diário de Notícias» intitulada «A Ratoeira» e que vale a pena resumir. Para ele a Comissão Europeia tornou-se numa sombra do que foi, sem credibilidade nem iniciativa, como se demonstra o que se passa com a Grécia.
É que, para além da responsabilidade que os gregos possam ter nos problemas que estão a viver, importa assinalar que a grande causa desta crise europeia já estava anunciada há bastante tempo.
É que o princípio da criação do euro baseava-se numa ideia-chave - os Estados renunciavam à desvalorização da moeda como instrumento de política económica, em troca de uma garantia da estabilidade financeira.
Todavia, se em vez disso se caminha para duas categorias de Estados, os que conseguem empréstimos a taxas baixas e os que só os conseguem a taxas altas, então o euro está condenado. Porque todas as uniões monetárias que tiveram sucesso têm sido uniões económicas e políticas.
Quando a crise de 2008 rebentou, a União Europeia estava tão desprovida de meios para a enfrentar eficazmente como inconsciente dessa falha. A Europa encontrava-se então na pior das situações. Por um lado, porque estava ainda insuficientemente integrada para se proteger de situações pontuais ou isoladas, como a grega. Por outro lado, porque já estava demasiado integrada para que os efeitos do contágio não a afectassem.

Inevitabilidades das leis económicas?

No «Le Monde Diplomatique» surge um artigo interessante  do projecto «Economia com Futuro».
Ficam aqui alguns extractos, que permitem aprofundar a interpretação destes tempos perturbadores:
O sistema financeiro mantido á tona de água com o socorro dos Estados conseguiu transformar a crise financeira em crise da dívida soberana. A União Europeia escolheu a via da salvação a todo o custo dos bancos e de outros intermediários financeiros insolventes à custa dos cidadãos e da consolidação orçamental pela austeridade recessiva. Feita uma interpretação da situação que isentava as responsabilidades  os credores que alimentaram devedores deficitários a crédito barato, os custos desta escolha foram quase todos transferidos para os países periféricos, mais expostos e vulneráveis.
São terapias de choque orientadas para uma desvalorização interna, que promete conseguir o reequilíbrio da balança de pagamentos com desemprego, desprotecção dos desempregados e descida dos salários nominais.
Entretanto, o espaço público mantém-se entregue ao proselitismo dos que acham que o povo  tem de ser ensinado a aceitar as inevitabilidades de «leis económicas» supostamente naturais que actuam em detrimento dos interesses e aspirações da maioria.

Demagogia populista

Passos Coelho viajou em classe económica na deslocação ao Conselho Europeu, naquela que é a demonstração da mais primária demagogia populista, que aconteceu nos últimos anos.
Nestes primeiros tempos de (des)governação da direita serão expectáveis muitos outros episódios destes, que tenderão a criar a ideia de sacrifícios mais divididos por todos. Uma reelaboração não muito imaginativa do ditado popular «com papas e bolos se enganam os tolos».
Mas a lógica governativa perderá depressa esta máscara ao incrementar as dificuldades para os mais pobres e ao eximir aos bancos e a outros (poucos) privilegiados esses sacrifícios impostos pela troika.
Depois, depressa Passos Coelho entenderá que o povo, não quer sentir na liderança do país alguém que sinta seu igual. Com quem deseje partilhar uma viagem de avião ou de autocarro. Porque a função governativa envolve sempre uma forma de sacralização e esta sua banalização só contribuirá para mais rapidamente o culpabilizar de todos os malefícios vindouros. Porque o povo consegue ser extremamente virulento para com os que sente seus iguais, e muito mais complacente com quem sinta socialmente mais favorecido. Ou não tenha acontecido com a campanha contra Sócrates essa mesma via: a de o apresentar como um cábula vindo das beiras e sem qualquer relação com a classe social a que pretenderia ascender pelos seus gostos sofisticados.
É pena mas é a verdade comprovada pelos factos: a psicologia de massas da plebe tende a torná-la impiedosa com os iguais ou os mais fracos e vergonhosamente reverente perante os que parecem ser mais fortes socialmente.
Ao adoptar esta via populista, Passos vai expondo mais abertamente a sua frouxa personalidade. Aquela que o virá a precipitar no tal caixote do lixo para onde são despejados os irrelevantes...

segunda-feira, 20 de junho de 2011

O futuro à frente dos nossos olhos

Anos a fio as ideias ultraconservadoras, hoje ligadas ao neoliberalismo de raiz miltonfriedmaniana (a quem o novo ministro das Finanças dedica assumida devoção!), foram travadas pela existência do muro de Berlim.
Embora o mito comunista não se identificasse com a sua realidade, os donos do dinheiro e das empresas ocidentais temiam a possibilidade de contaminação ideológica das massas por si exploradas, que foram coniventes com as políticas social-democratas de sucessivos governos, fossem eles de esquerda (na Suécia de Palme ou na Alemanha de Brandt), fossem eles de direita, já que a sua raiz democrata-cristã também não deixava de dar ao Estado a importância reguladora e estimuladora de investimento que deveria ser a sua dentro de uma lógica keynesiana.
Chegámos ao ano zero em que os partidos socialistas quase foram erradicados dos governos europeus, perdurando em Espanha e na Grécia, aonde não tardarão a cair.
Até recentemente - e as eleições de 5 de Junho demonstraram-no! - tem sido a direita a aproveitar paradoxalmente a conjuntura criada pela derrocada do capitalismo financeiro a que está tão ligada.
Mas, a realidade está a mudar, e este ano anuncia-se como o da refundação da mesma esquerda e da sua capacidade em dar respostas consistentes aos desafios vislumbráveis já a curto e médio prazo.
Porque o fenómeno dos «indignados» está em crescendo em vários dos países da União Europeia e as dificuldades da população grega ganham tal dimensão, que dali sairá provavelmente uma revolução violenta, que servirá de dissuasor à temerosa direita ocidental, enfim confrontada com a sua excessiva deriva para a falta de regras do capitalismo selvagem.
O que se verifica nas ruas de Atenas não exclui a possibilidade de uma tal crise politica, redundar em sangue - e não apenas o dos revoltados - a correr nas suas calçadas.
É para essa eventualidade que os socialistas se devem preparar: sem se fazer anunciar um clima político completamente diferente deverá surgir. E caberá à esquerda a responsabilidade por canalizar revoltas anárquicas para movimentos consistentes de reformas capazes de pôr cobro a esta exagerada financeirização da economia.

Estamos feitos!

Passados dois dias sobre a apresentação do seu elenco governativo, a direita não consegue disfarçar três ilações óbvias: os ministros a serem empossados na terça-feira são segundas escolhas (Vítor Gaspar, Álvaro Santos Pereira), gente inexperiente que nada sabe do que supostamente irá gerir(Assunção Cristas, Aguiar Branco), académicos sem pensamento político consistente (o conjunto dos «independentes») ou políticos imaturos muito mais conhecidos pelo seu bota-abotisno (Portas, Passos) do que por qualquer visão iluminada quanto ao futuro.
Não admira que até nos media mais próximos dos seus conceitos ideológicos se tenha dificuldade em iludir a decepção. Esperava-se a selecção nacional com todos os craques, que tinham endereçado impiedosas críticas ao Governo de Sócrates e constata-se que nenhum deles quis sujar as mãos nas coisas práticas da governação.
O que temos é um misto de amadorismo e de imaturidade para enfrentar a mais grave crise das últimas décadas. Estamos feitos!

Cavaco Silva: um presidente faccioso

Está a ser escandaloso o apoio descarado de Cavaco Silva ao Governo de Passos Coelho. Ao contrário dos seus antecessores, que nunca deixaram de reivindicar o estatuto de representantes de todos os cidadãos, o actual inquilino de Belém passou os mandatos de José Sócrates a conferir-lhe, no máximo, uma nunca demonstrada solidariedade institucional, enquanto agora tudo faz para levar o primeiro-ministro ao colo. Assim se compreendem os esforços para que, iludindo os pressupostos constitucionais, ele venha a estar na cimeira da Ecofin e os discursos de crítica azeda contra o recente executivo.
Apesar de ser o político mais tempo vinculado a funções públicas, Cavaco Silva nunca tem demonstrado qualquer grandeza pelo que nunca ficará na História portuguesa por bons motivos. Ao contrário de Mário Soares, que tem lugar garantido pela sua acção antifascista e pela responsabilidade de garantir a entrada do país na comunidade europeia.
Mas, neste crepúsculo do seu mandato, ele já nem sequer tenta disfarçar o facto de ser o presidente dos cinquenta por cento de eleitores, que votaram na coligação de direita nas eleições de 5 de Junho. Porque os demais não podem senão censurar o seu óbvio facciosismo.
E, a prazo, quando a base social de apoio ao novo Governo for minguando por efeito da sua estratégia neoliberal, ele ficará associado às políticas erradas executadas com a sua conivência.
Perante a contestação crescente ao Governo seria importante contar em Belém com quem não estivesse tão conotado com este e servisse de árbitro capaz de libertar alguma pressão então acumulada.
Infelizmente não estará então em condições de exercer essa magistratura de influência. E, com o regresso dos socialistas ao poder na sequencia da derrota da direita nas autárquicas de 2013, restar-lhe-ão duas alternativas: ou reduzir-se à sua irrelevância ou resignar. O que seria uma novidade no nosso regime desde que o acossado Spínola fugiu para Espanha. Também ele derrotado na sua visão facciosa da realidade política, que deveria superintender.

sábado, 18 de junho de 2011

O PRINCÍPIO DE PETER LEVADO Á PRÁTICA

Olha-se para a composição do novo Governo e a sensação imediata é a ausência de pesos pesados. Como se Pedro Passos Coelho e Paulo Portas não queiram arriscar em quem, pela sua indiscutível competência, os faça sentir menorizados na sua autoridade . Ou, porventura, por não haver disponibilidade nesses potenciais governantes para se comprometerem com quem tem feito muito pouco na vida e agora é confrontado com um desafio muito acima das suas reais capacidades.
Será curioso verificar o que um Nuno Crato irá conseguir na educação já que professores e estudantes pouca sensibilidade mostrarão por quem possui uns conceitos teóricos agradáveis de ler em páginas de jornal mas nada de concludente soube apresentar como alternativa exequível para contrariar o belíssimo trabalho realizado em seis anos por Maria de Lurdes Rodrigues ou Isabel Alçada.
Como igualmente será de estar atento à actuação de Francisco José Viegas, reduzido a papel decorativo numa secretaria da Cultura aonde terá de responder ao mundo das artes e das letras quanto à redução dos já escassos recursos com que contava ultimamente Gabriela Canavilhas.
Ou como Paula Teixeira da Cruz lidará com juízes, advogados e demais intervenientes do mundo da Justiça, quando, a bem do pretendido pela troika, tiver de os confrontar com a redução dos interesses corporativos . Não bastará a sua verbosidade excessiva para calar o imenso clamor, que contra si crescerá tão só pretenda alterar, mesmo que minimamente, este estado das coisas.
E que dizer das pastas entregues ao CDS e que têm constituído o seu abono de família eleitoral - agricultores e reformados? Como irão explicar a frustração das expectativas de multiplicarem subsídios e pensões , quando não há dinheiro para mais do que os socialistas lhes conseguiram atribuir em seis anos?
A prova de fogo será dura para esta nova geração chegada ao poder, mas sem capacidade nem determinação para prosseguir o trabalho reformista demonstrado pelos primeiros anos de governo de José Sócrates. Depois travado quando as corporações se encarregaram de encomendar á imprensa os ininterruptos assassínios de carácter de que ele foi alvo anos a fio e quando a crise financeira e económica internacional obrigou a pôr na gaveta os projectos mais promissores.
Depois de culpar o Governo anterior pela situação, que obrigou a recorrer á ajuda internacional, o próximo Executivo irá ele próprio provar o veneno que andou meses a fio a subestimar. Doravante restar-lhe-ão duas desculpas para explicar a crescente contestação, que contra si se erguerá a partir do final do Verão: essa crise externa, que não constituía desculpa para Sócrates, mas enfatizada subitamente como entrave à sua governação e a tal pesada herança, que Pedro Passos Coelho promete não invocar, mas que outros não deixarão de por ele lembrar tão exaustivamente quanto puder perdurar nos seus desiludidos eleitores.
O principio de Peter aplicado à prática é o que melhor define a composição do novo Governo: depressa nele aferiremos o patamar de incompetência dos seus titulares!
E a equívoca confiança a ele atribuída pelos eleitores n as recentes legislativas não tardará a ser desfeita. Com as perdas e danos, que se adivinham...

sexta-feira, 10 de junho de 2011

JÁ LÁ VEM OUTRO CARREIRO

Ultrapassado definitivamente o ciclo Sócrates no Partido Socialista, justifica-se uma atenção participativa no debate que se segue, no qual se definirá quem será o novo secretário-geral: Francisco Assis ou António José Seguro.
No final de Julho já se saberá qual deles assumirá essa liderança, para a qual o país está particularmente vigilante já que são múltiplos os sinais de desconfiança quanto às reais capacidades da direita para levar a bom porto a condução do seu rumo.
Ontem isso foi tão evidente, que a iminente disputa no Partido Socialista mereceu mais destaque mediático do que as reuniões preparatórias para a formação do novo Governo.
É como se o eleitorado tivesse passado um cheque provisório a Passos Coelho na expectativa de possibilitar ao Partido Socialista a criação de uma alternativa mais credível.
Convenhamos que Passos Coelho voltou ao seu «melhor» depois de se aguentar sem grandes danos durante a campanha eleitoral: pretendendo alimentar o espaço mediático com algo, que iluda o incómodo vazio a ele respeitante decidiu vir com a ideia de uma tal Alta Autoridade para aferir o comportamento financeiro do país.
Como se já não sobrassem entidades para essa tarefa! 
A esse respeito faz lembrar o comportamento daquele tipo de associações em que,  à falta de acções efectivas para a resolução dos problemas colocados aos seus sócios, cria comissões para os estudar. Julgando assim estar a fazer alguma coisa!
Ouvidos sobre tal Alta Autoridade até os mais indefectíveis apoiantes de Passos Coelho se engasgaram sem saberem o que deveriam dizer em sua defesa.
O impasse financeiro em que a crise internacional mergulhou o país obriga a escolher lideranças determinadas e e com capacidade para agir. É um dirigente desse tipo, que o Partido Socialista irá eleger.
Quanto à direita consolida-se a ideia de não resistir mais do que dois anos aos efeitos da conjuntura, da pressão da troika e da movimentação social, que abrasará as ruas das nossas cidades. E, sobretudo à diferença de caracteres e de objectivos a longo prazo dos seus dois líderes.
Em 2013 surgirão provavelmente novas eleições legislativas. E o Partido Socialista não deverá, então, colocar outra fasquia, que não seja a de chegar à maioria absoluta. Já que não seja crível que o PC ou o BE mudem até lá de postura quanto à participação governativa, nem que algum dos partidos da direita possam salvar-se da fogueira, que atearam e em que irão agora queimar-se em lume brando.
Os tempos vindouros adivinha-se difíceis mas, parafraseando um verso de Zeca Afonso, já lá vem outro carreiro. Que este agora ainda agora aberto dirige-se para nenhures...

domingo, 5 de junho de 2011

É nas derrotas, que se lançam as sementes das vitórias que se seguem

Por esta altura estarão milhares de pessoas a agitar bandeiras laranjas nas ruas das nossas cidades. Por uma noite vivem a ilusão de uma vitória, que acreditam poder mudar-lhes as vidas, muito embora no caso da maioria delas só a desilusão as possuirá daqui a não muito tempo.
E pergunto-me se muitas delas não se interrogarão a esse respeito. Quiseram tanto afastar um homem em quem viram personificadas todos os defeitos, tal qual lhos repetiram os jornais e televisões durante anos a fio, que se esqueceram de pensar no que significam as políticas a implementar pelo novo Governo a ser em breve empossado por Cavaco Silva.
Quem andou nas ruas a gritar contra o fecho de maternidades e hospitais estará preparado para começar a pagar a saúde de acordo com o princípio do utilizador-pagador tão querido aos ultraliberais?
Quem insultou Sócrates por lhes tirar escolas ao virar da esquina, estará preparado para a difícil decisão de custear a educação, que deveria ser um bem acessível a todos?
De entre os que gritaram palavras de ordem em defesa dos seus interesses corporativistas, concentrando apoios contranatura de forças de direita e da esquerda comunista, estarão convencidos de que a troika continuará a garantir-lhos?
E os que não queriam portagens, julgarão livrarem-se delas daqui por diante?
O que escrevi aqui há já alguns dias mantém plena actualidade à luz dos resultados eleitorais, tais quais saíram desta noite eleitoral: em breve crescerão de norte a sul os movimentos sociais de contestação às políticas do Governo liderado por Passos Coelho. E Portas verá neles a possibilidade de corroer o parceiro de coligação sem se escaldar o bastante para perigar o seu desejo de vir a ser primeiro-ministro de Portugal.
E será nessa altura, com as finanças nacionais tão constrangidas quanto o estão actualmente as gregas, que o governo cairá. Ou seja, daqui a dois anos, quando o estafado argumento da pesada herança socialista já se mostrar demasiado gasto, nada salvará um Passos Coelho, que não tardará a dar mostras das limitações há muito demonstradas e próprias da forma frouxa como vê o mundo à sua volta.
É nessa altura, que o Partido Socialista deverá estar pronto para recuperar o seu lugar na condução dos destinos do País. Com uma liderança inteligente, que saiba aproveitar os erros dos adversários e, sobretudo, recupere para a memória dos eleitores o quanto se conseguiu nestes seis anos de governação. Porque, nessa altura, será tempo de lhe ser dada a oportunidade, que a direita (apesar da inteligência de Paulo Portas) não deixará agora de desperdiçar: uma maioria, um Governo e um Presidente. Até porque, agudizada a crise mundial do capitalismo, será a altura de a esquerda europeia demonstrar as soluções entretanto experimentadas pelos novos governos de esquerda de França, da Itália, da Alemanha e da Inglaterra.
Atrás de tempos, tempos vêm...

Nas derrotas estão as sementes das vitórias, que se seguem

Por esta altura estarão milhares de pessoas a agitar bandeiras laranjas nas ruas das nossas cidades. Por uma noite vivem a ilusão de uma vitória, que acreditam poder mudar-lhes as vidas, muito embora no caso da maioria delas só a desilusão as possuirá daqui a não muito tempo.
E pergunto-me se muitas delas não se interrogarão a esse respeito. Quiseram tanto afastar um homem em quem viram personificadas todos os defeitos, tal qual lhos repetiram os jornais e televisões durante anos a fio, que se esqueceram de pensar no que significam as políticas a implementar pelo novo Governo a ser em breve empossado por Cavaco Silva.
de de acordo com o princípio do utilizador-pagador tão querido aos ultraliberais?Quem andou nas ruas a gritar contra o fecho de maternidades e hospitais estará preparado para começar a pagar a saú
Quem insultou Sócrates por lhes tirar escolas ao virar da esquina, estará preparado para a difícil decisão de custear a educação, que deveria ser um bem acessível a todos?
De entre os que gritaram palavras de ordem em defesa dos seus interesses corporativistas, concentrando apoios contranatura de forças de direita e da esquerda comunista, estarão convencidos de que a troika continuará a garantir-lhos?
E os que não queriam portagens, julgarão livrarem-se delas daqui por diante?
O que escrevi aqui há já alguns dias mantém plena actualidade à luz dos resultados eleitorais, tais quais saíram desta noite eleitoral: em breve crescerão de norte a sul os movimentos sociais de contestação às políticas do Governo liderado por Passos Coelho. E Portas verá neles a possibilidade de corroer o parceiro de coligação sem se escaldar o bastante para perigar o seu desejo de vir a ser primeiro-ministro de Portugal.
E será nessa altura, com as finanças nacionais tão constrangidas quanto o estão actualmente as gregas, que o governo cairá. Ou seja, daqui a dois anos, quando o estafado argumento da pesada herança socialista já se mostrar demasiado gasto, nada salvará um Passos Coelho, que não tardará a dar mostras das limitações há muito demonstradas e próprias da forma frouxa como vê o mundo à sua volta.
É nessa altura, que o Partido Socialista deverá estar pronto para recuperar o seu lugar na condução dos destinos do País. Com uma liderança inteligente, que saiba aproveitar os erros dos adversários e, sobretudo, recupere para a memória dos eleitores o quanto se conseguiu nestes seis anos de governação. Porque, nessa altura, será tempo de lhe ser dada a oportunidade, que a direita (apesar da inteligência de Paulo Portas) não deixará agora de desperdiçar: uma maioria, um Governo e um Presidente. Até porque, agudizada a crise mundial do capitalismo, será a altura de a esquerda europeia demonstrar as soluções entretanto experimentadas pelos novos governos de esquerda de França, da Itália, da Alemanha e da Inglaterra.
Atrás de tempos, tempos vêm...

No comício de encerramento da campanha do Partido Socialista no Parque das Nações, António Costa já demarcou a linha intransponível, que os resultados de amanhã irão exigir: Pensaram que podiam cortar o PS às fatias, dizendo que uns eram bons e outros os maus. (…) No PS temos um lema, um por todos e todos por um.
Importa, pois, que depois de reconhecida a derrota eleitoral, o Partido dispense recriminações e intrigas, preparando-se para uma oposição cerrada à vitoriosa direita. Fazendo-lhe provar o veneno, que ela própria andou a destilar nestes anos de travessia pelo deserto do poder.
E como, ao contrário do PS, o PSD sempre tem vivido em clima de guerra interna permanente, é só uma questão de dar tempo ao tempo. Será da natureza da direita imitar o escorpião, que convencera o sapo a ajudá-lo a atravessar o rio para a outra margem. E, então, será a altura exacta para enfatizar o facto de ter existido uma determinação e uma estratégia bem definida para responder à crise.
Não terão sido as mais eficientes para estes tempos problemáticos, mas pior do que errar é não agir. Ora, os seis anos de governação socialista ainda deixaram tanto por fazer a nível da defesa do Estado Social!
Na véspera de uma derrota anunciada é a altura certa para começar a preparar as futuras vitórias...

sexta-feira, 3 de junho de 2011

Olhar para o dia seguinte!

As sondagens vão pressupondo uma vitória significativa da direita nas eleições do próximo domingo.
Será algo difícil de suportar, mas convenhamos que este aculturado povo está a precisar de viver um sério aperto por não ter valorizado devidamente um governo com obra feita ao longo de meia dúzia de anos.
Pelo contrário deixou-se levar pelos permanentes assassinatos de carácter perpetrados contra José Sócrates sem compreender que quem usa a difamação como estratégia é por não ter argumentos bastantes para demonstrar as suas razões.
Agora espera-nos um governo à deriva, que usará até à exaustão o argumento da «pesada herança», mas incapaz de compreender o quanto isso poderá valer-lhe no primeiro ano, já que no segundo nada lhe será perdoado. E Passos viverá o drama de ser um frouxo a contas com o maquiavelismo de um Portas decidido a mudar a correlação de forças na direita de forma a pretender alcandorar-se um dia à função de primeiro-ministro.
E, mesmo dentro do PSD, bem se sabe como ali se vive um ambiente irrespirável com facções dispostas a lutar pelos interesses de quem lhes paga enquanto «lobbistas» e outras decididas a conservar os que os contestam tão activamente, a começar pelas grandes corporações ligadas à justiça e à saúde. Sem esquecer as escolas, que se voltarão a incendiar à menor faísca.
Não vêm aí tempos fáceis para os portugueses, mas muito menos para o PSD de Passos Coelho, fadado para um fracasso semelhante ao de Durão Barroso, que saiu atempadamente do país antes que lhe começassem a cobrar as contas, que ele não saberia como pagar.
Daqui a um par de anos, quando Portas se sentir capaz de brigar pela vitória eleitoral, o Governo cairá. E o Partido Socialista deverá aproveitar esse momento para cobrar as ilusões desfeitas numa alternativa ultraliberal e prosseguir a obra reformadora por ora interrompida.
***
Um bom exemplo de como a direita pode ter muita prosápia verbal, mas não encontra qualquer solução miraculosa para uma crise - que o é do sistema capitalista no seu mais profundo fundamento - vive-se hoje em Inglaterra aonde se acentuam os sinais de um futuro devastador.  Escreve a esse respeito Paulo Querido no «Jornal de Negócios»: A redução de custos do governo britânico está a ir depressa demais - disse ontem, para surpresa geral, a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico. Dera apoio total às políticas de Cameron, mas agora está preocupada com os efeitos: a economia britânica está parada e o desemprego permanece altíssimo. Mas o problema maior começa a ser esta desorientação global patente aos mais altos níveis.
***
A falta de soluções para os impasses políticos e económicos vividos pelas nossas sociedades é tão evidente, que vai aumentando o número dos que já vão assumindo o que não querem, muito embora desconheçam o caminho alternativo a seguir. Em tempos que já lá vão as diversas versões de comunismo poderiam servir como estandarte viável, mas Gorbatchev e Ieltsin encarregaram-se de pôr fim a essas ilusões.
Se até o director do Jornal de Negócios se inquieta com os movimentos contestatários nas praças centrais das cidades espanholas e agora chegadas ao Rossio, podemos prever em mudanças iminentes: Também a Europa se subleva, mas contra outra ditadura. A ditadura da «financeirização» das nossas vidas. Das dívidas. Dos impostos que as pagam. De um modo de fazer política que prospera na excepção e acomoda a corrupção. Da falta de oportunidades, de empregos. De um certo nojo do sistema, que os exclui.