Por esta altura estarão milhares de pessoas a agitar bandeiras laranjas nas ruas das nossas cidades. Por uma noite vivem a ilusão de uma vitória, que acreditam poder mudar-lhes as vidas, muito embora no caso da maioria delas só a desilusão as possuirá daqui a não muito tempo.
E pergunto-me se muitas delas não se interrogarão a esse respeito. Quiseram tanto afastar um homem em quem viram personificadas todos os defeitos, tal qual lhos repetiram os jornais e televisões durante anos a fio, que se esqueceram de pensar no que significam as políticas a implementar pelo novo Governo a ser em breve empossado por Cavaco Silva.
Quem andou nas ruas a gritar contra o fecho de maternidades e hospitais estará preparado para começar a pagar a saúde de acordo com o princípio do utilizador-pagador tão querido aos ultraliberais?
Quem insultou Sócrates por lhes tirar escolas ao virar da esquina, estará preparado para a difícil decisão de custear a educação, que deveria ser um bem acessível a todos?
De entre os que gritaram palavras de ordem em defesa dos seus interesses corporativistas, concentrando apoios contranatura de forças de direita e da esquerda comunista, estarão convencidos de que a troika continuará a garantir-lhos?
E os que não queriam portagens, julgarão livrarem-se delas daqui por diante?
O que escrevi aqui há já alguns dias mantém plena actualidade à luz dos resultados eleitorais, tais quais saíram desta noite eleitoral: em breve crescerão de norte a sul os movimentos sociais de contestação às políticas do Governo liderado por Passos Coelho. E Portas verá neles a possibilidade de corroer o parceiro de coligação sem se escaldar o bastante para perigar o seu desejo de vir a ser primeiro-ministro de Portugal.
E será nessa altura, com as finanças nacionais tão constrangidas quanto o estão actualmente as gregas, que o governo cairá. Ou seja, daqui a dois anos, quando o estafado argumento da pesada herança socialista já se mostrar demasiado gasto, nada salvará um Passos Coelho, que não tardará a dar mostras das limitações há muito demonstradas e próprias da forma frouxa como vê o mundo à sua volta.
É nessa altura, que o Partido Socialista deverá estar pronto para recuperar o seu lugar na condução dos destinos do País. Com uma liderança inteligente, que saiba aproveitar os erros dos adversários e, sobretudo, recupere para a memória dos eleitores o quanto se conseguiu nestes seis anos de governação. Porque, nessa altura, será tempo de lhe ser dada a oportunidade, que a direita (apesar da inteligência de Paulo Portas) não deixará agora de desperdiçar: uma maioria, um Governo e um Presidente. Até porque, agudizada a crise mundial do capitalismo, será a altura de a esquerda europeia demonstrar as soluções entretanto experimentadas pelos novos governos de esquerda de França, da Itália, da Alemanha e da Inglaterra.
Atrás de tempos, tempos vêm...
Sem comentários:
Enviar um comentário