quinta-feira, 31 de agosto de 2023

O neocolonialismo americano na Ásia

 

A primeira vez que cheguei à Austrália de avião foi em Darwin, que aterrei, chegado de Singapura. Era terra tão distante do resto do país, que aí vi inaudita concentração de aborígenes e, no hotel onde fiquei alojado, proibiram-me o acesso à praia ali ao lado por abundarem os crocodilos de água salgada.

Não imaginei que perigos bem mais inquietantes aí se concentram atualmente: a acreditar no documentário de uma produtora local, decorrem exercícios militares com frequência crescente, juntando tropas americanas e australianas apostadas em prepararem-se para o momento em que a China ocupar Taiwan.

Apesar de ambos os países há muito reconhecerem a soberania de Pequim sobre a ilha secessionista, a prevista anexação provocará uma violenta guerra na região com potencial para estender-se aos demais continentes. Juntando-se ao atual conflito na Ucrânia, que faz parte da mesma estratégia norte-americana de evitar a sua previsível secundarização como a mais influente das superpotências.

Por agora Washington vai-se contentando em fazer da Austrália uma colónia subserviente com a conivência de um governo, que não hesitou em romper conversações com os franceses para comprar aos novos patrões os submarinos, que tão desejosos estão de vender. Porque a superioridade política e militar também se mede nos bons negócios, que vai conseguindo para a indústria do complexo, que Eisenhower procurou denunciar como demasiado perigoso para as veleidades democráticas da Casa Branca.

terça-feira, 29 de agosto de 2023

Uma variante do cão que usou a dentuça

 

1. A prova em como estamos na época das tolices (a silly season dos ingleses) comprova-o o destaque dado à não notícia da candidatura a Belém do comentador dominical da SIC. Podia-se anunciar que um cão mordeu um pacífico praticante de jogging, que o efeito seria o mesmo: desde que Rangel prometeu estender tapetes de gala entre os serões televisivos e os salões do poder, que logo houve quem na prática lhe quisesse dar razão.

O que Marques Mendes parece esquecer é que, repetindo-se, a História tende a revestir-se de tragédia na primeira demonstração desse tipo de teses - e, de facto, o balanço de Marcelo, quando a História operar o saldo dos seus dois mandatos, aparecerá como trágico na fútil irrelevância - e de farsa na segunda. E convenhamos que Mendes na sua baixa estatura (e não refiro apenas à que ostenta como altura no cartão de cidadão) - a exemplo de Moedas com o seu aspeto de nerd - são políticos, que poderão dar jeito aos caricaturistas, mas decerto nada virão a trazer de positivo a quem precisa de líderes visionários e competentes.

2. Já sabíamos que o bater de asas de uma borboleta poderá causar furioso tufão no mar da China. O que não imaginávamos era que as cheias na Eslovénia fizessem parar a fábrica da Autoeuropa por tempo indeterminado. O que só vem demonstrar que isto anda tudo ligado para o pior e para o melhor. Neste último caso façamos votos para que o abandonado internacionalismo do passado volte a confirmar essa interligação capaz de unir os humilhados e ofendidos de todas as latitudes. Porque o poluído e sobrexplorado planeta bem precisa de recuperar valores, que o capitalismo selvagem quis dar como descontinuados, mas carecem ser recuperados como estratégias eficientes para dissipar os prometidos apocalipses...

segunda-feira, 28 de agosto de 2023

Melões, comboios, bactérias e despudores

 

1. Que Marcelo olha para a espuma dos dias e não se atarda nas vagas de fundo, que ameaçam alterar o contexto da atual crise de habitação, confirma-o a fundamentação do veto ao pacote Mais Habitação e as notícias sobre o que no setor está a passar-se: o Público faz capa com uma crise, que já se deteta há mais de um ano e tem várias explicações, que nada têm a ver com a implementação dessa legislação. As famílias têm menos rendimentos disponíveis, deparam com os aumentos dos juros bancários e ainda sofrem os efeitos dos aumentos dos custos com os materiais a aplicar nas novas construções.

Segundo o texto da jornalista Rafaela Burd Relvas o número de vendas de casas já está a cair desde a segunda metade do ano passado, tendo sofrido quebras de 2,8% no terceiro trimestre de 2022 e de 16% no quarto trimestre desse ano, enquanto o montante total transacionado começou a cair no último trimestre do ano passado, altura em que sofreu uma redução superior a 10%.”

Não é difícil crer que, travado o entusiasmo dos nómadas digitais e dos reformados norte-americanos e escandinavos com um cantinho, que está a perder muitos dos motivos para se sentirem tão atraídos, os preços tendam a descer, quer nos preços das casas, quer nos alugueres das que, por falta de clientes para os excessivos alojamentos locais.

O melão é capaz de ter maior diversidade de sabores, que o simples bom ou mau, com que foi caracterizado.

2. Pouca relevância foi dado ao estudo da Greenpeace, que classificou a ligação da CP entre Lisboa e o Porto como uma das melhores a nível europeu.

Se compararmos com a euforia por muitos manifestada quando, dias antes, a espanhola Renfe viera anunciar o interesse nessa mesma ligação, pode-se confirmar a pouca condescendência mediática para com os méritos nacionais, quando estão em causa as possibilidades de interesses estrangeiros virem pô-los em causa.

3. Por estes dias também houve quem questionasse a dimensão dada ao episódio de assédio sexual do presidente da Federação espanhola de futebol a uma das campeãs mundiais da modalidade.

Porque se trata de problema sério, que as extremas-direitas peninsulares tendem a potenciar na defesa dos interesses dos machos ibéricos, vale a pena levar a muito a sério o que o é de facto.

4. Um sistema de esgotos, que não funciona devido a cortes sucessivos da eletricidade, e apenas 4% da população com acesso a água potável - quando era 98% em 2000 - eis o tenebroso panorama com que se confronta a população de Gaza.

Infelizmente o Tribunal de Haia ainda não parece decidido a pôr Israel no banco dos réus por mais este evidente crime contra a Humanidade. Porque são muitas as pessoas condenadas a adoecerem por bactérias existentes na água contaminada que consomem...

5. Que Donald Trump lucre com a venda de merchandising, que utiliza a imagem de delinquente fotografado pelas autoridades policiais, só confirma não haver pingo de vergonha num homem de poder, que faz Darth Vader quase parecer um menino de coro. 

sexta-feira, 25 de agosto de 2023

Quando ocorrerá a anunciada crise imobiliária?

 

A ganância pelo lucro fácil, que tem animado «empreendedores«, que expulsaram os lisboetas mais velhos para, nas casas por eles arrendadas, construírem alojamentos locais, ou agora aumentaram despudoradamente os preços dos quartos para os estudantes, que pretendem prosseguir estudos universitários nas principais cidades, leva algumas almas piedosas a criticarem o governo por não conseguirem valores mais justos para quem precisa de habitar na cidade e seus limítrofes.

E, no entanto, não faltam sinais em como as coisas não tardarão a mudar: depois da crise no imobiliário na Suécia ou na Alemanha, quanto tempo faltará para que ela chegue a este cantinho à beira-mar plantado tão evidente é o crescimento da bolha nestes últimos anos só faltando vê-la estoirar? E, quando estudos apontam Portugal como um dos países donde mais facilmente os turistas fugirão à medida, que as temperaturas subirem com as alterações climáticas, quando ouviremos os donos dos esvaziados alojamentos locais a exigirem apoios e subsídios para uma atividade em que têm sido especuladores sem escrúpulos?

Os tempos vão difíceis para quem hoje precisa de arrendar, mas nesta sucessão de marés, lá virá o dia em que faltará procura para uma oferta excessiva. O problema é quantos ficarão irreversivelmente prejudicados nas suas expetativas até suceder a crise anunciada.

Venha então Marcelo - que nunca fez nada que se aproveitasse para o bem dos portugueses - retratar-se do balanço ao absurdo texto com que quis justificar um veto, que só se explica pela desfaçatez com que faz oposição ao governo...

quinta-feira, 24 de agosto de 2023

Patetices, indiscretos atentados e negócios na NATO

 

1. Patéticas as intervenções de Marcelo em Kiev. Na verborreia interminável compromete os portugueses no seu todo como se se identificassem com a versão por ele assumida como boa e que é a mesma denunciada por Miguel de Sousa Tavares numa recente crónica do «Expresso» em que a dava totalmente enfeudada aos principais think tanks norte-americanos que, “por acaso”, são financiados pela industria militar ligada ao Pentágono.

Marcelo, o político do pós-25 de abril, que menos fez de substantivo (que obra, que lei, que reforma a ele se poderá associar?), mas maior uso faz da palavra, contenta-se em ser altifalante de uma das partes em disputa na guerra do sudeste europeu e, por isso mesmo, não se priva de propalar os maiores disparates.

2. Quem se surpreende com a morte do líder do grupo Wagner no avião caído na Rússia? Ela estava mais do que anunciada, mas poucos verterão por ele uma lágrima de comoção tão execrável era a sua personalidade e ideologia de extrema-direita!

Não deixa de ser cínica, porém, a reação de Joe Biden. Ele que bem sabe como se fazem as coisas - vide a sabotagem dos gasodutos no Báltico! - poderia explicar ao homólogo russo como produzir os mesmos resultados sem ser tão evidente de onde partiu a ordem para sabotar o tal avião...

3. Demonstração acrescida de quem manda e lucra com a NATO: a Noruega, a Bélgica e os Países Baixos pretenderam renovar as frotas das respetivas forças aéreas. Os Rafales franceses constituíam hipótese substantiva a considerar. No entanto, no momento de assinarem as encomendas, os três países direcionaram-se para os F-35 norte-americanos. Alguma dúvida sobre quem lucra com a existência da NATO? 

segunda-feira, 21 de agosto de 2023

E lesta, lá segue a caravana!

 

Foi sem surpresa, que tomámos conhecimento do veto político de Marcelo ao pacote Mais Habitação, que tinha para decidir quanto à sua aprovação. Da Praia de Monte Gordo ele foi pré-anunciando o que decidiria sem mostrar grandes ilusões quanto ao que se seguiria: a aprovação do documento pela maioria parlamentar e a subsequente implementação.

Pérfido na guerrilha, que decidiu organizar contra o governo, ele preparou o ambiente propício para que, nesta segunda-feira, viessem os partidos das direitas, os comentadeiros do costume e os representantes das corporações gananciosas, que têm lucrado com a especulação imobiliária, a falta de casas para alugar e a sua transformação em alojamentos locais, para entoarem um afinado coro, que pusesse em xeque o inimigo de estimação, que sempre tem sido António Costa.

Conseguiu o pretendido? Tenho dúvidas. A sua argumentação foi pífia, não contestando a constitucionalidade do texto limitando-se a fazer de zandinga, desconfiando do sucesso do que resultar da sua prática. Quanto ao coro dos despeitados nada de substancial a acrescentar: multiplicam-se em palavras vãs, porque conta verdadeiramente o que não têm: deputados suficientes para impedirem a confirmação da lei.

domingo, 20 de agosto de 2023

E quando não houver para onde fugir?

 

Que mais será preciso acontecer - aqui com os incêndios, as secas e as inundações, mais além com dimensões superlativas dos mesmos fenómenos extremos! - para aceitar a evidência da urgente mudança de paradigma na organização económica internacional? O capitalismo predador já se revelou parte substantiva do problema sem dele surgir alguma proposta de solução. E procura tornar pior o que já é mau através das forças de extrema-direita, que constituem o último refúgio dos negacionistas.

Precisamos de ver afirmado um ecossocialismo firme, que deixe de se concentrar numa militância de protesto e se faça imparável tendência político-ideológica sobretudo suportada pelos jovens que, dia-a-dia, veem hipotecado o seu futuro. Conquanto esqueçam os falsos paraísos tropicais só alcançáveis à custa de lautos consumos de combustíveis fósseis, os anestesiantes shots nos bares da moda ou os ensurdecedores banzés dos palcos dos festivais de verão.

Querem divertir-se? As ameaças distópicas estão ao virar da esquina e não prometem amanhãs cantantes. Basta olharem para a fotografia de filas de condutores a fugirem de uma cidade canadiana ameaçada pelo fogo para concluírem que não falta muito para que não haja sítio seguro para onde fugir...

sexta-feira, 18 de agosto de 2023

A importância da Verdade

 

1. Não é que surpreenda a falta de escrúpulos de André Ventura ao inventar notícias nas redes sociais e procurando-as credibilizar com o uso abusivo dos logotipos e lettering do Público e da Renascença. Mentiroso compulsivo o líder da extrema-direita vale-se da idiotia mental da maior parte dos seus prosélitos para se armar em renomado político convencendo-os de “factos”, que são redondamente falsos.

Que o crime compensa confirma-o o sucesso de Trump ou Bolsonaro junto dos que os continuam a defender e igualmente destinatários desse tipo de falsidades. O que demonstra ser fundamental a recuperação da Verdade como valor fundamental a defender na política. Até porque, sabemo-lo há muito, só ele á revolucionária.

2. Os números poupam-nos a grandes palavras sobre o que significam, tão eloquentes são por si mesmos: a Jornada Mundial da Juventude de Cracóvia custou 48 milhões de euros e só 4 provieram de fundos públicos. A de Madrid valeu 51 milhões e só contou com o benefício das isenções fiscais. A do Panamá custou 19 milhões e não teve apoios públicos. Pelo contrário Lisboa deverá ter custado  160 milhões e metade foi pago pelo Estado. Equivalente só a realizada no Rio de Janeiro, que custou 136 milhões, cabendo 72 ao investimento público.

Bem pode o emplastro à frente da CML azucrinar-nos a cabeça com o grande retorno dos gastos, que não dá manifestamente para acreditar!

3. Os incêndios na Grécia e no Havai demonstram quão perigoso pode ser o ofício estival de turista a tempo inteiro. Fascinados pelo marketing há multidões a deslocarem-se entre latitudes, ampliando a pegada de carbono, e vão ao encontro de catástrofes, que lhes podem cercear a vida.

O mundo está perigoso e não poupa quem apenas sonhava com férias em paisagens paradisíacas... 

segunda-feira, 14 de agosto de 2023

Um emplastro à solta entre Lisboa e o Pontal

 

Não foi preciso perder tempo a ver as reportagens televisivas sobre a Jornada Mundial da Juventude para receber exaustiva informação sobre o patético e repetitivo surgimento de um emplastro (diferente do há muitos anos conhecido nos telespetadores dos diversos canais!), sempre pronto para posicionar-se perante as câmaras e rentabilizar os custos, que pôs a Câmara a pagar a diversas empresas de comunicação contratadas para lhe cuidarem da autopromoção.

O ambicioso arrivista decidiu levar tão longe a empáfia, que apostou numa singular cereja em cima do bolo: crismar com o nome do encobridor de pedófilos na Igreja a ponte sobre o Trancão, que nem fora ideia sua, nem sequer chegara adjudicara. Tomando como sua a obra alheia, viu-se subitamente desautorizado na asneira, porque nem a submeteu à Comissão da Toponímia da CML e muito menos à opinião dos vereadores.

A pronta reação de quem lançou petição e a subscreveu levou o putativo homenageado a excluir-se da frigideira, onde se antevia grelhado em lume vivo. Deixando nele isolado o sôfrego oportunista.

No entretanto nada dele se conhece sobre efetivos contributos para atenuar a crise da habitação na cidade europeia onde são mais altas as rendas das casas para alugar e onde se fez provedor dos interesses dos gananciosos proprietários de alojamentos locais.

Da Suécia vêm sinais esclarecedores sobre quanto essa ganância pode redundar numa grave crise imobiliária, que ameaça estender-se ao sistema bancário. Atento, o Banco de Portugal já alertou para essa possibilidade também aqui se verificar. Nessa altura não será com este emplastro, que a maioria dos portugueses poderão contar para se livrarem dos danos colaterais de uma realidade para que não contribuíram. Uma vez mais será a esquerda a apresentar soluções exequíveis para que não repitamos os pesadelos dos que, emplastro incluído, estão a anunciar no Pontal o contrário do que sempre defenderam...

sábado, 12 de agosto de 2023

Um planeta em ebulição global

 

A expressão utilizada por António Guterres faz todo o sentido numa altura em que se confirma Julho de 2023 como o mês mais quente de sempre desde que há registos, havendo quem defenda tratar-se de um record com mais de cento e vinte mil anos.

Ultrapassou-se o temível limite de 1,5ºC, que se julgava provável daqui a umas décadas e para o qual se deveriam reduzir as emissões de carbono, que o evitasse. Porque os efeitos já se notam na forma de fenómenos meteorológicos extremos.

Lamentavelmente os políticos continuam a ignorar a realidade, com Lula e o primeiro-ministro inglês a aprovarem novas prospeções de jazidas de hidrocarbonetos, que só agravarão o pré-cenário apocalítico. Com a Índia e a China a queimarem megatoneladas de carvão, ou com os EUA e a Rússia a prosseguirem a sua guerra na Ucrânia. E, mesmo na nossa democrática União Europeia os eleitores vão votando em partidos de extrema-direita, que alimentam discursos negacionistas quanto ao aquecimento global, ou dilatam a pegada poluidora com férias para destinos exóticos distantes.

Com a Grécia, o Canadá e o Havai consumidos pelas chamas ou a Eslovénia e a Coreia do Sul afetados por chuvas e ventos intensos, que mais será preciso para que cresça a consciência global capaz de passar para lume brando o que tende a ser uma iminente e destruidora fervura?

terça-feira, 8 de agosto de 2023

As ilusões dos que confundem sonhos com realidades

 

Porque não nos surpreendemos com a má notícia sobre menos 7,4% de menos turistas portugueses no Algarve? De existirem quartos de hotéis vazios e restaurantes com empregados a enxotarem as moscas enquanto esperam por clientes, que lhes passam ao largo?

Ao mesmo tempo os empresários dos locais por onde passou o Papa queixam-se do fraco negócio com jovens peregrinos pelintras, que reservaram as carteiras para encherem os cofres da Santa Sé! E ainda há quem avente a debandada de clientes das agências de viagens para destinos mais baratos - Espanha, Marrocos, Tunísia - com oferta mais barata do que a aqui disponível.

Os nossos empresários do setor turístico são assim: criem expetativas muito aquém da realidade e carregam nos preços julgando possíveis lucros ainda mais avultados. A realidade está-lhes a cair em cima e acaba por incidir sobre os que menos culpa têm quanto a essas vãs ilusões: os que para eles trabalham e começam a ser despedidos...

domingo, 6 de agosto de 2023

38 milhões de euros dados a quem não os merece

 

Nos anos de diáspora marítima passaram-me ao lado inúmeros acontecimentos importantes, que por aqui se viviam. Lá longe, no meio dos oceanos, e numa época em que ainda imaginava o que viriam a ser a internet ou os telemóveis, não havia como saber o que se vivenciava neste cantinho peninsular.

Vivi os dias mais recentes como houvesse regressado a tais lonjuras. Porque assim me tem passado totalmente ao lado essa presença papal e a de milhares de turistas religiosos, que transformaram as deslocações para o outro lado do rio numa prudente impossibilidade.

Sobre Francisco já o disse e volto a repetir: não é sectário que me mereça simpatia. Bastou conhecer-lhe as comprometedoras atitudes durante a ditadura dos generais argentinos para devotar-lhe a indiferença devida aos que se acobardam perante a iniquidade do poder absoluto. Mas, se dúvidas houvesse quanto à precipitação desse juízo, bastar-me-iam as prédicas sobre o aborto e a eutanásia para ficar definitivamente convencido.

O que, porém, me indigna neste espaventoso evento é o quanto para ele tenho de contribuir. Sendo um convicto ateu, porque devo contribuir com os meus impostos para esta réplica neobarroca de revestir a fé de tão esdrúxulos atributos, que iniba os crentes de passarem os seus fundamentos pelos objetivos crivos da Ciência? Porque não se deixaram, como em Espanha, as despesas correrem por conta dos que continuarão a viver à custa dessas insensatas crendices?

Os 38 milhões de euros investidos pelo Estado laico naquela que tem sido uma violação grosseira ao princípio constitucional da sua separação relativamente às diversas Igrejas, melhor seriam aplicados onde fazem efetivamente falta...