Neste blogue tenho emitido uma tese, que me parecia fazer algum sentido, de haver uma concomitância entre a crise das esquerdas europeias e a queda do muro de Berlim, muito por força da falta de um equilíbrio entre a ideia de capitalismo e a de uma certa forma utópica de comunismo, logo traduzida num ataque incessante das direitas contra as conquistas do Estado Social. Ainda recentemente, num texto sobre a relevância da recuperação do ideal marxista, eu utilizava tal tese como justificação para essa necessidade de regresso aos valores fundamentais herdados da Declaração Universal dos Direitos do Homem.
Numa dinâmica acelerada de imposição dos seus interesses de classe as direitas livraram-se, entretanto, das orientações democratas-cristãs e enveredaram por um neoliberalismo, que não as eximiu de, em muitos casos - e o passismo é disso um exemplo lapidar! - se revelarem particularmente estatistas sempre que lhes deu jeito.
Mas a leitura do texto de apresentação assinado por Mário Artur Machaqueiro para o livro O Fim da URSS - A Nova Rússia e a Crise das Esquerdas, agora editado pela Colibri, teve o condão de me fazer reequacionar aquele pressuposto. Porque, no livro em causa André Freire e outros investigadores propõem outra tese, que se me passa a afigurar mais pertinente: a origem da crise das esquerdas europeias terá de ser recuada para os anos 70, quando o capitalismo entrou numa lógica de financeirização, dissociando a corporalidade das mercadorias dos valores por que são negociadas em Bolsa.
Terá sido a virtualização da economia real, que criou as condições para pôr em causa o sucesso das esquerdas, doravante incapazes de lidarem com essa transfiguração dos seus inimigos ideológicos. Pior ainda - e Blair ou Schröder são disso lamentáveis exemplos - procuraram encontrar terceiras vias aonde elas jamais poderiam fazer sentido.
A implosão da União Soviética e a queda do muro de Berlim têm explicação precisamente nessa impossibilidade de lidar com uma nova realidade em que o fluxo de capitais se sobrepôs ao das mercadorias.
Daí que seja pertinente prosseguir nesta linha de raciocínio para buscar as soluções de esquerda necessárias à superação deste ciclo histórico, que tem morte anunciada. Sobretudo, porque, um a um, vão caindo os mitos criados em torno dessa linha ideológica fanaticamente capitalista: nem a globalização aumentou a riqueza mundial, nem produziu menos desigualdades. Hoje até a Igreja Católica pelo seu principal representante vem apelar a uma outra forma de encarar a produção e a distribuição da riqueza. Condenando sem qualquer dúvida todos aqueles que se comportam como o ganancioso Gordon Gekko dos dois «Wall Street» assinados por Oliver Stone.
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