terça-feira, 31 de dezembro de 2013

FILME: «América anos 30» de Tim Robbins (1999)

Outono de 1936. Mussolini preparava-se para invadir a Abissínia, enquanto Hitler visitava a Exposição de Arte Degenerada. Nos Estados Unidos o Presidente Roosevelt estava a implementar as políticas do New Deal para dar trabalho a quem estava desempregado. Um dos programas federais abrangidos por tal estratégia era o WPA, um programa de apoio ao teatro, que tinha em Orson Welles um dos seus subsidiados.
O realizador de «Citizen Kane» diria, depois, ter sido essa a época em que os Estados Unidos mais próximos terão estado da criação de um Teatro Nacional.
Mas Tim Robbins - que chegou a alimentar a ambição de ser tão relevante para o cinema norte-americano, quanto aquele seu inspirador - vai igualmente buscar influência a outro dos realizadores, que mais admira (Robert Altman) para recriar o ambiente social e político dos anos 30 através dum argumento distribuído por uma dúzia de histórias paralelas, como num mosaico em que as personagens ora se cruzam, ora se afastam, algumas delas sem sequer darem pela existência das outras.
Se esse tipo de filme até consegue resultar, nomeadamente chegando aos óscares, como sucedeu com o «Crash» de Paul Haggis em 2004, carece de um talento inquestionável para evitar os escolhos da confusão e da dispersão. Ora é aqui que Tim Robbins falhará apesar de contar com um elenco superlativo.
As histórias dispersam-se por quatro eixos principais:
· a criação do mural para o Rockfeller Center pelo artista mexicano Diego Rivera;
· a preparação da estreia da peça «Craddle Wild Rock» no teatro Maxine Elliott;
· a convocação da coordenadora do WPA a uma antecessora da tenebrosa Comissão das Atividades Antiamericanas do senador McCarthy;
· e a decadência de um ventríloquo ferozmente anticomunista, mas com um boneco politicamente a ele totalmente oposto (e que bem vai Bill Murray neste papel!).
Descobrimos, assim, uma América em acelerada agudização da luta de classes, com os mais ricos a flirtarem com Mussolini e a reprimirem violentamente os sindicatos e as manifestações antifascistas, e os milhões de homens e mulheres ainda com a memória bem fresca da fome padecida durante os anos mais duros da Depressão, a exigirem uma distribuição mais justa das riquezas.
Temos assim John Turturro como ator da peça encenada por Orson Welles e a defender os princípios contra a promessa de apoio financeiro da sua família entusiasmada com a retórica do Duce. Temos John Cusack como um endinheirado Rockfeller, incapaz de compreender como foi possível ter Lenine ou Marx no mural encomendado a Rivera para o edifício construído exclusivamente para glorificar a sua fortuna. Temos Susan Sarandon como uma judia italiana apoiante de Mussolini e amiga de Rivera, não conseguindo libertar-se dessa contradição. Temos Emily Watson como uma sem abrigo, que consegue encontrar providencialmente emprego na peça, que o poder se encarregará de proibir por constituir um notório libelo anticapitalista. Ou Joan Cusack como a ingénua delatora das supostas atividades subversivas da organização onde era mera funcionária administrativa e se vê ostracizada pelos colegas e confrontada com os desempregados, que deveria ajudar e se veem doravante desapoiados. E ainda Hank Azaria, Ruben Blades, Cary Elwes, Cherry Jones, Vanessa Redgrave, Bob Balaban, Jack Black, Paul Giamatti, Barbara Sukowa em desempenhos igualmente relevantes.
Temos, pois, um filme com uma mensagem ideológica interessante - não faltando uma cena com o boneco do ventríloquo a cantar a Internacional, mas com um resultado final pouco convincente. E por ter sido um fracasso comercial, Tim Robbins poucas oportunidades voltou a ter para se mostrar um realizador à dimensão dos mestres aqui por ele homenageados.

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