domingo, 15 de dezembro de 2013

FILME: «Ao Sol de Satanás» de Maurice Pialat



Foram várias as razões para não sentir grande atração pelo cinema de Pialat, enquanto ele foi vivo. Conotado com a direita ideológica, era execrado por alguns dos críticos franceses, que, então, me mereciam maior confiança.
Por outro lado este «Ao Sol de Satanás» recuperava do merecido esquecimento um escritor católico relativamente ao qual a falta de empatia não era menor: Georges Bernanos. E, no entanto, até achara interessante a adaptação assinada por Bresson deste mesmo material ficcional com «Mouchette», visto na gloriosa época em que funcionavam as saudosas Quinzenas do antigo Monumental…
Na época, embora já conhecesse o entusiasmo de Maria João Seixas por um dos filmes de Dreyer («Ordet»), que continha, igualmente,  uma ressurreição inverosímil, tinha dificuldade em abdicar do dogmatismo ateu para aceitar a demonstração de outras sensibilidades (religiosas) perante realidades complexas.
Agora, passados vinte e seis anos sobre este filme, que Cannes consagrou com a Palma de Ouro, confesso a disponibilidade para reconsiderar a opinião de então à luz da sageza, que os anos acrescentaram às firmes convicções da juventude. Até porque Pialat consegue iludir a questão da fé para a transformar em algo afinal não muito distante dos meus pretéritos preconceitos: como poderemos acreditar com entusiasmo naquilo que supostamente defendemos?
Perante o dever de cumprir a missão divina de que fora incumbido no seu sacerdócio, o abade Donissan, vive a dúvida permanente de não encontrar dentro de si a fé suficiente para se sentir genuinamente realizado. E daí que tenha de passar por três provas ambivalentes: o encontro com um demónio disfarçado a cujo enleio conseguirá resistir; a frustração de não conseguir salvar Mouchette do suicídio motivado pelo complexo de culpa pela morte do amante; a aparente resposta às suas angústias existenciais com a ressurreição do miúdo aparentemente vitimado pela meningite.
Mas o filme não é apenas a história extraída do romance de Bernanos, nem as celebradas interpretações de Depardieu e de Sandrine Bonnaire. Na qualidade da fotografia está presente a influência que Van Gogh sempre exerceu em Pialat e que resultaria no filme homónimo de 1991, com que comecei a infletir a minha opinião a seu respeito…
Passados tantos anos, «Sous le Soleil de Satan» acaba por ser aquilo que o são tantos filmes vistos então: propostas cinematográficas redescobertas como se encontradas pela primeira vez...


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