Tráfico de droga, homicídio, terrorismo, rapto de crianças, insubmissão política - tais são os delitos passíveis de enclausurarem as mulheres afegãs nas prisões locais. Mas são sobretudo frequentes as acusações por «crime moral», que tanto condena culpadas como inocentes.
O «crime moral» é uma noção jurídica bastante vaga que pode incluir diversos delitos: adultério, mau carácter, consumo de álcool ou dançar na presença de homens. Contudo ele é invocado, sobretudo, quando se foge do domicílio paterno ou conjugal. Num país onde o casamento é negociado pelo pai, muitas das raparigas fogem para evitar esse destino.
Quase sempre essas mulheres são denunciadas por um vizinho intrometido, por uma mulher ciumenta, por um pai supostamente desonrado.
Uma vez apanhadas pela polícia são conduzidas ao comissariado para serem interrogadas e presas preventivamente. Começa então um longo combate contra a justiça afegã: advogado, audiências, subornos, regresso à prisão e novas audiências. O encarceramento pode arrastar-se meses a fio enquanto o tribunal não concluir o caso.
Uma vez pronunciado o veredicto judicial, as mulheres condenadas são levadas para a prisão central a fim de cumprirem as suas penas.
O universo penitenciário afegão é paradoxal. As prisioneiras usufruem de uma certa liberdade no interior do centro de detenção aonde se instituiu uma verdadeira micro-sociedade. Deslocam-se à vontade, a maioria dispensa o véu, fumam, maquilham-se: é o Afeganistão como se não existissem proibições para as mulheres. Têm acesso a cursos de alfabetização, de informática e de inglês financiados por fundos estrangeiros. O que dá a ilusão de um ambiente idílico baseado num modelo ocidental.
Mas a realidade do encarceramento está lá. A privação da liberdade, a promiscuidade, a doença, o afastamento dos familiares, o medo do futuro.
De facto, a maioria das mulheres aprisionadas «desonraram» o pai ou o marido e não estão livres de uma vingança mortal, quando forem libertadas.
Esse momento de libertação inicia um outro pesadelo: condenadas a viverem escondidas, essas antigas detidas só podem sentir alguma segurança em abrigos clandestinos geridos por ONG’s. Sair, então, só de burqa e na companhia de um membro de tal organização de apoio.
Todas quantas aceitaram posar para a câmara de Sonia Naudy superaram medos e proibições e puseram em perigo a sua vida. A sua situação, já delicada, ainda mais se complica ao deixarem-se fotografar no seu quotidiano de prisioneiras, sem véu, com maquilhagem e fumando em assumida atitude de coragem e de revolta.
Todas elas terão dito a Sónia Naudy para mostrar essas imagens no Ocidente como forma de divulgação da terrível condição das mulheres afegãs. A injustiça de que são vítimas, a corrupção do sistema judiciário afegão e tão só a sua condição feminina, que pouco difere da do tempo dos talibãs….
Este portfolio é, sobretudo, um encontro com mulheres de carácter, de imensa coragem, revoltadas, heroínas dos tempos modernas decididas a lutarem pela sua sobrevivência...
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