sábado, 1 de dezembro de 2012

DOCUMENTÁRIO: «A última jangada do Montenegro» de Matthias Hedder e Monika Hielscher.



Tenho comigo imagens cinéfilas bastante gratas sobre descidas de rios ou sobre jangadas de troncos de árvores. Só para citar algumas há o filme de John Boorman em que Burt Reynolds, Jon Voight e mais dois amigos descem um rio antes de uma barragem o destruir e dão ensejo a um inesquecível dueto entre uma guitarra e um banjo. Ou a experiência vivida ao largo de Libreville, quando chegavam jangadas de troncos ao costado do navio aonde eu era tripulante e, algumas vezes, surgiam tornados tão inesperados, que só havia tempo para salvar os homens, que a carga, essa, seguia rumo ao largo.
Foi tudo isso, que fui recordando ao ver o documentário «Le Dernier Radeau du Montenegro» realizado por Matthias Hedder e Monika Hielscher.
Quem diria que nessa região da antiga Jugoslávia, hoje incluída na Bósnia e no Montenegro independentes, ainda há quem ganhe a vida a comprar troncos de madeira na floresta, a com eles criar um par de jangadas levando-as depois rio abaixo para os vender a jusante?
Essa atividade ainda subsiste nos 140 quilómetros do rio Tara, um dos fluentes do Drina e testemunhamo-la mediante o acompanhamento de uma dessas viagens desde o seu início até à chegada a Foca.
Figret, o irmão e os sobrinhos começam por juntar os doze troncos entretanto comprados e constroem a jangada de quatro toneladas de peso, na qual também transportarão ferragens, materiais e até uma ovelha, carregados ao longo do seu trajeto de meia dúzia de dias.
Há tempo para recordar e homenagear outros grandes manobradores de jangadas cujo nome perdura numa espécie de muro da glória debaixo de uma ponte destruída. Ou para visitar a aldeia natal, abandonada em 1992 durante a guerra civil, que resultou na destruição pelo fogo de todas as casas e na morte dos velhos aí deixados para trás.
O canyon por onde as jangadas seguem é dos maiores do mundo com 1300 metros de profundidade e com correntes, que chegam a 20 quilómetros por hora nos seus rápidos de navegação mais complicada.
Mas as dificuldades da viagem não se ficam por aí: há a chuva torrencial, as zonas aonde a profundidade do leito do rio é tão baixa, que os obriga a desviar os pedregulhos, que impedem a navegação, e todas as dificuldades inesperadas, que podem ser fatais. Não admira, por isso, que Figret vá recordando aqui e além outros manobradores de jangadas mortos em acidentes, que perduram de geração em geração.
Para os sobrinhos de Figret a viagem constitui uma experiência iniciática em que a exigência física se alia ao permanente temor perante os perigos.
No final da viagem Figret reconhece tratar-se de atividade ainda rentável, já que lhe terá valido 1000 ou 1100 euros em apenas uma semana. Mas fica a ideia de se estarem a viver os últimos dias de uma tradição. Hikmet, um dos sobrinhos, entusiasma-se com a experiência, mas ela apenas constitui uma variante para os seus dias passados em frente ao computador. A nova geração já dificilmente manterá vivos os costumes dos seus antepassados.

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