Este é um tempo dado a grandes absurdos. Basta ouvir Pedro Passos Coelho a discursar ou a insurgir-se contra Judite de Sousa, que o impensável acontece: até eu, confesso ateu, me sinto levado a bíblica metáfora do Evangelho Segundo São Mateus (E outra vez vos digo que é mais fácil um camelo passar pelo fundo de uma agulha do que entrar um rico no Reino de Deus) para encontrar a comparação adequada quanto ao apoio público ao atual primeiro-ministro: começa a ser mais fácil acreditar no referido dromedário do que encontrar um comentador disposto a aprovar as políticas do Governo.
Marcelo Rebelo de Sousa ou Marques Mendes lá se vão ainda prestando ao frete, mas até o inefável Vasco Pulido Valente já se vai dissociando de tão comprometedora adesão.
Nos jornais lidos este fim-de-semana abundam, pelo contrário, atestados de incompetência a Pedro Passos Coelho, que justificam o apelo de um elevado número de personalidades lideradas por Mário Soares para que se apresse a sua candente demissão.
Vejamos alguns exemplos, a começar por Pedro Adão e Silva no «Expresso»: Hoje, perante a sucessão de declarações que variam entre o contraditório, o incompreensível e o mau português, tem-se tornado difícil analisar a ação de Passos Coelho. É que uma coisa é fazermos uma avaliação das propostas do Governo com base no seu conteúdo, outra, bem distinta, é tentar perceber até que ponto as decisões obedecem a critérios de racionalidade e visam criar uma coligação social de apoio.
Chegámos, hoje, a um ponto tal que, sendo ainda possível encontrar quem defenda a estratégia que, com dificuldade, se vislumbra no Governo, tornou-se virtualmente impossível encontrar alguém que reconheça capacidades a Passos Coelho. No fundo, parafraseando António José Teixeira em comentário na SIC-N esta semana: "Temos dificuldade em olhar para Passos Coelho como um primeiro-ministro."’
Na mesma linha, mas acrescentando ilegalidade inconstitucional à inaptidão política do primeiro-ministro, escreve Carvalho da Silva no «Jornal de Notícias»: A coberto de mentirosas inevitabilidades e de uma emergência financeira cuja gravidade vai aprofundando, o Governo destrói a economia, entrega a grandes interesses capitalistas estrangeiros e nacionais os nossos recursos e setores estratégicos, e impõe escolhas de regime político que subvertem o Estado de Direito e a sua lei fundamental.
No «Diário de Notícias» Pedro Marques Lopes, que até votou no PSD nas últimas legislativas, dá-o como completamente perdido: O pior, porém, é já ser evidente que fora a sua fé cega no plano revolucionário pós-troikiano de Gaspar, Passos Coelho não tem uma ideia consolidada e estruturada sobre praticamente nada. E sempre que fala, isso torna-se claro para cada vez mais pessoas. Agora tem fé em Gaspar, outro guru se seguirá.
Nada pior do que sentir que quem nos lidera está ainda mais perdido do que nós.
No «Diário Económico» Pedro Silva Pereira continua na mesma lógica num texto em que lamenta o inqualificável ataque à qualificação dos portugueses pelo investimento na educação: Fica difícil saber o que mais devemos lamentar: se um Primeiro-Ministro impreparado, que desconhece aspetos básicos da nossa Constituição; se um Primeiro-Ministro insensível, que insiste na receita da austeridade sobre as famílias; se um Primeiro-Ministro sem visão que, num País como este, não percebe a função dos direitos sociais e admite pôr em causa o mais decisivo instrumento de promoção das qualificações e da igualdade de oportunidades. Mas que tudo isto é lamentável, lá isso é.
E no blogue «Arrastão» Sérgio Lavos chega a questionar se não estamos todos alucinados e tão paradoxal personagem exista: Impreparação, desconhecimento, arrivismo voluntarioso, eis o que define o primeiro-ministro. Dir-se-á mesmo: alienação. Quem não sabe como se organiza o ensino em Portugal está completamente a leste de tudo. Este senhor existe mesmo? E governa-nos?
Como afere Fernanda Câncio no «Diário de Notícias» é imperioso escorraçar rapidamente Passos Coelho do Governo. Já!: Demite-se um PM quando é mais danoso para o País mantê-lo no lugar que arriscar outra solução, por fraca e incerta que pareça. Quando cada dia que permanece no lugar para o qual foi eleito cria perigo para a comunidade. Demite-se um primeiro-ministro quando é preciso. É preciso.
Se ainda exista quem olhe para todas as desgraças dos vizinhos na esperança de vir a escapar da tempestade por entre os pingos de chuva é Nicolau Santos quem no «Expresso» se encarrega de os dissuadir: o que aí vem será dramático para a imensa maioria dos portugueses ainda não afetados pelo desemprego, pelos ordenados em atraso, pela precariedade do emprego ou pelos rendimentos cada vez mais reduzidos: As pessoas ainda não perceberam o que lhes vai cair em cima. Mas quando virem o recibo de vencimento no final de janeiro, compreenderão quão brutal é o tsunami fiscal que lhes vai arrasar o nível de vida e colocar-nos a todos a pensar em meios para sobreviver até ao fim do mês.
Concluamos este balanço das opiniões expressas nestes dias com o que Miguel Sousa Tavares subscreve no mesmo «Expresso»: O erro do adjunto do primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, é a tentação de preencher a sua ignorância em matéria económica e a sua impreparação em matéria política encostando-se à muleta que Gaspar lhe estende, convencido de que assim hão-de conseguir atravessar para a outra margem. Eu estou convencido do contrário: que ele irá ao fundo e nós com ele, pois está escrito nos livros que não se pode salvar as finanças públicas de um país matando a sua economia. Já Vítor Gaspar, terá, provavelmente, um futuro garantido até à eternidade nalgum gabinete de estudos internacional ou como palestrante em universidades, para dar conferências com o tema 'Eu estava lá: como conduzi até ao fim o processo de ajustamento da economia portuguesa'.’
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