O jazz tem a ver com liberdade. Fala de uma espécie de libertação.
É claro que outros povos foram oprimidos nos EUA, ou sofreram brutalidades, mas apenas os afro-americanos foram escravizados. Por isso personificam a consciência e o legado histórico de não terem sido livres num país livre.
A partir de 1817 os escravos de Nova Orleães adquirem a autorização para, todos os domingos à tarde, cantarem e dançarem num local chamado Congo Square.
Aos olhos curiosos dos brancos, que ali os iam espreitar e ouvir, a música dos escravos, com os seus complexos ritmos de percussão, parecia oferecer uma visão genuína da cultura africana.
Mas a maioria dos escravos, que se reuniam ali, nunca tinha estado naquele continente. Muitos tinham acabado de chegar das Antilhas e a sua música tinha o som contagiante dos ritmos caribenhos.
Outros tinham sido trazidos para a cidade dos latifúndios do interior dos EUA e traziam consigo as canções de trabalho e os hinos religiosos das igrejas batistas.
Por essa altura Nova Orleães ainda abrigava uma comunidade muito singular e próspera de cidadãos negros livres, que se intitulavam os “creoles de cor”. Muitos tinham a pele mais clara por serem descendentes de colonos franceses ou espanhóis e das suas esposas e amantes negras. Identificavam-se mais com as suas raízes europeias do que com as africanas e menosprezavam os negros de pele mais escura. Alguns até eram donos de escravos.
Muitos músicos dessa comunidade “creole” tinham formação clássica e orgulhavam-se de conseguirem tocar para todos os tipos de dança.
Segundo a primeira página do «Picayune Journal» de 1838 a nova mania de Nova Orleães era a música das cornetas e trompetes. Cidadãos de todas as etnias e nacionalidades acompanhavam os desfiles das bandas de metais pelas ruas, que eram invadidas para celebração de casamentos, funerais e datas festivas, sem contar com as seis a oito semanas da época do Carnaval, que todas as primaveras antecediam a festa do Mardi Gras.
Era uma cidade romântica: os vendedores ambulantes cantavam árias e existia uma verdadeira integração. Num mesmo quarteirão podiam conviver famílias italianas, negras, alemãs, crioulas e de quaisquer outras proveniências.
Nova Orleães também tinha uma tradição boémia com jogos de fortuna e do azar, mulheres a exibirem os seus largos decotes, em contraste com as muitas igrejas e os cultos vudu.
Todas essas influencias misturavam-se na cidade. Havia quem não se conseguisse aturar, mas tinham de se obrigar a fazê-lo, porque partilhavam a mesma cultura, a mesma tijela de “gumbo”.
Existiam, igualmente, os espetáculos dos menestréis com as suas canções camponesas, escritas por compositores brancos e negros para cantores brancos com o rosto pintado de negro e, ás vezes, em anos posteriores, por cantores negros caracterizados como brancos a fingirem-se de negros.
À primeira vista a tradição de menestréis americanos parecia reforçar os estereótipos raciais mas foi a forma mais popular de entretenimento durante cerca de oito anos a partir de 1840, produzindo a primeira fase da música popular americana.
Ainda hoje se conhecem e cantam as canções de Stephen Foster ou James Bland e contam-se anedotas clássicas desse período e dessa cultura.
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