O escritor Richard Ford vive em Boothbay Harbor, no estado do Maine. Nascido em Jackson, no Mississípi, em 1944, formado na escola de Raymond Carver, a quem muito contactou no Texas, Ford viveu em Nova Iorque, depois no Montana, foi argumentista em Hollywood, instalou-se por algum tempo em Nova Orleães e acabou por pousar as malas no Maine. Definitivamente tanto quanto dá para perceber.
«Independence» foi a obra que o revelou aos leitores europeus, depois de galardoado com o Prémio Pulitzer de 1996.
Para os americanos o Maine é o sítio, que não conduz a parte alguma, senão para quem pretenda ir ao Canadá. Num certo sentido corresponde aos confins dos EUA. É o Estado mais a nordeste do país e bastante distante da terra natal do autor. O que o faz confirmar a ideia de poder viver sem problema num qualquer sítio dos EUA.
Uma das razões invocadas por Ford para ter saído do Sul, foi a de se afastar de um certo número de coisas por ele testemunhadas enquanto crescera. Nomeadamente do racismo.
De facto, quando vivia no Mississípi, considerara que esse Estado em nada correspondia ao que ele idealizava ser a realidade norte-americana. Até porque, durante o século XIX ele estivera isolado do resto do que então se designava por América. Já então ele considerava ser o Nordeste, a Nova Inglaterra, a verdadeira América.
Não é, pois de estranhar que, apesar de ali se radicar já bastante tarde, Ford se tenha sentido imediatamente em casa.
Ele faz parte daqueles que não acredita em generalidades, antes lhes preferindo as particularidades. Para fazê-los falar do estado em que se vê a América, Ford faz com que os seus personagens falem da sua vida íntima. E integra os seus destinos individuais num contexto político, que permita ao leitor compreender a relação entre as várias vidas individuais e os acontecimentos históricos.
A sua Trilogia, escrita ao ritmo de um volume por cada dez anos, conta o dia-a-dia de um personagem vulgar, Frank Bascombe, que vive sem grandes ilusões num arrabalde.
Mas cada um dos dez livros de Ford acaba por ser uma espécie de fotografia da América, tal qual a vai vendo ao longo da sua própria biografia. São instantâneos do que se revela dinâmico dentro da sociedade americana., mesmo que passados em diferentes regiões dos EUA. Ele rejeita a possibilidade de ter uma visão global e única sobre o que é a América, já que não a vê passível de generalizações. Será essa uma das razões do seu fascínio.
Ele ambiciona que os seus romances tenham tanta verosimilhança quanto a conseguida nos livros de História. E que o leitor não seja estimulado para ideias feitas sobre a vida.
A Trilogia que tem Frank Bascombe como protagonista pode ser entendida como um fresco sobre a política americana nos últimos trinta anos inspirando-se na constatação feita anteriormente pela escritora George Eliot no seu grande romance «Felix Holt»: não há vida privada que não seja prefigurada na vida pública.
Desde que o compreendeu os seus romances têm essa ambição: transparecer através das vicissitudes por que passam as personagens, as linhas mestras, que relacionam as grandes decisões tomadas nas vidas privadas com as verificadas na vida pública.
No fundo ele acredita que as vidas privadas correspondem á vida pública em dimensão miniatural. Pela vida individual dos cidadãos poder-se-ão compreender-se as grandes orientações da vida coletiva.
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