Há poucas intrigas espetaculares nos romances de Richard Russo, mas o seu olhar é o de um pontilhista. Nascido no Estado de Nova Iorque em 1949, instalou-se em Camden, no Maine, quase na ponta nordestina dos EUA, junto à fronteira com o Canadá.
Os seus personagens favoritos são os habituais atores secundários das histórias alheias, mas que com ele se tornam bastante interessantes: gente da classe média confrontada com dissabores conjugais e com o tédio inevitável das cidadezinhas de província, devastadas pela crise e pelo declínio económico.
Ao lê-lo encontramos uma América quase desconhecida em que os cenários naturais moldam as almas.
Numa entrevista recente Russo confessa a atração pelo carácter humano do sonho americano no que ele pressupõe vontade de viver um outro tipo de vida. Daí que ele desconfie não estar propriamente a falar apenas dos seus compatriotas, mas da generalidade dos seres humanos cujas aspirações raramente coincidem com a subsequente concretização. Porque, desde que o mundo tem bípedes a palmilhar as suas paisagens, quase sempre eles sonharam bem para além do que caberiam nas suas competências e capacidades.
Por exemplo o personagem de Miles Roby no romance «Empire Falls», com que ganhou o Prémio Pulitzer, não é apenas o típico looser, que muitos viram nele. Reconhecemo-lo, decerto, como um frustrado, alguém incapaz de ter cumprido os seus sonhos, mas ele é sobretudo aquele que nunca deu realidade aos sonhos para ele idealizados pela própria mãe. Compreender-se-á assim melhor porque impedirá a filha de avançar para o que deseja fazer, porque ele não consegue livrar-se do herdeiro de sucessivas gerações frustradas.
Esta característica aplica-se a muitas pessoas, que concluem pela impossibilidade de ver concretizado o sonho americano no espaço de uma única geração, quando ele levará provavelmente um mínimo de três para se cumprir. Isso explica o fenómeno coletivo de se andar sempre à procura de um outro futuro em que se aposta a possibilidade de se ser mais autêntico, de se encontrar aquilo que se presume constituir a própria identidade.
Russo confessa a importância que atribui ao conhecimento da rotina dos seus personagens numa clara inspiração em Faulkner que era de um rigor absoluto quanto aos pormenores da sua cidade imaginária no Mississípi. Também ele é obsessivo na captação do âmago desses personagens de forma a tornar mais credível a atmosfera que os rodeia
É esse mundo físico que Russo tenta detalhar, e lhe abrem perspetivas insuspeitáveis para avançar na redação dos seus romances.
Embora cingidos às paisagens do Maine, os personagens de Russo acabam por ser bastante representativos de toda a sociedade americana na permanente falta de dinheiro, na sensação periclitante de manterem emprego em atividades em vias de desaparecimento, na indústria ou em escritórios, não lhes sobrando alternativas quando lhes bater à porta o pesadelo , que os acompanhara anos a fio: ficarem sem recursos para poderem sobreviver.
É a América dos pais e dos avós do escritor, que está em vias de desaparecer e cujo crepúsculo agónico ele capta nos seus livros. Daí o interesse em guardar memória dessas profissões e estados de alma de quem as exercia antes que desapareçam de vez da paisagem americana.
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