quinta-feira, 26 de setembro de 2013

LITERATURA: Os romances de Don DeLillo entre 1988 e 2003

«Libra» (1988) foi considerado o “grande romance americano” de DeLillo, aquele para o qual sempre se encaminhara e que o levara a constatar numa entrevista: “a morte de Kennedy inventou-me.”
O livro alternou duas histórias numa montagem rápida. Na primeira antigos agentes da CIA, furiosos por terem sido atraiçoados pelo presidente aquando da tentativa de invasão de Cuba, imaginam um falso assassinato de Kennedy para o que dispõem de indícios para criarem uma pista, que remontaria até Fidel Castro. Só lhes falta criar um assassino para o que esboçam um retrato-robot.
A segunda história é a da biografia do jovem Lee Oswald, o homem destinado a preencher esse retrato-robot. Ele é um tipo solitário e marginal: até então a vida fora um caos de rascunhos e de esboços. De há muito que ele se vê a si mesmo como um zero à esquerda, com uma obsessão pelo presidente Kennedy ou, pelo menos, pela sua aura mediática. Quando o vê na mira telescópica da sua arma o caos da sua vida focaliza-se: a imagem muda de tremida para bastante clara. No momento em que dispara, ele sai do obscuro anonimato para entrar na “imagem”.
Para DeLillo Oswald não é um psicótico marginal. Pelo contrário, ele é pressionado até ao limite, correspondendo ao estereotipo da identidade americana.
DeLillo disse que “a televisão chegou à América a bordo do Mayflower”. De Emerson ao Gatsby de Fitzgerald, o imperativo americano sempre foi o de trocar um eu antigo e caótico por um eu imaginário - uma imagem magnífica.
«Mao II» (1991) constitui uma espécie de post-scriptum a essa súmula enciclopédica da cultura americana, mas numa vertente ensaística sobre a multidão e a solidão.
A multidão é a massa humana que, em Teerão, acompanha o ayatollah Khomeyni à sua última morada, ou a que, na praça Tiananmen, empunha o Livro Vermelho. É o retrato de Mao, reproduzido até ao infinito por Andy Wharol.
A solidão é a de um escritor fantasma, enclausurado no anonimato, vivendo escondido nas montanhas como se fosse um chefe terrorista.
Em forma quase estenográfica, encontram-se clãs, cabalas e conspirações, mas também a proliferação das imagens até ao infinito e o fascínio pela violência bruta - com todos esses temas a serem escrutinados até à obsessão por DeLillo, que os designa como sintomas dos nossos tempos perturbados.
É um romance que sintetiza não só a macro-história identificável nas capas dos jornais, mas também o insuspeito arquipélago das micro-histórias meio esquecidas.
«Submundo» (1997) é o mais autobiográfico dos livros de DeLillo, que nele recapitula as suas obsessões de sempre, mormente as teorias conspirativas e a sensação de o real não ser mais do que o “`já visto” da imagem, e a expectativa pelo fim dos tempos.
No interstício deste projeto de grande fôlego, escreveu textos breves, quase contos, onde se reconhecem as suas idiossincrasias: «Body Art» (2001) e «Cosmopolis» (2003), com que quis criar uma fábula sobre o fim do mundo no centro de Manhattan.


Sem comentários:

Enviar um comentário