No número de janeiro da edição portuguesa do «Le Monde Diplomatique» a economista Eugénia Pires começa por considerar que “o eclodir da crise financeira internacional encontrou na socialização das perdas do setor financeiro a inédita resposta.”
O resultado foi perverso: o mesmo setor que os governos quiseram salvar com medo de uma crise sistémica, que não pudessem ou soubessem controlar, rejeitou qualquer reconhecimento aos contribuintes sobrecarregados com os efeitos das suas desvairadas jogadas especulativas e trataram de lhes endossar novas e ainda mais pesadas faturas: “a ausência de instrumentos de política monetária e a reduzida margem facultada pelos instrumentos de política fiscal dos Estados-membros levaram o mesmo setor financeiro recém-resgatado a especular contra os países mais vulneráveis da zona euro, que entretanto começavam a registar défices muito elevados e a acumular dívida pública.”
Torna-se, então, crucial a intervenção do BCE, cuja preocupação não esteve com os equilíbrios financeiros dos países da zona euro, mas com a salvaguarda da banca internacional, “aliviando-a da arriscada dívida titulada dos soberanos periféricos. “
Dois anos e meio depois do resgate, a dívida portuguesa não infletiu o ritmo do seu agravamento, que já ultrapassará os 130% do PIB no ano em curso. Por muitos méritos, que passos coelho e os seus ministros reivindiquem, este indicador - que era, afinal, o mais importante a justificar o Memorando da troika! - revela o seu fracasso em todo o seu esplendor.
Para Eugénia Pires a reestruturação da dívida não tem forma de ser evitada. Ainda que a direita tudo vá fazer para a adiar o mais possível. Por razões facilmente explicáveis: “o que normalmente impede as reestruturações é o custo político para o decisor. Razão porque são poucas as reestruturações estratégicas atempadas. Os governantes preferem impor custos sociais substanciais a toda a população a colocar em risco a sua reputação, optando por reestruturações com anulação do capital em dívida apenas quando estas se tornam inevitáveis e, consequentemente, com menor custo político. O receio em afrontar os credores oficiais é visível em reestruturações insuficientes que se multiplicam com significativa amplificação dos seus custos.”
O problema é que, hoje, uma grande parte da dívida do Estado português já fugiu das mãos de credores internacionais estando concentrada na banca nacional e nas instituições públicas como a Segurança Social. O que porá o futuro governo, que já não conseguir evitar a reestruturação da dívida perante opções para a banca nacional não muito diferentes da já suscitada pelo Banif, ou seja, pela sua nacionalização mais ou menos encapotada em virtude da imputação de imparidades.
Perante este cenário, a melhor opção será para a economista “Portugal utilizar a sua soberania e impor unilateralmente uma moratória sobre a dívida para posteriormente proceder a uma reestruturação em termos ambiciosos, que reponham a sua sustentabilidade social e financeira.”
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