A Europa é uma união transnacional, que mais se assemelha a um patchwork heterogéneo do que à promessa de uma nação à escala continental. Mas não é essa afinal a sua divisa? In varietate concordia (unida na diversidade)?
Ela não se cinge, ainda assim, à definição geográfica. A Europa política não pode ter apenas por base a Europa histórica. Senão bastaria a Turquia ser ajuizada pelo seu papel no grande período da Europa Mediterrânica para já fazer todo o sentido estar integrada.
Ora, os critérios estabelecidos em Copenhaga, em junho de 1993, para a admissão de novos países à União enfatizam o respeito pelos direitos humanos numa lógica comunitarista, a existência de sólidas instituições a garantirem o Estado de Direito democrático e uma situação económica não muito distanciada da dos países já integrados.
Logo, quando esses critérios foram preenchidos, não existirão obstáculos para que uma Ucrânia, uma Turquia, uma Arménia e, a um prazo mais alargado, todo o Magreb, venham a inserir-se na União Europeia ou em qualquer outra designação por que será então identificada.
Embora a ideia europeia tenha surgido do imperativo de um futuro de paz num continente entretanto massacrado por duas guerras mundiais bem como da necessidade de o preparar para o advento de uma progressiva mundialização, ela já fora objeto de especulação por Nietzsche, que antevia a união europeia de forma depreciativa, porque facilitaria o sucesso da mediocridade, ainda que pudesse ser eficaz na contenção dos nacionalismos. Ora, o filósofo alemão execrava quase tanto os nacionalismos, quanto os ideais democráticos.
Mas até se pode recuar ainda mais - à época do Renascimento - para detetar ambições da união das nações a uma escala europeia, quando se começa a recuperar da Antiguidade Clássica um dos conceitos de maior relevância para o futuro da civilização: o da Democracia. Que levará séculos a concretizar-se, mas se tende a consolidar depois de muitos avanços e recuos na sua implementação.
Quando, em 1935, Edmund Husserl proferiu uma memorável conferência em Viena, anteviu com justificado pessimismo a evolução europeia, porque sentia em perigo o carácter diferenciador do continente em relação aos demais: o de dar tanta importância ao papel filosófico de propor objetivos para os quais a tarefa de os alcançar se tornaria infinita.
Por essa altura Husserl testemunhava as derivas da razão, que tendiam a desviar a Europa do seu desígnio de condutora da História dos homens. Perante o momentâneo sucesso dos regimes fascistas o filósofo constatava a existência de uma clara distinção entre a Razão e as ideologias da Razão, que tenderiam a dela desviar-se. Ora, sem essa verdadeira orientação racional, a Europa está condenada a tornar-se num continente igual aos demais.
Nesta época de crise da identidade - sobretudo quando estão iminentes eleições, que prometem um inquietante sucesso das ideologias de extrema-direita - a Europa só pode vencer este questionamento do seu projeto se se for capaz de reinventar e relançar…
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