quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

POLÍTICA: Aulas ao sábado em 1966

A polémica em torno de José Sócrates estar ou não na escola no dia do jogo entre Portugal e a Coreia da Norte em 1966 e um documentário transmitido há dias na RTP2 sobre a rendição das tropas portuguesas no então chamado Estado da Índia em Dezembro de 1961, devolveu-me aos tempos da Escola Primária, quando as aulas ao sábado eram um facto a que não podíamos escapar. E sobretudo a um professor, que tive na 3ª classe e se chamava Artur.
Lembro o rosto de tal passado distante por duas razões distintas. A primeira era a de lhe ouvir a indignação veemente pela ocupação de Goa, Damão e Diu, procurando-nos comungar do seu ódio a Nehru e aos “cobardes”, que a ele se teriam rendido sem cumprirem a ordem de salazar de resistirem até à morte.
Hoje, ouvindo os testemunhos de quem teve a desdita de estar nesse local e momento em tal conjuntura, só pode considerar o ditador, que ainda assombra a nossa História, como um ser mesquinho e incompetente, porquanto pretendia defender esse canto do «Império» sem sequer garantir aos militares ali colocados as armas necessárias para ensaiarem sequer um arremedo de resistência.
Cinquenta anos depois só se pode elogiar a magnanimidade das forças indianas, que tudo fizeram para não causar vítimas em adversários armados com equipamento obsoleto, insuficiente e, em muitos casos, avariado.
Quando se veem soldados indianos ao serviço do Exército luso a tomarem posições na margem do rio em Pangim, é risível saber que as espingardas do século XIX com que estavam armados não tinham sequer alcance para levar as balas até à outra margem donde estavam a ser observados pelas forças enviadas por Nehru.
Mas, voltando à polémica em torno de José Sócrates, vale a pena recordar desse professor Artur mais uma  característica: era um fanático adepto da Académica como bom coimbrão que se prezava ser.
Na época o Benfica de Eusébio e Coluna dominava o futebol nacional, mas o professor Artur tentava desmenti-lo nas aulas de todos os sábados à tarde: nessa altura convocava um dos alunos mais baixos, o Germano, para fazer de guarda-redes do Benfica, e um dos mais altos, o José Artur, para mimetizar o da Académica.
Pegando, então, numa bola, fazia na sala do 1º andar da escola um jogo semanal em que a Académica vencia invariavelmente o Benfica, já que as bolas por ele chutadas para a porta a servir de baliza eram sempre demasiado altas para a fraca estatura do Germano e suficientemente baixas para que o José Artur (que viria a ser guarda-redes no clube da terra no então campeonato da 3ª divisão!) as agarrasse.
Quando ouvi esta polémica alimentada pelos suspeitos do costume para desqualificarem o anterior primeiro-ministro, foi inevitável recordar os rostos dessas distantes personagens do meu passado. E que corroboram a veracidade do que ele contou na sua crónica semanal.


Sem comentários:

Enviar um comentário