Uma das notícias inquietantes dos últimos dias foi a da rendição da Valónia ao acordo comercial com o Canadá sob a promessa de não se implementar o sistema arbitral de definir a justiça dos diferendos por ele suscitados e que, invariavelmente, dá razão aos pedidos de indemnização das multinacionais por não conseguirem os lucros expectáveis nos países ou regiões onde se tenta travar a sua ganância.
Temos o exemplo da Philip Morris, que quis receber milhões de dólares do Uruguai devido à colocação nos respetivos maços de cigarros dos anódinos avisos contra os perigos de se fumar.
A guerra em torno deste tipo de resolução de diferendos estará na ordem do dia nos próximos anos porque, como escreve Daniel Oliveira no «Expresso», “na globalização somos todos atirados para alto mar. O que estes acordos fazem é distribuir coletes de salva-vidas a meia-dúzia, garantindo que a democracia nunca interfere nos seus negócios. O que faz é pôr na lei a lei do mais forte, anulando a função moderadora da democracia. O que faz é proteger um dos imprevistos enquanto deixa a larga maioria entregue a si mesma.”
Quem também não gosta de Democracia é a corte de Schauble e de Dijsselbloem, que vão regularmente atacando o governo de António Costa para aferir até que ponto as suas palavras recuperam a capacidade danosa tida ainda há algum tempo, quando significavam de imediato o aumento das taxas de juro ao nosso país.
Muito embora contem com muitos agentes seus nos nossos jornais e em instituições como a da mais do que suspeita dona Teodora, esses senhores vão confirmando a regra já conhecida na história de Pedro e do Lobo. Tantas vezes anunciaram o iminente resgate, que já ninguém lhes liga.
Ainda assim, Nicolau Santos, também no «Expresso» tece justificado anseio: “era bom que a Comissão Europeia se demarcasse destas afirmações. Era bom que Bruxelas tivesse a coragem de valorizar o que deve ser valorizado, mesmo que não aprecie a receita que está a ser aplicada, mas que aparentemente está a conseguir os resultados que a comissão desejava. E sobretudo era bom, que ficasse claro para toda a gente que Schauble e Issing não gostam é da cor do Governo português. E detestam-no tanto que nem sequer falam sobre o que importa: os resultados que na frente orçamental estão a ser alcançados.”
Em dia de lançamento do novo livro de José Sócrates justifica-se a questão: será que os schaubles desta vida são carismáticos e como tal defensores do novo, do risco, do diferente? Felizmente não e já não conseguem sequer enquadrar-se no kitsch político denunciado pelo ex-primeiro-ministro de dizerem aquilo que os seus auditórios querem ouvir.
Hoje em dia deverão existir poucos alemães, finlandeses ou holandeses, que ainda acreditem na burla dos povos do Sul preguiçosos em contraponto com os do norte esforçados e poupados. O problema desses mesmos schaubles é o de se estar a consolidar a ideia de existirem alternativas às políticas por eles ditas como sendo as únicas possíveis. E isso poderá fazer toda a diferença nos próximos anos, tanto mais que surgem sinais de inconformismo dos mais jovens e das atacadas classes médias contra quem deles fez as vítimas principais do crepuscular austericídio.
Georges Braque
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