segunda-feira, 10 de outubro de 2016

Meia dúzia de notas soltas

1. Não achei despropositado que o Nobel da Paz deste ano tivesse sido atribuído ao presidente colombiano embora no seu currículo figurem algumas das páginas mais negras do combate do seu exército - era ele ministro da Defesa do antecessor! - contra as FARC, mormente tentando-lhe decepar as lideranças com atentados mortíferos nas florestas amazónicas. O que se revela injusta é a omissão dos seus interlocutores no mesmo prémio. É que se para dançar um tango são precisos dois parceiros, não se vê porque não se deixa de atribuir a ambos o reconhecimento por terem saído de lógicas violentas para as da paz.
2. Embora não tenha acompanhado uma ínfima parte de todos os panegíricos emitidos nestes últimos dias a António Guterres, estranhei a ausência de uma explicação muito lógica para o cansaço com o pânico nele manifestado após a derrota nas autárquicas de 2001: a recente perda da primeira esposa na sequência de longo e doloroso sofrimento.
Se todos os psicólogos são unânimes em considerar o luto do conjugue como um dos principais fatores de stress, a desistência de Guterres nessa altura afigura-se perfeitamente natural.
3. Sibilino na análise, Pedro Adão e Silva pergunta no «Expresso»: “Imaginemos, por um momento, que Guterres tinha abdicado da candidatura a secretário-geral da ONU para disputar as presidenciais. Será que as características que agora todos louvam seriam salientadas ou, pelo contrário, teria regressado o espectro do pântano?”
4. Compreende-se que António Costa não deseje acicatar a fera enraivecida, indagando Merkel sobre a sua indesculpável atitude em todo o processo de eleição do secretário-geral da ONU. Mas que a chanceler alemã ainda deve estar a perguntar-se como levou uma tal lição de humildade, poucos o duvidam. Até porque, não esqueçamos que a origem da ONU está diretamente ligada à da derrota alemã na Segunda Guerra Mundial.
5. Uma constatação singular: se compararmos a meia dúzia de empresas mais valiosas a nível mundial há dez anos com as que têm essa posição atualmente, só uma se mantém: a Microsoft. E há que reconhecer outra ilação: onde há dez anos figuravam três empresas petrolíferas só resta agora uma. Porque o que está verdadeiramente a dar são as empresas ligadas à indústria digital.
6. No «Expresso» o fervoroso atlantista Miguel Monjardino acusa Putin de paranoia a respeito do cerco montado à Rússia pela Nato e pela União Europeia. Explicar-se-ia assim a brutalidade imposta na Síria, que se trataria de uma fútil demonstração de força por parte de quem se sente inseguro.
O problema é só este: com a queda do muro de Berlim teria sido lícito pensar-se que os dois blocos militares de então se apagariam, pondo fim às estratégias mútuas de dissuasão nuclear.
Só que se a Rússia ficou sem o Pacto de Varsóvia, a União Europeia e os Estados Unidos cooptaram-lhe os membros e viraram-nos ostensivamente contra o seu antigo parceiro.
Se isto não é bastante para suscitar apreensões fundamentadas em alguém não sei o que será mais preciso?

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