segunda-feira, 12 de agosto de 2013

VERSO E REVERSO: a África do Sul enquanto exemplo para equacionar as nossas ideias feitas sobre a forma de gerir o sistema capitalista

A edição mais recente do «Courrier International» em português traz um artigo bastante interessante do sul-africano Ronnie Kasrils no londrino «The Guardian» e, igualmente, inserido na introdução à sua autobiografia «Armed and Dangerous».
O autor, militante comunista durante toda a vida, foi um dos mais proeminentes ativistas brancos contra o regime do apartheid, tendo exercido funções de ministro nos anos subsequentes à chegada do ANC ao poder.
Hoje ele confessa-se desiludido com o rumo seguido pelo regime liderado por Jacob Zuma, já que 50% da população mais pobre do país, só acede a 7,8% do rendimento nacional. Confirmação eloquente de como a promessa de uma progressiva redução das desigualdades sociais não estar a verificar-se, ocorrendo até o contrário: nunca a disparidade de rendimentos foi tão gravosa.
Mas aborda igualmente o logro em que se deixou cair, enquanto dirigente político quando, no pós-apartheid, acedeu à implementação da agenda política neoliberal tal qual foi imposta pelo FMI para o empréstimo então atribuído ao governo do ANC e de conluio com os grandes acionistas das grandes empresas do país (nomeadamente do vital setor mineiro!), cujos direitos de propriedade não chegaram sequer a ser beliscados.
Como balanço de tudo quanto ocorreu neste últimos dezanove anos, Kasrils considera ter-se perdido uma oportunidade para alcançar maior justiça e igualdade num país que, nessa altura estava preparado para mudanças revolucionárias e tinha como argumento muito forte as matérias-primas imprescindíveis para muitas das indústrias ocidentais.
Numa rápida pesquisa pela net não é difícil encontrar quem contesta as posições de Kasrils tão óbvio é o seu alinhamento com o ideal que coerentemente reivindica como seu ao longo de toda a vida. E apontam-se exemplos eloquentes de como as mudanças revolucionárias propostas deram origem a resultados desastrosos: basta olhar para o vizinho Zimbabwe com o nepotismo e a corrupção assumidas por Mugabe e a sua clique a terem como contraponto a miséria generalizada na população, que pretendiam originalmente defender.
Mas, numa altura em que o capitalismo selvagem a que somos sujeitos agrava as desigualdades, enriquecendo quantos já quase tudo têm e empobrecendo os que viviam remediados e vão caindo na pobreza mais incontornável, começam a voltar a fazer sentido muitas das propostas políticas colocadas pelo marxismo.  Até porque casos como o BPN vêm desmentir aquele mito, que nos foi martelado vezes sem conta em como a gestão privada é mais eficiente e menos corrupta do que a assumida por uma economia nacionalizada.  Ou a pertinente evidência de os contribuintes serem cada vez mais fustigados pelo Estado, que lhes retribui com serviços sociais cada vez mais exíguos, enquanto as rendas dos setores essenciais da economia (energia, água, banca, transportes, educação, saúde, etc)  são gananciosamente espoliadas pelos beneficiários das respetivas privatizações.
Se, durante muito tempo, os próprios socialistas se têm conformado com a lógica social democrata de gerir de forma menos injusta o sistema capitalista sem lhe pôr em causa os fundamentos, é altura de se começarem a interrogar se, em vez de se aproximarem do objetivo final da sua adesão ideológica, não têm contribuído para dele se afastarem mais e mais!


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