Confesso um daqueles pecados, que comprometem o mais impoluto dos cidadãos: passados quarenta e cinco anos sobre a idade ideal para o ler, continuo a ter imenso prazer nos romances do Júlio Verne.
Daí que tenha escolhido para leitura estival debaixo do toldo e em frente ao mar, o último romance revisto pelo escritor antes de morrer em 1905.
A história é simples e parte e um facto autêntico: na década de 80 do século XIX o regime colonial francês conjeturou transformar o Saara num jardim verdejante graças à inundação de uma vasta área tunisina entre o Golfo de Gabés e os oásis do interior.
Se o projeto inviabilizara-se em função das dificuldades técnicas e dos elevados custos, Verne imagina a sua concretização por investidores mais ousados e técnicos com maiores conhecimentos. É assim, que acompanharemos o engenheiro De Schaller a inspecionar toda a zona por onde as águas do Mediterrâneo fluirão até formarem um imenso mar saariano.
O problema surge quando os habitantes da região - os nómadas tuaregues e as populações sedentarizadas - começam a dar ouvidos a um chefe tribal recém-escapado da prisão e acreditam na forte probabilidade de verem viradas do avesso a sua cultura e as suas plantações de tâmaras.
Os técnicos franceses e a sua escolta acabam por ficar prisioneiros dos tuaregues e aguardam pela sua provável triste sorte, quando um violento terramoto cria - por artes mágicas - o mar pretendido e ainda afoga os rebeldes locais.
Esse desenlace pouco credível menoriza a valia do romance, que não deixa de propiciar uma leitura agradável se não quisermos sujeitar as meninges a grandes esforços. Tanto mais que evidencia como a ciência e a civilização ocidental podem ser opressoras em relação às aspirações das populações primitivas em preservarem os seus modos de vida.
Em suma, apesar de romance menor de Verne, «A Invasão do Mar» põe em questão a legitimidade do colonialismo, numa altura em que ele estava no auge da sua expansão geográfica...
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