segunda-feira, 5 de agosto de 2013

LIVRO: «Les Immémoriaux» de Victor Segalen (1)

Victor Segalen é dos escritores franceses mais esquecidos na geração que assistiu ao prometedor início do século XX. Em Portugal a Assírio & Alvim e a Cotovia publicaram-lhe três títulos mas, excetuando algumas críticas benevolentes nos jornais do costume, quase ninguém deu por eles.
E, no entanto, Segalen foi uma personalidade de exceção, assumindo-se como um dos pioneiros da moderna antropologia e levando a literatura de viagens para lá do seu habitual registo das curiosidades capazes de espantar o entediado leitor ocidental.
«Les Immémoriaux» irá servir-nos de argumento para abordar o percurso, que o levou de Brest - aonde nasceu em 14 de janeiro de 1878 - até à Polinésia francesa aonde chega vinte e cinco anos depois.
De permeio é importante referenciar alguns aspetos biográficos, que ajudam a caracterizar o seu percurso posterior. Em primeiro lugar os estudos clássicos nos jesuítas, que lhe causarão tal aversão, que tornar-se-á um crítico acerbo da influência religiosa na escolaridade juvenil. Seguir-se-á a formação em Medicina, estudando sucessivamente em Rennes e Bordeús aonde se licencia em 1902 com a tese “Les Cliniciens és Lettres» dedicada á documentação médica rastreada em diversos escritores naturalistas. Terá sido no decurso da sua investigação, que se fez amigo de diversos escritores (Huysmans, Rémy de Gourmont) conotados com a tertúlia da editora Mercure de France.
Convertido em médico da Marinha gaulesa é nomeado para o seu primeiro posto oficial no navio «La Durance», que escala os portos polinésios.
Gauguin morrera três meses antes de aí chegar e depressa o jovem Victor conclui que a civilização maori está mortalmente ameaçada pela influência europeia e pela indiferença da respetiva população. E, no entanto, ao apreciar os quadros, os desenhos e os escritos do célebre pintor em Hiva-oa, é-lhe fácil de concluir o quanto esse povo local usufruíra uma vida feliz e marcada pela sua requintada sensualidade.
Ele nunca refreará a enorme admiração pelo artista, que melhor expressara essa realidade em iminente extinção: logo em 1904 publica o artigo «Gauguin no seu último cenário» e, muito mais tarde, em 1918, assina uma «Homenagem a Gauguin».
Da sua experiência no Taiti, que conclui em 1905, traz material suficiente para escrever «Les Immémoriaux», que publica dois anos depois.
É que, tão só chegado a Papeete, Segalen escrevera uma carta aos pais em que refletia sobre o que estaria subjacente á conceção do seu primeiro livro: É certo que a natureza permaneceu intacta, mas a civilização foi extremamente nefasta para esta bela raça maori!
E o título desse primeiro romance é para ele muito fácil de explicar: desmemoriados, porque encontrara uma população esquecida das tradições, dos saberes, dos e de todas as forças que tinham significado o  próprio passado.
Aparentemente tem uma história com princípio, meio e fim, mas o tema primordial é o da história do declínio de uma cultura por causa dos missionários e dos políticos colonizadores. E, de passagem, ainda tem a oportunidade de um  ajuste de contas com essa rigorosa educação moral e religiosa, que lhe fora imposta pelos jesuítas nos seus verdes anos.


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