O documentário de Jezza Neumann sobre a pobreza nas crianças norte-americanas - «Poor Kids» (2012) - diz muito sobre o carácter criminoso do sistema económico, que condena as pessoas a uma tal dose de infelicidade.
Acompanhando crianças entre os oito e os catorze anos, filhas de mães solteiras ou de casais a contas com a precariedade de emprego, o documentário deveria ser de visão obrigatória (mas quando aqui se propõe tal obrigatoriedade pensa-se por exemplo no personagem Alex de «Laranja Mecânica» forçado a ver violência até ao vómito!) para quem vê a economia e as finanças das nações pela lógica fria das folhas de excel.
Porque vemos rostos concretos, que já souberam o que era viver numa casa e agora vivem em abrigos do Exército da Salvação. Uma miúda que sonha ser bailarina, mas que tem tanta fome e não sabe como iludi-la. Um rapaz a acreditar nas suas capacidades para o futebol americano, mas incapaz de as demonstrar por não haver sequer dinheiro para o inscrever num clube. Um outro, que ganha uns dólares a cortar a relva dos vizinhos, mas só conseguindo quatro dólares ao fim do dia, que entrega à mãe para ajudar na alimentação. Que é à base de pizzas baratas a abrir saudades para as escassas ocasiões em que a fruta e os legumes eram possíveis. Ou a cena pungente em que uma das famílias leva a cadela de estimação ao canil por já não ter dinheiro para a poder sustentar.
E o que custa mais é não haver nelas a capacidade de compreensão das razões porque os pais não têm emprego ou só o encontram mal pago e muito longe de casa. Pior ainda é acusarem-nos pelos males que os apoquentam, como diz a miúda para quem a mãe (solteira) deverá ter errado algures no seu percurso para os levar até aquele beco sem saída.
É, pois, um daqueles documentários muito duros, inapropriados para quem quiser continuar a manter a cabeça debaixo da areia, cega aos sinais evidentes do fim de um ciclo civilizacional, que urge acelerar.
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