Este foi o dia em que se ficou a saber que os empresários estão a entender as novas medidas de austeridade do Governo como uma espécie de retaliação pelo facto de se terem insurgido contra as alterações na Taxa Social Única.
Algo do género: «ai não quiseram beneficiar da TSU, que lhes iria meter tanto dinheiro nos bolsos, então tomem lá com o novo escalão no IRS para não se andarem a armar aos cucos!». E, de facto, correspondendo esse escalão a quem ganha mais de 80 mil euros por ano não será fácil encontra-los entre os trabalhadores de classe média ou baixa, antes situando-se naqueles executivos a quem o governo tanto queria mimar e lhe viraram as costas!
Quem explicou essa evidência foi Lobo Xavier na «Quadratura do Círculo» na Sic Notícias, obviamente insuspeito de ser um perigoso opositor do Governo aonde está representado o seu partido. Ou então começa a fazer ainda maior sentido a primeira página do Expresso de hoje, quando anuncia nova crise entre os parceiros da coligação com uma presumível saída de Portas na próxima remodelação. De facto, para quem pretendia fazer da sua ida para o Palácio das Necessidades o trampolim para vir a liderar futuramente a direita e alcançar o almejado cargo de primeiro-ministro, as coisas não andam a sair muito bem para os interesses de Paulo Portas.
Ainda que os seus correligionários no Governo estejam a dar conta do recado quanto a garantirem as benesses por eles previstas para a classe empresarial. Vejamos o que conta Sérgio Lavos no blogue «Arrastão»: Os ignorantes não sabem, mas o Governo de salvação nacional continua a distribuição de prebendas à corja de empresas parasitárias do Estado. Paulo Núncio, mais um advogado oriundo da constelação de escritórios que mamam na teta estatal, foi colocado pelo partido do contribuinte, o CDS, no lugar que mais convém: secretário de estado dos Assuntos Fiscais. Assim instalado, toca a despachar ao arrepio da Inspeção-geral de Finanças, tratando da vidinha dos empresários que se lembraram de deslocar a sede fiscal das SGPS's para o estrangeiro quando foi alterado em 2010 o regime que isentava de pagamento de imposto os dividendos distribuídos por empresas intermédias da SGPS. Ficam assim milhões por entrar nos cofres do Estado, mas não temeis: teremos sempre a classe média por conta de outrem que não pode mudar o seu domicílio fiscal para esmifrar. O CDS pode continuar a ser chamado "partido do contribuinte", e não interessa se esse contribuinte se chama Alexandre Soares dos Santos. As coisas são como são.
No mesmo blogue, o jornalista Daniel Oliveira vaticina o que sucederá com a implementação das medidas anunciadas por Vítor Gaspar para o Orçamento Geral do Estado para 2013: Do ponto de vista económico, segue o caminho para o abismo. Para além de acentuarem, com a mexida nos escalões, a enorme desigualdade e injustiça fiscal vigente, dá mais uma estocada na economia e nas contas públicas. Mais impostos, menos consumo, mais falências, mais desemprego, menos receita fiscal, mais despesa social, o défice a continuar a derrapar. Menos dinheiro na economia, menos crescimento, menos poupança, mais endividamento externo. Mais défice, mais endividamento público, juros mais altos...
Que tais políticas são erradas salta aos olhos da maioria dos economistas. No blogue «Ladrões de Bicicletas», João Rodrigues escreve: O Estado não se pode tentar comportar como uma família em crise, e tentar aumentar os seus “rendimentos” e cortar nas suas “despesas”, sem afetar as famílias realmente existentes com quebra dos rendimentos, salariais e de prestações sociais, sem pôr em causa os serviços públicos que cuidam e qualificam, sem travar o investimento público que liga e cria atividade. O problema central é a quebra de procura e a austeridade só agrava este problema por todos os lados. O Estado só ajuda quando faz o contrário e contraria a quebra da procura.
Já Jorge Bateira aborda no mesmo blogue outra vertente do atual imbróglio: como voltar a suscitar a empatia entre os portugueses e os seus governantes: O povo não se mobiliza com meias verdades e, por isso, também vai ser preciso dizer-lhe que muito provavelmente haverá que fazer uma escolha crucial: ou a submissão à matriz neoliberal da UE e o subdesenvolvimento como destino, ou a recuperação da soberania monetária e da autonomia na política económica do país. O drama que vivemos exige coragem política.
Coragem política, pois! E sempre foi essa a proposta do recém-falecido Eric Hobsbawm, quando expunha as suas propostas de desenvolver uma linha progressista a uma História a ela tão frequentemente avessa: Ainda assim, não desistamos, mesmo que os tempos sejam insatisfatórios. A injustiça social precisa de ser denunciada e contrariada. O mundo não se tornará melhor por si só.
Hoje torna-se evidente que as esquerdas terão de abdicar dos seus discursos sectários e sentar-se à mesma mesa com o propósito de se unirem na ação convergente para a imprescindível mudança de rumo!
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