Há muito tempo, que me convenci de que as melhores propostas culturais disponíveis na Grande Lisboa são as que noschegam através dos Festivais.
A maioria dos filmes do Indie, do Doc Lisboa ou de outros festivais normalmente apresentados no São Jorge são mais interessantes do que os dos cinemas das pipocas e da coca-cola. E em termos de dança, de teatro ou de artes performativas, embora a diferença de qualidade em relação à oferta proporcionada pelos grupos e companhias existentes não se possa dizer tão gritante, têm a vantagem de trazer novas linguagens e formas de as representar.
É isso que se volta a confirmar com o espetáculo de abertura do Festival Alkantara, agora a decorrer em diversas salas lisboetas.
«Suite nº 1 ABC» é um espetáculo difícil de catalogar: pode parecer teatro pela forma como os seus intervenientes interpretam os textos, que dizem. Pode parecer concerto musical em função do título e da presença de um maestro a dirigir a partitura. Pode parecer um coro, porque se trata de um conjunto de temas vocalizados coletivamente por todo ou parte do grupo de atores. E até podemos considera-lo como exemplo de performance: como não lembrar um excelente vídeo de Noé Sendas com um coro a interpretar o «Robot» dos Kraftwerk? Ou Meredith Monk com as suas vocalizações.
A verdade é que este é um espetáculo, que surpreende pela sua originalidade. De repente é como se estivéssemos numa cápsula do tempo a passar por um universo de sons do nosso tempo, que tanto podem dever a uma notícia de telejornal, como a um discurso de um tele-evangelista, à célebre cena de Robert de Niro face ao espelho em «Taxi Driver» como a um anúncio publicitário entre dezenas de outros exemplos a que o encenador recorreu.
Uma sucessão de textos, que em si mesmos são pouco interessantes, transformam-se em palavras ditas com as modulações de um texto musical, ora mais aceleradas, ora mais lentas, como se se albergassem allegros, adágios, scherzos ou outros andamentos capazes de se sintetizarem numa coerência e numa homogeneidade, que coroam toda a obra. Um bom arranque para o Festival...
Nota - o pequeno filme aqui retirado do You Tube corresponde ao trabalho de preparação do espetáculo de estreia verificado em Paris há seis meses. Em Lisboa os intérpretes foram outros (manteve-se o maestro), bem como os textos escolhidos!
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