domingo, 9 de fevereiro de 2014

LIVRO: «Quand tout est déjà arrivé» de Julian Barnes

Em 2008, trinta e sete dias depois do diagnóstico sobre a doença, que se escondia dentro de si, Pat Kavanaugh  morria deixando o homem com quem vivera trinta anos luminosos à beira do suicídio. Ele ainda se chama Julian Barnes e é um dos maiores escritores britânicos do nosso tempo.
Nos meses seguintes à morte de Pat, os amigos preocuparam-se com a forma como Julian estava a viver o luto, mas seria ele quem resolveria seguir em frente, porque Pat continuava viva na sua memória, e matar-se corresponderia a matá-la em definitivo.
Agora, no livro publicado pela Mercure de France, ele aborda a sua experiência pessoal num relato comovedor no âmbito de uma abordagem, em três histórias separadas, do homem se elevar perante si mesmo, seja pela arte, seja pelo amor, seja pelo luto.
As primeiras dessas histórias até são tratadas de acordo com o registo divertido, que costuma ser a marca de Julian Barnes e que tanto parecia divertir Pat. Quem se lembra de «O Papagaio de Flaubert» não se pode esquecer das gargalhadas inesperadas suscitadas por um humor inteligente e subtil.
Temos a abrir os esforços de Félix Tournachon para conseguir captar imagens da paisagem terrestre a partir da altura a que um balão conseguia subir nos ares em 1858. Mais conhecido como Nadar, ele ficaria imortalizado como o inventor da fotografia aérea.
Segue-se a grande atriz Sarah Bernhardt, também, ela entusiasmada pelos voos em balão e que Barnes nos apresenta na altura em que anda de amores intensos como o coronel inglês Fred Burnaby. Igualmente entusiasmado com a incipiente aeronáutica, o militar estava decidido a casar-se com a sua amada não se desse o caso de não ver correspondida essa mesma intenção. Daí que, de coração despedaçado, ele se vá fazer matar pelas flechas inimigas na batalha de Abu Klea.
É, pois, com a mente divertida de quem acaba de ler duas histórias interessantes e espirituosas, que o leitor desemboca no relato pessoal da dor vivida pelo escritor. para encontrar linhas como estas:
“Vocês falam constantemente ao ser amado desaparecido para que ele saiba.(…) Por isso estou sempre a falar. O que me parece tão normal como necessário. Comento o que estou a fazer. (…) Mantenho viva a nossa conversa privada perdida. Provoco-a e ela provoca-me: conhecemos as réplicas de cor.”
Ou:
“ Vocês reúnem dois seres que nunca estiveram juntos. (…) Depois, mais cedo ou mais tarde, por esta ou aquela razão, um deles é levado. E o que desaparece é muito maior do que a soma do que estava reunido. Talvez não seja matematicamente possível, mas é-o ao nível dos sentimentos e das emoções.”
Não é preciso ter presente o entusiasmo de um Bernard Pivot para considerar este um dos livros mais aliciantes de entre os muitos recentemente aparecidos nas montras das livrarias francesas.
Barnes já era interessante pela sua erudição, imaginação e talento. Agora, ao entrar numa lógica autobiográfica ainda se torna de leitura mais indispensável...


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