domingo, 14 de dezembro de 2014

A solidão dos pecadores

É possível que acaso tivesse vivido nesta época o teólogo dinamarquês Soren Kierkegaard optasse por uma via de guru comportamental, ganhando a vida na escrita daqueles livros de autoajuda em que passos coelho parece ter angariado alguma da sua “cultura”.
Kierkegaard dava tanta importância à questão do pecado como o ainda primeiro-ministro ao do inaceitável despesismo dos portugueses. Por isso mesmo ambos podem equiparar-se em angústias existenciais e desejos de redenção. E se o dinamarquês orientou todo o seu pensamento para o Deus castigador, que o haveria de punir por contra ele ter blasfemado na juventude e por o pai o ter concebido a meias com a criada, passos coelho escolheu como deusa da sua devoção a chanceler alemã cujos améns não dispensa.
Mas as similitudes são capazes de não ficar por aí. Olhando para a biografia de Kierkegaard vemo-lo como assumido dandy entre 1830, quando entra para a universidade, e 1841, quando defende a sua tese de doutoramento. Quer isto dizer que, numa existência curta mesmo para a época (42 anos), Kierkegaard andou armado em boémio entre os 17 e os 28 anos.
Nessa altura nada lhe faltava: a mesada paternal era suficiente para gastar o tempo em festas e convívios de alto teor etílico. Quando, enfim, se formou em teologia, as expectativas eram as de se casar e dar aulas. Mas a noiva põe-no a andar, a preguiça é-lhe congénita e a própria carreira de pastor protestante revela-se-lhe inexequível dado o tom de voz quase não permitir ouvi-lo.
A opção pela carreira das letras é um artifício inevitável para manter as aparências de um ócio produtivo. Iniciam-se aí as elucubrações místicas de um filósofo, que na realidade nunca passou de uma criança grande, uma espécie de querubim incapaz de crescer.
Relativamente admirado por uns quantos - diria um professor que tive na Escola Náutica, “haver gente para tudo” - Kierkegaard nunca foi filósofo, que me merecesse qualquer simpatia.
Ainda assim, quando lhe comparei o percurso com o de passos coelho foi inevitável encontrar-lhes similitudes. Por muito que as histórias mais comprometedoras sobre o passado de passos coelho estejam por demonstrar, sabe-se que só muito tardiamente se formou e andou a conciliar a vida na juventude partidária laranja com o gosto pela boémia.
O fundamentalismo tardio em que investiu soa a arrependimento falacioso por ter praticado todos os pecados, que hoje proclama inaceitáveis: querendo criminalizar ainda mais o enriquecimento ilícito questionamo-nos se se esqueceu de quanto andou a fazer na Tecnoforma de braço dado com o amigo miguel relvas. Proclamando uma política de “verdade” para com os portugueses dá para apostar se ele os julga suficientemente alzheimeriados para já terem esquecido as mentiras da campanha eleitoral do verão de 2011.
Kierkegaard viria a ser tido como um dos filósofos mais ligados ao conceito de “solidão”. Dificilmente poderemos imaginar o futuro de passos coelho sem passar pela condenação ao opróbrio, mesmo pelos que ainda se declaram seus amigos, quando a realidade o desmascarar, a par com o seu padrinho de Belém, como um dos maiores equívocos na História política portuguesa deste século!

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