terça-feira, 22 de abril de 2014

POLÍTICA: A gota que pode extravasar a fúria contida dos que se sentem esmagados!

Que afã deverá ser hoje o dos antigos bloguistas, que pululam nos corredores e nos gabinetes da governação, obrigados a inventarem novas expressões para esse cada vez mais volumoso bornal com que conseguiram já enriquecer a sua novilíngua. É que, se as palavras do figurão do FMI na troika são para levar a sério os sacrifícios ainda não chegam e novas malfeitorias se adivinham no horizonte.
Redução dos vencimentos dos que trabalham na esfera privada da economia? Ainda mais do que aquela que vem sendo conseguida à custa do congelamento dos salários ou da substituição dos que tinham maiores vencimentos por outros, que tão reconhecidos se mostram por ganharem bem menos?
Facilitar ainda mais o despedimento sem justa causa contornando o texto constitucional e levando à prática o velho sonho de passos coelho em transformar as relações de poder entre empregadores e empregados na velha máxima salazarenta de uns mandarem tanto quanto quiserem (com a expectável prepotência dos “chefes”) e os outros obedecerem sem pestanejar sob pena de sarem corridos a pontapé?
Sem esquecer obviamente a redução permanente das pensões de reforma graças a fórmulas e variáveis, que funcionarão sempre no sentido da sua redução e nunca no da sua atualização.
Como é que os spin doctors de pacotilha encontrarão eufemismos da mesma igualha desse «desonerar» e dessa «maçadoria» com que passos coelho nos brindou na recente e antológica entrevista ao obsequioso gomes ferreira?
Estamos mergulhados num daqueles momentos, que lembram um poema de Camões:
Os bons vi sempre passar
No mundo graves tormentos;
E, pera mais me espantar, 
Os maus vi sempre nadar
Em mar de contentamentos.
Os justos sofrem, por agora, os ditames dos que julgam possível manter as coisas tal qual estão. Mas há tanta gente perdida, tanta gente esmagada, a engrossar a rio cada vez mais turbulento que flui por entre margens difíceis de o conter.
As sondagens, que vão saindo, revelam uma tendência crescente de gente a reconhecer-se no 25 de abril, no manifesto dos 74 e em toda e qualquer perspetiva séria de devolver a esperança a quem dela tem sido sucessivamente espoliado.
Quem viu a multidão, que foi para a rua congratular-se com a vitória do Benfica no Campeonato, descoroçoou por aquilo representar o travão de um dos tais efes à vontade de mudança. Na perspetiva de ver outro dos efes - o das homilias dos bispos e cardeais - bastar para manter as ovelhas ordeiramente recolhidas no redil.
Mas pode significar o contrário: a exemplo do sucedido há 40 anos as pessoas estão desejosas de  darem expressão às suas emoções na rua e sentirem-se irmanadas a tantos outros que pensam como elas. Ontem foi sobre o Benfica, há ano e meio (no inesquecível 15 de setembro) foi para dizer não à política austeritária do governo, há quarenta anos foi o mar de cravos vermelhos a impedirem que spínola e outros que tais tomassem conta dos sonhos que não lhes pertenciam.
Chegamos a este 25 de abril com os dominados a quererem falar em vez dos dominantes, a capacitarem-se de que só deles depende que a opressão prossiga ou de que ela acabe. A adivinharem que os vencidos de hoje poderão ser os vencedores de amanhã. 
É por isso que confio que este 25 de abril irá ser muito especial com muitos, mas mesmo muitos, a sentirem que podem ser a tal gota de água, a tal que fará extravasar o que já encheu demais.


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