terça-feira, 29 de abril de 2014

POLÍTICA: E o mundo continua a girar!

Muito embora alguns ministros e cavaco silva sejam pródigos em negar que a solução para o crescimento do país e a redução do desemprego passe por baixos salários e qualificações dos recursos humanos das empresas, nem sequer ao observador mais desatento escaparia ter sido essa até aqui a estratégia do governo e dos seus cúmplices da troika.
A perda de direitos, que os trabalhadores portugueses têm constatado nos últimos três anos, vai a contracorrente do que é a realidade nos países mais desenvolvidos da Europa e da América, onde voluntariamente ou por imposição legal, os empregadores são instados a respeitar horários de trabalho mais reduzidos para os seus recursos humanos sem que isso implique perda de rendimentos.
É que, depois de anos a fio em que o neoliberalismo tem tratado os trabalhadores como meros números a inserir em folhas de cálculo quase abstratas, volta a instalar-se a ideia de que as relações dentro das empresas não se resumem ao poder de uma minoria elitista em relação à grande maioria apenas instada a vender a sua força de trabalho sem emitir a mínima forma de contestação. Porque os casos de burn out, traduzidos em perdas de muitos dias de trabalho, de custos avassaladores para os serviços de saúde públicos ou privados, e até em número de suicídios, fez soar as campainhas de alarme em muitos gabinetes de decisores políticos ou empresariais.
Em Portugal a situação é calamitosa como se depreende do estudo apresentado pela Associação Portuguesa de Psicologia da Saúde Ocupacional à Comissão Parlamentar de Saúde em 12 de março transato e que abrangeu 37 mil trabalhadores do setor público e privado. Nele se concluía que entre 2008 e 2013:
· a percentagem de trabalhadores com evidentes sinais de esgotamento cresceu de 9% para 15%;
· a percentagem dos que afirmavam enfrentar situações de stress nas suas empresas passou de 36% para 62%;
· a vontade de mudar de emprego no prazo de cinco anos aumentou de um terço para 78%  numa demonstração do mal estar sentido no ambiente de trabalho;
Em França, o país europeu mais avançado na definição de políticas laborais passíveis de erradicar o fenómeno do burn out têm sido tomadas medidas que, os nossos austeritários governantes tenderiam a associar a reivindicações esquerdistas:
· proibição de reuniões a desoras;
· apagamento automático das luzes a determinada hora para evitar o prolongamento do horário de trabalho;
· proibição de resposta a mensagens da intranet fora das horas de trabalho;
Mas não se pense que essa conduta de responsabilidade social fica restringida à França. Vejam-se outros três exemplos elucidativos de uma tendência, que ainda tarda em implementar-se entre nós:
· a Volkswagen alemã decidiu em 2011 começar a “apagar” os seus servidores informáticos entre as 18h15 e as 7h00. Pouco depois, a Deutsche Telekom copiou a ideia.
· a cidade sueca de Gotemburgo decidiu reduzir o horário de trabalho de sete para seis horas diárias, sem alterar o salário. Na fase inicial, a experiência está circunscrita a um grupo de funcionários públicos.
·  no Utah, Estados Unidos da América, os funcionários públicos têm vindo a beneficiar de fins-de-semana de três dias.
Se às vezes tentam fazer-nos crer que o movimento celeste está parado com o diktat das troikas e dos monopólios no seu centro, a realidade encarrega-se de demonstrar que el mundo sigue girando, como cantavam os Aguaviva.
(para este texto muito contribuiu o de Natália Faria inserido no «Público» de 28/4/2014 com o título «França proíbe contactos com o chefe fora das horas de trabalho»)


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