Hoje vota-se aqui e na Catalunha. E os resultados, em ambos os casos, comportarão efeitos mais a longo prazo do que no imediato. Porque existem dinâmicas, que estão a manifestar-se, mas cujos impactos só criarão mudanças, quando desequilibrarem de vez as paridades que subsistem.
Quem poderá ainda alimentar dúvidas sobre a inevitabilidade da vitória catalã depois da forma desajeitada como Rajoy lidou com o problema? Se chegámos a este dia com uma relativa partição igual entre os que pretendiam e os que rejeitavam a independência, a ocupação castelhana terá feito mudar de campo, quem ainda acreditava numa Espanha plurinacional. E, para os que veem nesta dinâmica apenas a vontade de povos mais ricos não pagarem os «luxos» dos mais pobres, é melhor pensarem, porque só 74 anos depois de Portugal ter concretizado a Restauração do seu Estado é que as forças militares castelhanas conseguiram sujeitar a nação rebelde a mais uma longa submissão.
Liberdade de expressão, respeito pelo direito à autodeterminação dos povos, Democracia efetiva e não apenas formal - eis o que o herdeiro de Franco pretende sonegar ao povo rebelde. E a História mostra como costumam acabar estas crises: ou com o esmagamento violento dos revoltados ou com a sua vitória. Ora, numa Europa ainda apostada em dizer-se democrática, a primeira alternativa está rapidamente a impossibilitar-se.
Entre nós a votação não vai pôr nada em causa na maioria parlamentar, mas condicionará seriamente as direitas. Uma liderança legitimar-se-á, a outra confirmará o inevitável declínio. O velho sonho do partido mais pequeno dessa área política sobrepor-se em importância ao putativo aliado, mas também rival, ganhará súbito interesse nos meses que virão. Não será difícil crer que as batalhas dentro das direitas serão bem mais acesas do que entre as esquerdas. O que alicerça a confiança num longo ciclo político orientado para transformações sociais e económicas capazes de reduzirem as obscenas desigualdades entre os mais ricos e os mais pobres. Alie-se a competência na governação à convergência de valores ditados pela mesma matriz ideológica e poderá aqui criar-se um modelo progressista de sucesso a ser replicado noutras coordenadas geográficas.
Haverá, porém, não incorrer em excessos de confiança: custa muito esforço construir, mas deitar tudo a perder é questão de breve e trágica inabilidade. Os riscos são muitos, tanto mais que coisas esdrúxulas - racismo, xenofobia, sexismo, etc. - ganham relevância em quem está apostado no uso de tais armas como alternativa à incompetência dos seus mais apresentáveis paladinos. O que obriga as forças políticas a incrementarem a proximidade com os cidadãos, desafiando-lhes as inércias de alienação, com que as televisões, as igrejas, os futebóis, os tentam neutralizar.
Sendo um domingo em que importa o exercício do voto, não se pode esquecer que a Democracia está longe de se esgotar nele. A Política com maiúscula tem de ser exigência para amanhã, e depois, e depois, porque se Deus permitiu-se descansar ao sétimo dia, em quem pretende uma sociedade mais justa e próspera não há trégua, que se justifique.
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