sábado, 28 de outubro de 2017

Conhecer as origens do conflito ucraniano

É um país dividido entre dóis polos: o ocidental e o russo, e ganhou maior relevância nos noticiários internacionais quando, em março de 2014, a Crimeia foi ocupada, depois de um referendo organizado pelas autoridades alinhadas com o Kremlin. Embora essa nova realidade continue a merecer repúdio de alguma comunidade internacional, ela está perfeitamente em consonância com a História dessa região, situada no cruzamento de influências entre os referidos dois polos.
Hoje a Ucrânia tem fronteira a oeste com a Polónia, a Eslováquia, a Hungria e a Roménia - pertencentes à União Europeia! - e a Moldávia. Ao norte fica a Bielorrússia, enquanto a Rússia situa-se a leste, partilhando dois mil quilómetros de fronteira comum. A sul fica o mar Negro e o mar de Azov.
O país conta com 44 milhões de habitantes e tem por capital Kiev, nas margens do rio Dniepr, que atravessa o país. A sul e a leste - sobretudo na Crimeia, em Lougansk e em Donetsk - fala-se o russo, enquanto a norte e a ocidente impera a língua ucraniana.
Remontando no tempo constatamos que o principado de Kiev foi fundado no século VIII por vikings. Em 908 Vladimir, o Grande, converte-se ao catolicismo, nascendo aí a Grande Rússia. Daí a intenção permanente do Kremlin em não dissociar-se daquela que consideram ser o berço original da sua orgulhosa pátria.
No século XI o principado está no seu apogeu, estendendo-se do Báltico ao mar Negro, e constituindo um notável centro de atividades artísticas e religiosas como complementos ao comércio florescente, ou não passassem por ali as grandes rotas comerciais da época.
Em 1667 o território norte-ocidental pertencia à República das Duas Nações (Polónia e Lituânia), enquanto o czar da Rússia exercia poder sobre Kiev e o território sul-oriental. Excluía-se o Khanato da Crimeia maioritariamente povoado por tártaros. Até 1783, porque o Império Russo anexa a cobiçada península nesse ano e, doze anos depois, Catarina, a Grande, expande o território para a margem ocidental do Dniepr, deixando ao Império Austro-húngaro algumas terras mais periféricas. Doravante a língua ucraniana é proibida, Moscovo passa a chamá-la de Pequena Rússia, convertendo-a no seu celeiro. Mas também ai cria a primeira indústria do vasto império na zona oriental do Donbass.
Em 1917, com a revolução de fevereiro em Petrogrado, a Ucrânia acede pela primeira vez à independência. Em novembro o parlamento de Kiev, a Rada, opõe-se aos bolcheviques e proclama a República Popular da Ucrânia. Mas já então, a leste, é proclamada a República Soviética da Ucrânia com posicionamento pró-russo e capital em Kharkov.
A independência pouco dura porque, em 1922, o Exército Vermelho ocupa o país e proclama a República Socialista Soviética da Ucrânia, integrada no conjunto da URSS.
Nessa década a coletivização forçada das terras suscita a oposição dos camponeses, que fundamentam o despertar nacionalista do país. Estaline dobra a resistência através do extermínio pela fome, que causará cerca de seis milhões de mortos.
Durante a Segunda Guerra Mundial as fronteiras estendem-se para ocidente em prejuízo dos vizinhos checoslovacos, húngaros e romenos. Calcula-se que, entre 1941 e 1945 tenham morrido oito milhões de ucranianos.
Em 1954 Nikita Kruschov ofereceu a Crimeia à Ucrânia, que estava a ocupar um papel primordial no conjunto da economia da URSS: produzia 1/4 da agricultura soviética e as minas de ferro e o carvão alimentavam o complexo militar e industrial da superpotência.
Em 1991, na sequencia da implosão do regime soviético, a Ucrânia recupera a independência, mesmo mantendo-se na esfera de influência da Rússia sob o comando da política neoliberal e autoritário do presidente Kuchma.
As eleições de 2004 voltaram a revelar um país cortado ao meio com o russófono Viktor Ianoukovitch a confrontar-se com o pró-ocidental Viktor Iouchtchenko. A vitória do primeiro não é aceite pelos apoiantes do segundo, que levam por diante a chamada Revolução laranja, que dura várias semanas.
Vista de Moscovo esse movimento é visto como uma ameaça aos seus interesses estratégicos, tanto mais que a União Europeia e a Nato estavam a avançar mais e mais na direção das suas fronteiras. E a Casa Branca avançou com todas as suas forças militares e clandestinas para fazer dá Ucrânia a sua aliada mais fiel na região.
A Rússia vai então utilizar o gás como sua arma preferencial cortando o fornecimento nos invernos de 2008 e 2009. Face às consequências dessa torneira subitamente fechada, a primeira-ministra Iulia Timoshenko vai a Moscovo assinar um novo acordo com Vladimir Putin. Em resposta a União Europeia tenta cercar a Rússia mediante acordos que faz com a Arménia, o Azerbaijão e a Geórgia a sul, e com a Bielorrússia, a  Moldávia e a Ucrânia mais a ocidente.
Putin, por seu lado, multiplica as pressões para que a Ucrânia se junte a uma União Alfandegária entre a Rússia e as antigas repúblicas soviética, que além da Bielorrússia e o Cazaquistão, também deveria integrar o Uzbequistão, o Quirguistão,  o Tadjiquistão, a Arménia, o Azerbaijão e a Moldávia.
A Ucrânia era, pois, um dos países convidados para os projetos de relação económica preferencial com os dois blocos políticos. Em 2010 Ianoukovitch ganhou as eleições presidenciais, renunciando ao acordo com a União Europeia e reforçando o apoio ao proposto pelo presidente russo. Imediatamente se congregam grandes multidões na praça Maidan,  agudizando as divisões históricas ancestrais. Ianoukovitch é forçado a fugir para escapar à eliminação, que os golpistas almejavam e a Rússia ocupa a Crimeia, suscitando as sanções da União Europeia e dos EUA.
Logo de seguida as regiões de Lougansk e de Donetsk separam-se do resto da Ucrânia numa guerra que não chega a conhecer tréguas apesar de assinado em Minsk um acordo para as impor. O que hoje mais custa aos golpistas filofascistas de Kiev é que o Doubass tem 5 milhões de habitantes e é a região mais rica do país, potencial que não conseguem aproveitar para os interesses plutocratas  a que estão ligados.

Sem comentários:

Enviar um comentário