A quinta temporada de «House of Cards» foi-me penosa de seguir porque, refletindo o estado pútrido da política americana comprovado na eleição de Trump, contribui para a consolidação da peregrina ideia de não existir quem seja isento de corrupção nos meandros de Washington - precisamente a mensagem ideológica, que o atual presidente inoculou no seu ignaro eleitorado de forma a dar-lhe ensejo para a revolução ultrarreacionária de que se faz orgulhoso expoente.
Do Arkansas ao Texas, do Alasca ao Mississípi, uma significativa percentagem do eleitorado achou ajustada a ideia de pôr os políticos da capital com trela conduzida por um sinistro anjo exterminador.
As últimas décadas, sobretudo depois da queda do muro de Berlim, facilitaram a tese do fim das ideologias, restringindo a política aos jogos de poder entre interesses plutocráticos e sem escrúpulos.
Infelizmente o mundo da social-democracia e do socialismo democrático foi tomado de assalto por gente da estirpe de Blair, Schroeder, Gonzalez ou Hollande, que puseram de lado os princípios fundamentais de tal corrente do pensamento ideológico e contaminaram o respetivo espaço à esquerda com a promiscuidade dos negócios instalados.
Frank e Claire Underwood, apoiados numa máquina administrativa colocada ao seu serviço e não dos cidadãos, perseguem objetivos estritamente pessoais, que nada têm a ver com as obrigações constitucionais sob que prestaram juramento. Como os citados exemplos «socialistas», mas não só, pois basta pensar em Portas e Barroso para concluir como a estratégia é transversal a todos os partidos do poder e comportam quem entra para a política para dela se servir escusando-se ao interesse coletivo, que deveriam priorizar.
É por isso que Bernie Sanders - apesar de ostensivamente ignorado pela cúpula do Partido Democrata - assume importância tão fundamental na regeneração das instituições por agora sequestradas pelos políticos republicanos. Porque, quer desse, como deste lado do Atlântico, importa revalorizar, se não mesmo regenerar, a Política, devolvendo-lhe a nobreza de quem dela faz a expressão do bem comum.
Não admira, pois, que o velho senador do Vermont tenha imposto a ideia socialista como eixo da sua candidatura à Casa Branca. Porque essa recuperação dos valores éticos no exercício de cargos públicos implica afastar de vez a ideia de não existirem diferenças entre esquerda e direita, ou já estarem fora de moda os preceitos analíticos propostos pelo marxismo.
Estamos, precisamente, no momento em que importa voltar atrás, retomar a mesma bandeira e sabê-la empunhar por novas direções, diferentes daquelas que, ilusoriamente, deveriam fazer-nos aproximar da Utopia e dela nos afastaram...
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