Por um breve instante a direita deixou de considerar o Tribunal Constitucional uma força de bloqueio e lançou foguetes sobre a «constitucionalidade» das 40 horas semanais. E mais: mantendo uma pressão constante sobre os juízes quis dar-lhes um «estímulo positivo» ao prenunciar para o futuro a mesma complacência para com as medidas que constam ou influenciam o Orçamento de Estado para 2014.
Mas terá sido assim tão positivo para a direita o acórdão formulado pelo juiz Machete? Em princípio sim, porquanto em tudo quanto decorrer do poder decisório da coligação, a imposição do alargamento de horário possibilitará, a curto prazo, ganhos aparentes de produtividade e redução dos efetivos necessários para cada serviço.
Há, porém, outra forma de ver o problema. O acórdão é bem claro quando permite às associações sindicais e às entidades empregadoras públicas a negociação de horários de trabalho mais favoráveis.
Cabe, pois, à esquerda, que controla órgãos de decisão, quer a nível regional (Açores), quer autárquico, dar o impulso necessário para que a contratação coletiva com os sindicatos se torne uma realidade e volte a ganhar a relevância perdida nos anos mais recentes, quando, ao contrário das diretivas da OIT, esse instrumento tem-se desvalorizado por culpa exclusiva do patronato.
Ao negociar e manter o horário das 35 horas semanais como bitola numa importante parcela do setor público, a esquerda e os sindicatos mantêm a pressão social necessária para que ela se imponha, quer em quem trabalha para o Estado, quer mesmo no setor privado, como resposta eficiente de combate ao desemprego.
É a velha regra da ação dinamizar, e de que maneira, a reação dos que foram pressionados. E, com uma Europa onde o próprio durão barroso foi forçado a reconhecer o fracasso da política ditada por quem domina as instituições sedeadas em Bruxelas e em Estrasburgo - de 2010 até agora já aumentou em 6,7 milhões o número de pessoas em risco de pobreza ou de exclusão no espaço dos 28 - ou com o próprio Papa a apodar o capitalismo de “nova tirania”, crescem as condições para se infletirem os discursos políticos dos últimos anos.
Bastará que, a exemplo do que Mário Soares evocou como risco na Aula Magna e que Francisco quase repetiu palavra por palavra em Roma - uma iminente explosão de violência sobre quem tem sido responsável por esta austeridade a qualquer custo - para que a direita, enfim confrontada com os seus medos maiores, seja obrigada a regressar aos seus covis e dê espaço a estratégias orientadas para as necessidades dos cidadãos.
Nesse previsível futuro próximo (“aquele que está vivo, não diga nunca NUNCA”, aconselhava Brecht!), a batalha pelas 35 horas fará todo o sentido. E transformará a presente imposição das 40 horas num aborto legislativo convenientemente eliminado porque disforme de acordo com os critérios da justiça social e da democracia.
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