O nosso fascínio pela civilização, que habitou a Ilha de Páscoa e aí construiu os estranhos moais, não nos deve impedir de colhermos as lições para interpretarmos os desafios que, nós próprios, enquanto portugueses do século XXI, estamos a enfrentar.
O documentário da National Geographic que, em 2011, cuidou de abordar o mundo subterrâneo da Ilha, confirma o que já se sabia há algum tempo: colonizada por povos provenientes da Polinésia, a Ilha assentava em três vulcões extintos, que haviam propiciado um verdadeiro paraíso natural com palmeiras gigantes a sobressaírem de luxuriantes florestas, com aves aos milhões e água com fartura.
Em poucas décadas os poucos habitantes iniciais multiplicaram-se até atingirem os vinte mil habitantes divididos em diversas tribos, que rivalizavam entre si quanto aos moais mais impressionantes com que, igualmente, contavam homenagear os espíritos dos seus antepassados.
Só que, para além dos ratos de que se tinham feito, involuntariamente acompanhar, e que comiam as sementes das potenciais árvores, que deveriam manter a riqueza florestal, os ilhéus dizimaram todos os troncos disponíveis para movimentarem as toneladas de pedras esculpidas desde a pedreira até aos locais da sua definitiva colocação.
Quando, em 1722, os holandeses aportaram ali pela primeira vez, encontraram uma população reduzida e esfomeada, sem recursos agrícolas e sem forma de construir os barcos com que poderia ter-se abastecido de peixe nas águas mais profundas em torno da ilha.
Daí que não estivessem esquecidas algumas décadas tenebrosas em que o caos reinara e se chegara a praticar o canibalismo. Tudo evidências recolhidas nas diversas expedições arqueológicas, que vêm esclarecendo as circunstâncias de um verdadeiro apocalipse localizado.
Mal sabiam os infelizes sobreviventes da decadência inexorável da sua civilização, que o pior ainda não sucedera: quer pelas armas de fogo, quer pela escravatura a que foram sujeitos na América Latina, quer ainda pelas doenças para que não estavam protegidos (sífilis, varíola), deles não restavam mais do que uma centena de sobreviventes em meados do século XX.
Agora que são grandes as certezas sobre as circunstâncias desse desastre civilizacional, é fácil concluir que ele se deveu à incapacidade em pensar distanciadamente no futuro, planeando com cautelas redobradas a forma como se deveriam utilizar os recursos disponíveis. Faltou uma liderança unificadora de todos os habitantes da ilha - que preferiram rivalizar em diversas etnias! - e a mobilização para um desenvolvimento sustentável. O papel da religião comprovou-se ser extremamente nefasto ao requerer esforços humanos e naturais, que superavam em muito as capacidades da ilha.
Faltou, pois, a Visão de futuro, de que estamos tão carecidos a nível de governantes. Se eles não promovem a construção de moais, não deixam de consumir recursos exagerados com os deuses do seu deslumbramento: os credores, a troika, as agências de rating e os mercados, para quem se consomem recursos de curto prazo. Recursos que tanta falta nos farão daqui a pouco, quando novas lideranças políticas promoverão a redenção destes dois anos e meio de entrega a interesses estrangeiros das joias da coroa ainda remanescentes de outras anteriores rendições ao presente imediato.
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