quarta-feira, 20 de novembro de 2013

FILME: «Nosferatu, o Vampiro» de F. W. Murnau

Murnau só se tornou cineasta, quando já passara a barreira dos trinta anos. Anteriormente já se cruzara com Max Reinhardt, com Conrad Veigt e com Ernst Lubitch, quando trabalhara em teatro depois de estudar História da Arte. Ainda assim conseguiu tornar-se num dos grandes pilares do cinema alemão, sendo indigitado pela poderosa U.F.A. para grandes produções como o foram «O Último dos Homens» (1924) e «Fausto» (1926). Parte então para a América, onde rodará duas obras-primas absolutas: «Aurora»( 1927) e «Tabú» (1931).
«Nosferatu, o Vampiro» (1921-1922) é o seu décimo filme e constitui obra inesperada num realizador prolixo e que tinha abordado, até então, temas bem diferentes.
A história tem como protagonista o jovem Thomas Hutter, que é enviado à Transilvânia pelo patrão, o agente imobiliário Knock, para que aí conclua com o conde Orlock o negócio da compra de uma casa  na praça central da cidade de Wisborg.
Num albergue próximo do castelo do conde, Hutter é alertado pelos aldeãos quanto ao grande risco em que incorre. Um livro que encontra no quarto elucida esse perigo: o vampirismo.
Apesar de estar de sobreaviso ele vai ao castelo de Orlock, que ali o convida a pernoitar. Durante essa estadia, Hutter vê-se acossado por pesadelos, e constata ter sido mordido no pescoço durante o sono.
Orlock, que não é senão o vampiro Nosferatu, deixa o castelo depois de ter vislumbrado o retrato de Ellen, a esposa de Hutter.
No trajeto para Wisborg, ele lança uma epidemia de peste por onde passa, até se instalar na casa situada em frente da de Ellen. Esta possui dons de médium e adivinhou à distância o que se passara com o esposo. Pressentiu a chegada de Orlock e compreendeu que só salvaria a cidade da peste e do vampirismo se se desse ao sacrifício.
Uma noite consegue reter Nosferatu perto de si e aos primeiros alvores do dia,  o vampiro desfalece, enquanto Ellen morre nos braços de Hutter.
O argumento retoma no essencial o romance de Bram Stoker, que inaugurara o género. O desafiio consistia em ver um cineasta habituado ao estranho, mas não propriamente ao fantástico, realizar um filme de terror.
O subtítulo do filme, «Uma sinfonia do horror», indica-o e os seus contemporâneos não se enganaram: Bela Balázs anotava que se sente no filme os sopros gelados do Além
Ainda hoje são impressionantes algumas das imagens do filme, particularmente nas que se vê o vampiro a aproximar-se das suas vítimas sob a proteção das sombras. Tais imagens, potenciadas pelo aspeto físico excecional do ator que o encarna, beneficiam de violentos e depurados contrastes, bem como de enquadramentos irrepreensíveis.
A exemplo de muitas outras obras fantásticas, esta foi interpretada frequentemente como tratando-se de uma alegoria. Houve quem visse na viagem para encontrar um morto-vivo que transporta consigo a peste uma metáfora da passagem do consciente para o inconsciente (lembremo-nos da contemporaneidade do filme com a obra de Freud) ou a recordação de um mito da descida aos infernos.
De qualquer forma o destino do casal protagonista evoca o de uma fábula: Hutter é um homem mas, paradoxalmente, o único a escapar indemne apesar da dentada do vampiro. Salva-o o casamento com Ellen, mulher etérea e dotada da suprassensibilidade de uma vidente.
Na altura da estreia o filme foi bem acolhido devido à sua ambiência angustiante e à verosimilhança das suas imagens, muito embora não tivesse sobressaído da catadupa de filmes policiais, góticos, fantásticos e, particularmente, expressionistas, próprios dessa época. Mas a sua distribuição em França a partir de 1928 viria a mudar-lhe a sorte ao cair no goto dos surrealistas, sensíveis à presença desse sopro misterioso que, segundo o credo do movimento, constituía a essência da poesia. O crítico Ado Kyrou chegou a sugerir que o ator Max Schreck tinha tal nome por pseudónimo já que, na realidade, ele era o próprio Nosferatu…
Na realidade Max Schreck era um prestigiado ator de teatro, que voltaria a rodar com Murnau um outro filme, uma comédia intitulada «Die Finanzen des Grossherzogs» (1924). Se aqui causa teror deve-o à transfiguração nele operada pelo estilo do cineasta, sobretudo nas cenas rodadas no castelo, onde a impressão gráfica das imagens atinge o seu paroxismo.
Ao contrário de outros realizadores, que reivindicam a ligação ao expressionismo, Murnau recorre a uma realização mais subtil e complexa, compondo os planos para neles deixar ler o sentido da ação em curso. E, na montagem, ele também recorre a interligações de olhares  e de sugestões, que só confere consistência dramática ao seu projeto.



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