Três anos passados sobre o seu desaparecimento físico, Eric Rohmer vê a sua obra a ser novamente exibida nos ecrãs parisienses ou a ser apresentada em coletâneas de DVD, que surgem como potenciais prendas natalícias.
Um dos filmes mais apreciados é «O Joelho de Claire» (1970), o quinto dos seus seis contos morais em que os personagens falam, falam, mas não são capazes de amar. O que eles fazem é imporem-se regras entre si e desafiarem-se.
Na época Rohmer acabara de realizar «A Minha Noite em casa de Maud» e «A Colecionadora», consolidando o projeto dos contos morais com regras draconianas (todos com a mesma estrutura, tema e estética!) destinadas a abordar o tema da fidelidade. Os personagens estudam as suas reações e testam a respetiva moral .
Em «O Joelho de Claire» temos dois personagens envolvidos numa história recheada de pistas falsas: Jêrome (Jean-Claude Brialy) explica a Aurora ter-se envolvido com Laura, mas estar bastante mais fascinado pela irmã mais velha dela, a referida Claire. Para satisfazer o seu desejo, Jêrome impõe a si mesmo a decisão de só tocar-lhe no joelho.
Este compromisso minúsculo e o seu cumprimento são-nos contados com tanto rigor quanto o de Hitchcock nas suas histórias de suspense. Ao desdobramento do objeto de desejo (as duas raparigas) corresponde o narrador ao dialogar com a sua confidente como se ela representasse uma parcela de si mesmo. Assim, vivemos por duas vezes as suas tentativas amorosas, ora quando a elas assistimos, ora quando lhas ouvimos narrar.
Na época da estreia do filme toda a imprensa gaulesa celebrou a beleza do filme e reconhecia que ele não aceitava nenhum dos compromissos aparentemente indispensáveis para suscitar a curiosidade dos espectadores.
Rohmer explica à revista «Lettres Françaises»: estes contos morais correspondem à vontade em realizar uma obra de grande fôlego e liberta de todas as contingências. Acredito na vontade do público em acompanhar um pensamento de autor em diversos filmes. Vejam a boa receção aos filmes mais recentes de Bergman, que não passam de variações em torno de um mesmo esquema.
Tenho, pois, a intenção de fazer filmes de autor e afirmá-lo. É evidente que faço os filmes, que gostaria de ver. (…) «O Joelho de Claire» é uma variação musical em que os atores colaboram (chegando alguns a improvisar um pouco!) porque uma rodagem é para mim, a possibilidade de descobrir alguém.
Rohmer conseguia dar a ilusão de se tratar da verdadeira história dos personagens, que a interpretam; Brialy tem uma convincente desenvoltura como enamorado experiente e presunçoso, assim como a sua confidente (a romancista romena Aurora Cornu) é verosímil na sua espontaneidade e inabilidade. O maior desafio, que Rohmer enfrentou, foi com Beatrice Romand no desempenho do papel de Laura, que tinha de conjugar o pudor e a impertinência próprias de uma adolescência insegura.
Todos os personagens parecem estar de férias e a sonharem com o amor. E são magnificamente fotografados por Nestor Almendros que aproveitou as paisagens lindíssimas em torno do lago de Annecy.
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