Alguns dos refugiados, que Portugal acolheu nas últimas semanas, provieram da Eritreia, um dos países do Corno de África, que conhece há vários anos uma implacável ditadura.
O ONU publicou recentemente um relatório sobre o (in)cumprimento dos Direitos Humanos nesse país, confirmando o conhecido já de diversas fontes: o regime escravizou uma boa parte da população, à qual aterroriza, igualmente, com desaparecimentos, torturas, perseguições, violações, assassinatos e outros atos de uma desumanidade inaceitável.
A Comissão responsável pelo relatório abriu assim caminho para confrontar o regime de Issayas Afeworki com o Tribunal Internacional de Haia.
Mas, consiga-se ou não chegar a esse objetivo - o caso de Omarf al-Bachir, ainda no poder no Sudão, demonstra como isso não é fácil - o que as instâncias internacionais têm de discutir é até que ponto estão dispostas a lavar as mãos dos horrores cometidos por tal ditadura. É que, provavelmente, os jovens obrigados a fugir para não serem incorporados anos a fio nas Forças Armadas - forma de os obrigar a trabalho não remunerado ao serviço do regime! - seriam os mais interessados em ficarem na sua terra natal para a ajudarem a desenvolver-se.
Para quem milita na esquerda e, em tempos, apoiou o movimento independentista da Eritreia por o julgar legitimamente interessado em defender o seu povo e libertá-lo da marginalização a que era sujeito pelos etíopes, continuam a suceder-se as desilusões, há muito acumuladas desde que Mugabe no Zimbabwe ou José Eduardo dos Santos em Angola passaram a considerar o poder como algo de muito pessoal, vedado a quem não integra a sua família ou corte de amigos.
Um outro desses casos de desilusão está a verificar-se com a birmanesa Aung San Suu Kyi a quem a ONU não consegue, igualmente, convencer a pôr cobro aos crimes praticados contra a minoria muçulmana designada como Rohingya.
Para quem julga que os crimes mais horrendos têm sido mais recentemente os cometidos pelo Daesh, só pode nisso acreditar por desconhecer o que os budistas fundamentalistas do Myanmar andam a perpetrar contra essa gente pobre, que tem em Alá o seu guia espiritual.
Os crimes, os incêndios de casas, as violações e os roubos fazem parte do clima de terror, que está a acontecer sob o olhar do mundo. Algo que a Prémio Nobel da Paz de 1991 se recusa a fazer travar, muito embora seja ela quem realmente manda no governo hoje instalado em Rangum.
Temos de convir que Mandela constituiu, de facto, uma exceção como líder capaz de manter no poder os valores de que era porta-voz quando estava na oposição. Lutar contra um governo ilegítimo poderá ser admirável, mas evitar tornar-se noutro ditador, quando a relação de forças se inflete, ainda o é muito mais. Nesse sentido Aung San Suu Kyi está a revelar-se a confirmação a uma regra, infelizmente cada vez mais sustentada em factos concretos.
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