Com alguns dias de atraso só agora li a entrevista que o escritor inglês Howard Jakobson deu a Luís Miguel Queirós («Público», 17/6/2016) ao passar por um festival literário na Póvoa do Varzim e em que diz esta frase com que concordo em absoluto: “Quando as pessoas começam a concordar umas com as outras, fico com medo”.
É esse o motivo maior para assumir uma progressiva misantropia na militância política: estou farto de ver o debate conduzido e dominado por quem gosta sobretudo de se ouvir a si mesmo e tenta calar o mais possível os pontos de vista alheios. Ou, em alternativa, quando ele nem sequer é proposto de modo a evitar as divergências, que desmentiriam um cenário de pacificação interna exibido como definitivo.
Apoiando indefetivelmente a forma como António Costa tem conduzido o governo e o projeto por ele vislumbrado como o mais apropriado para o futuro dos portugueses, exprimo as minhas sérias dúvidas sobre a bondade de criar uma ilusória unidade interna, subsequente ao recente Congresso, cativando para os órgãos dirigentes quem, ainda meses atrás, dizia da solução governativa o que Maomé não se atrevia a dizer do chouriço.
Talvez haja no meu sangue algo de origem judaica, por me identificar com a célebre anedota segundo a qual dois hebreus a discutir debatem sempre três pontos de vista opostos entre si.
No debate político eu gosto das coisas bem claras, tipo “pão, pão, queijo, queijo”. Por isso discordo frontalmente dos que me dizem para silenciar o meu desagrado com os pseudo-socialistas, que enchem páginas de prestimosos jornais a fazer campanha contra o que o Partido anda a fazer, como se essa tal ilusão de unidade fosse mais importante do que definir as linhas vermelhas com as quais não é possível tergiversar.
No estado em que as coisas andam na Europa - e as eleições municipais em Itália só confirmaram o descalabro, que significa ver socialistas e sociais-democratas a praticarem as políticas, que os seus opositores de direita não enjeitariam - rejeito a ideia de que ser de esquerda equivale a aceitar as políticas europeístas dimanadas do senhor Schäuble. Ou que, como ainda vejo defendido por alguns desses recém-promovidos dirigentes do PS, aceitar a ideia de que a falta de competitividade dos trabalhadores portugueses se deve a ainda não se terem flexibilizado suficientemente as leis laborais.
É por essa inquietante e pantanosa unidade interna, que receio ver o Partido Socialista incapaz de se mostrar à altura da responsabilidade, que se lhe coloca no atual momento histórico. Uma vez por todas, o PS deveria liderar a mudança na Internacional Socialista no sentido de a tornar numa organização com uma palavra decisiva em tudo quanto se vai passando hoje no mundo. Nomeadamente conseguindo federar em seu torno todas as forças políticas de esquerda dispostas a conquistar democraticamente a liderança das respetivas nações...
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