Quando julgávamos que Paulo Núncio seria personagem menor, que se justificaria deixar remeter para o fundo da nossa cena política, eis que as revelações vão-se sucedendo e dando conta do seu contumaz envolvimento na fuga de capitais para offshores.
A condição de advogado da empresa que pôs a recato grande parte do dinheiro evaporado do BES e das que criaram mais de 120 “sucursais” no registo da Madeira, faz-nos retomar a personagem do operário letrado de Brecht para colocar algumas questões pertinentes:
(1) sendo, pelo tipo de atividade que desempenhava, um advogado dos mais bem remunerados da nossa praça, que “dever patriótico” o terá convencido a ir para o governo de Passos Coelho, sabendo-se o salário que aí auferia? Será que sentiu quanto a troika serviria de biombo para defender mais eficientemente o interesse dos seus clientes?
(2) acaso se confirmem as suspeitas de testa-de-ferro de quem sabia providencial a crise financeira para potenciar os seus interesses gananciosos, que lucro terá Núncio obtido com a prestação desse serviço aos seus clientes? E onde o escondeu?
(3) será que o Ministério Público manterá a característica zarolha de só suspeitar de enriquecimentos estranhos ou também irá vasculhar as contas de quem se confirma a duvidosa seriedade, apesar da expressão de virgem impoluta com que, recentemente, se apresentou na Comissão Parlamentar?
(4) tendo em conta as histórias dos submarinos e do célebre Jacinto Leite Capelo Rego, até onde foram as cumplicidades de Núncio com Portas, certamente quem o convidou para o governo?
(5) até onde irá o descaramento de Assunção Cristas na afirmação de não se tratar de nada que lhe diga respeito, tendo em conta a cumplicidade no governo e no partido com quem se afigura um potencial suspeito de corrupção hiperativa?
(6) poderá Maria Luís Albuquerque assobiar para o lado e fazer de conta que nada tinha a ver com quem era seu subordinado, e por isso lhe deveria testemunhar tudo quanto ia fazendo?
(7) e que dizer de Passos Coelho? Saberá o que significa o conceito de «responsabilidade política» por tudo quanto ia fazendo, mas sobretudo se ia desfazendo à pala do seu (des)governo?
Estas são as questões que o operário letrado gostará de ver respondidas na iminente convocação de Núncio para voltar à Comissão da Assembleia da República. E, no mínimo, vê-lo-emos tão atrapalhado quanto aí se revelou há duas semanas. Esperemos que desta vez com consequências mais incisivas a nível judicial.
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