Com frequência costumo chamar em minha ajuda o personagem do operário letrado, concebido por Bertolt Brecht, por o sabermos com silenciadas respostas óbvias para as perguntas feitas em alta voz, incitadoras de serem respondidas por quem as ouve.
Ao quarto dia deste ano de 2019 há três, que se justificam por traduzirem algumas das singularidades deste incerto tempo, ora a pender para um lado (o do jagunço brasileiro), ora para o outro (o da maioria democrata no Capitólio de Washington).
A primeira tem a ver com Marcelo Rebelo de Sousa: mesmo entre os seus mais indefetíveis apoiantes haverá alguém capaz de encontrar a mínima justificação para ter ido a Brasília avalizar a tomada de posse de um idiota preconceituoso, tão grotesco quanto o que ainda se vai aguentando na Casa Branca? O nosso suposto presidente não se envergonha por ter-se feito fotografar com tal cromo? Nem de o ter considerado merecedor de fraterno tratamento, como se, acaso traduzido no ambiente de uma família tradicional, esse dito «irmão» não tivesse sido já despachado para o manicómio, ou, no mínimo, trancado à chave num quarto dos fundos enquanto se receberiam as visitas?
A segunda pergunta tem a ver com o convite de Goucha a um confesso criminoso nazi para «abrilhantar» o seu programa com as mais soezes alarvidades salazarentas. Que mais será preciso para avançar com profunda merecida barrela nas televisões, que dão tempo de antena a quem não merece, porque nenhuma liberalidade deve ser concedida a quem é contra a Liberdade? Na guerra pelas audiências não há justificação que baste para se escolher a normalização do inaceitável.
A terceira pergunta tem a ver com a réplica lusa do ministro justiceiro do jagunço: sabe-se agora que Carlos Alexandre não viu qualquer conflito de interesses em ser juiz de um caso em que o advogado de um dos réus era o ex-procurador, que lhe emprestara os famosos 10 mil euros e ainda dele os não recebera. Será que o Conselho Superior da Magistratura continuará a meter a cabeça na areia a propósito de quem tão desajustado se mostra quanto à competência para exercer funções para as quais não demonstra as imprescindíveis características éticas? O herói das direitas tem demonstrado em sucessivas ocasiões a identificação com o provérbio, que tem São Tomás como referência: considera que os outros devem comportar-se como diz, mas sem olharem para o que, manhosamente, faz...
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