quarta-feira, 28 de setembro de 2016

Guterres ou Georgieva: tudo em aberto!

Os genes e as experiências de seis décadas de vida tornaram-me num inveterado otimista, mas ainda tenho sérias dúvidas quantos às hipóteses de vitória de António Guterres na eleição para secretário-geral das Nações Unidas.
Claro que me congratulei com as sucessivas votações, que o deram como o candidato mais bem posicionado para assumir o cargo. E toda a sua ação no comando da ACNUR demonstrou-o como o mais bem habilitado em conhecimentos e competências.
Há, porém, um fator que pode levá-lo a fracassar contra a búlgara Georgieva e só colateralmente tendo a ver com nem ser oriundo do Leste Europeu, nem mulher, como andaram uns quantos funcionários das Nações Unidas e da Comissão Europeia a propagandear como requisitos fundamentais para a função.
Esse fator prende-se com o declínio irreversível do Partido Popular Europeu e do resto da direita internacional a ele coligada: se os partidos sociais-democratas já andam há muito a perder apoios eleitorais por não terem encontrado respostas para um mundo cada vez mais financeirizado e globalizado, os que com eles iam alternando nos governos também sofrem do mesmo declínio. Estão a dar espaço à extrema-direita cujo discurso xenófobo e nacionalista poderá encontrar efémero sucesso junto dos iludidos eleitores, condenados a verem essas receitas de governo em causa- mesmo que com custos terríveis para os seus povos, e sobretudo, para as suas franjas mais ostracizadas! - pelo banho da realidade.
É da Dialética, mas também das propriedades das ciências naturais, que provém o ensinamento sobre o fortalecimento dos extremos opostos, quando as propostas contraditórias mais ao centro acabam por enfraquecer. É por isso que à demagogia do Tea Party correspondeu o surpreendente resultado eleitoral de Bernie Sanders, Que a subida do UKIP nas sondagens britânicas é contraposta pela ascensão do sentimento independentista escocês e da vitória de Corbyn nos Trabalhistas. Tal como o surgimento do fenómeno Aurora Dourada na Grécia, potenciou o sucesso do Syriza grego.
Dirão os sofistas: então e onde estão os que na Polónia ou na Hungria se opõem aos ditadores aí aparentemente consolidados no seu poder? E a resposta só pode ser esta: esperem pela volta e vão ver o que acontece a Orban ou às marionetes agitadas por  Kaczyński. O fracasso das suas políticas já lhes prenuncia o funeral.
É perante tudo isso que Merkel e o PPE procuram contrariar o sentido inequívoco da História com a eventual eleição de Georgieva. A sua vitória iludi-los-ia quanto ao adiamento do crepúsculo causado por não terem modelos alternativos a este capitalismo ameaçado de morte.
Enquanto sistema este modelo económico, anteriormente caracterizado pela liberdade dos mercados, mas cada vez mais fundamentado na especulação de capitais, não possui forma de continuar a expandir-se geograficamente. E essa é uma das constatações indubitáveis: se conseguiu dar saltos qualitativos com as suas sucessivas estratégias colonialistas, imperialistas e globalizadoras, já não tem possibilidades de manter a rota do seu imprescindível crescimento. Ademais está perante um planeta exausto, verdadeiramente em perigo, e com forças políticas em ascensão a valorizarem cada vez mais a importância de verem diluídas as desigualdades.
Por tudo isso Merkel precisa de respirar brevemente, depois da asfixia das suas recentes derrotas, embora desconheça como encontrar saída para os labirintos em que se tem desnorteado. Resta saber se os países que votarão em Guterres ou em Georgieva decidirão pela competência ou pela submissão a uma líder política cuja estrelinha da sorte deixou há muito de brilhar.


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