sábado, 4 de agosto de 2012

Livro: «Rio de Sangue» de Tim Butcher (2)


Tim Butcher sabe que não faltarão sérios perigos na viagem entre o Lago Tanganica e a foz do rio Congo.  Um deles é representado pelos mai-mais, gente agressiva e bem armada, descritos como assassinos perigosos, que não obedecem a ninguém a não ser a eles próprios.
O termo por que são conhecidos refere-se à «água mágica» em que os seus elementos se banham depois de supostamente impregnada de propriedades especiais pelos seus feiticeiros. A partir daí acreditam que as balas sobre eles disparadas caem no chão sem sequer os ferirem.
Há também a contar com os Interahamwes desgarrados a vaguearem pelo território congolês depois de terem protagonizado o genocídio dos tutsis ruandeses em 1994.
- Acredite, você não ia gostar nada de se encontrar com os Interahamwes! - avisa-o um representante local da ONU.
Se a tudo isso acrescentar que só contará com a ajuda de um pigmeu de metro e meio de altura e peso inferior a metade do seu, pode-se compreender o quão periclitante representa essa viagem para o jornalista inglês, que confessa: Foi nessa altura que os meus joelhos começaram a fraquejar!.
E, no entanto, Tim sabe que gerações de africanos têm sofrido a vitória do desapontamento sobre as potencialidades, criando o único continente do nosso planeta onde as normais regras de desenvolvimento e de progresso humanos simplesmente não se aplicam!
Bom conhecedor do continente ele lembra que nos primeiros meses em que trabalhei em África, os infortúnios contemporâneos do Congo, tornaram-se-me evidentes. Era no Congo que se desenrolava a guerra mais sangrenta do mundo. Iniciara-se em 1998 e custava a vida a um milhar de pessoas todos os dias perante a indiferença total do mundo ocidental. Por isso Tim, que já estivera em cenários de guerra na Croácia, na Bósnia, no Kosovo, na Serra Leoa ou no Iraque, sente-se motivado para a sua extensa viagem de mais de três mil quilómetros. Para tentar compreender a sua perplexidade: para mim, o Congo continua a ser um totem do continente falhado de África. Possui maior potencial do que qualquer outra nação africana, mais diamantes, mais ouro, mais rios navegáveis, maior quantidade de terras agrícolas. E é exatamente a sensação daquilo que o Congo poderia ser que torna mais pungente o seu fracasso.
Anteriormente Tim estivera duas vezes no Congo como correspondente do «Daily Telegraph»: na primeira cobrira com imensas dificuldades o assassinato do presidente Kabila, quando o caos imperava nas ruas. Da segunda vez, a confusão não era menor, mas tinha causas naturais: a erupção do vulcão situado por cima de Goma. Eu começara a acreditar agora que o Congo possuía uma sina estranha para más notícias. De certa forma, não constituía surpresa que a pior erupção vulcânica em África em várias décadas tivesse de acontecer aqui. A corrente de lava poderia ter tomado inúmeras direções ao descer do cume da montanha, danificando apenas a floresta tropical, mas dirigira-se diretamente para a rua principal de Goma, engolindo a catedral católica da cidade e cortando ao meio a pista de aterragem do aeroporto.
Todas essas razões justificaram as tentativas frustradas de familiares e amigos de Tom em dissuadirem-no de encetar tal projeto: Recusei render-me aos pessimistas, que me enviavam artigos dos jornais escritos durante visitas aos projetos de ajuda humanitária no leste do Congo. Quase sempre estes artigos eram férteis em relatos de canibalismo, magia negra, mutilações e ilegalidades...

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