Tenho-me socorrido, amiúde, das palavras escritas por Baptista Bastos nas crónicas semanais no «Diário de Notícias» e no «Jornal de Negócios».
Reconheço nele o grande escritor, que nos valeu alguns dos mais interessantes romances do último meio século. E também a fibra de quem sempre andou de espinha direita sem se vergar a imposições quer de inimigos políticos, quer dos próprios amigos que pretendiam dele a fidelidade seguidista em vez da coerência dos princípios.
A crónica de hoje do jornal do grupo Covina expressou, porém, o lado que menos aprecio em Baptista Bastos: a tendência para se deixar medinacarreirar!
Senão vejamos: nada a contestar quando ele afirma que somos diariamente mentidos, bombardeados com falsidades, conhecemos os escândalos privados e ignoramos as públicas virtudes. Culpa óbvia desses comentadores, que ocupam intermináveis tempos de antena a sempre repetirem as mesmas mentiras, na expetativa de as verem ganhar a validade das verdades absolutas.
Mas que, segundo diz, caímos sempre nas esparrelas que nos montam, já me parece pouco provável.
Povo de brandos costumes quando nos deixamos amodorrar pelo discurso embalador dos apaniguados do poder vigente, somo-lo decerto. Mas, quando despertamos é para avançarmos sem freio contra as amarras a que nos quiseram aperrear. Que o digam os derrotados pelo movimento de massas do 25 de Abril de 1974 ou os monárquicos da primeira década do século XX.
Daí que discorde dos parágrafos seguintes em que Baptista Bastos mantém a pose de Cassandra: regozijamo-nos com os desaires do vizinho; com o facto de um velho amigo ter perdido o emprego; cumprimos os rituais da caridade cristã colocando no saco contra a fome uma garrafa de azeite e uma embalagem de arroz.
Perdemos a decência, essa é que é essa! E não vejo que, nos tempos mais próximos, consumidos pelo infortúnio, esgarçados pela desgraça, consigamos mudar o destino.
Neste blogue a lógica dos ventos semeados por estes políticos a mando dos banqueiros, dos especuladores financeiros e dos retalhistas pressupõe, que eles implicarão grandes tempestades. E estas não afetarão apenas os que sempre têm sido carne para canhão das crises fomentadas sempre pelos mesmos suspeitos do costume. Também estes se descobrirão incapazes de manterem incólumes as raízes com que se julgam bem estivados contra todas as circunstâncias. Arrastando-os para o vortex de um tempo que se esgota para dar lugar a outro totalmente diferente.
A bonança que, inevitavelmente, se sucederá à tempestade, que paira sobre as nossas cabeças, poderá ser regeneradora e trazer o renascimento de uma fénix utópica que, sem o conseguirem, quiseram reduzir a cinzas...
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