No seu discurso em Évora perante jovens militantes socialistas, Edite Estrela situou a polémica sobre a RTP numa outra vertente de análise que explicita melhor o alerta para as consequências de tal possibilidade na qualidade da democracia: com a concessão da RTP e o acabar do serviço público de televisão e de rádio, essa influência pode ainda ser reforçada ao nível da propriedade e do comentário. Eu sou pelo pluralismo e pelo serviço público de televisão.
É que a exemplo do que se passa na Hungria aonde Victor Orban conseguiu desalojar o Partido Socialista do Governo e impor modelos de controlo da informação já próprios de uma ditadura, a estratégia de Relvas e de Passos Coelho é imitá-lo na tentativa de influenciar a opinião pública de forma a mantê-la passiva para a sua estratégia ideológica. Um bom exemplo pode ser o que vem sucedendo há vários dias: tal como o primeiro-ministro no inefável discurso no Algarve, António Borges voltou agora a «brilhar» com a previsão de fartas distribuições de benesses já no próximo ano. Isto quando Vítor Gaspar é obrigado a corrigir para mais de 5% o valor do défice e mendiga compreensão à troika, predispondo-se a apertar ainda mais o cinto aos contribuintes. Estamos, pois, na velha fórmula nazi de como se pode transformar em «verdade» uma mentira mil vezes repetida.
Não se pode, pois, dar inteira razão a Viriato Soromenho Marques, quando comenta no «Diário de Notícias» que o ministro Relvas é o contrário do Rei Midas. Em vez de ouro, tudo aquilo em que ele toca fica transformado numa espessa trapalhada cor de chumbo. A privatização, aliás "concessão", da RTP deixou de ser um assunto sério para descer ao nível rasteiro das coisas venais.
O que está em causa é muito mais do que uma coisa venal: é uma séria ameaça, que tem de ser impedida se não quisermos regressar à claustrofobia tenebrosa do Portugal salazarento.
Mas não é só a cúpula do Governo, que quer regressar a tempos, que, porém, nunca voltarão como desejaria. Um ministro como Nuno Crato não se cansa de inventar “transformações” educativas, que só teriam cabimento nesse passado de que ele se mostra entusiástico seguidor. E até um comentador insuspeito como André Macedo, que nunca vimos arriscar opiniões muito dissociadas do tradicional centrão, é obrigado a reconhecer no «Diário de Notícias» que Nuno Crato vive preocupado em exibir autoridade. Quer chumbar, punir, travar. Vê a escola como um centro de exclusão, não como espaço de desenvolvimento de competências sociais, culturais e técnicas - com regras, competição e exigência. Não tem um plano educativo desempoeirado: sofre de reumatismo ideológico. Engaveta os alunos. Encolhe o País. Reduz a riqueza.
Num dia em que vemos Clint Eastwood predispor-se a apoiar o candidato republicano contra Obama tudo incita ao pessimismo. Mas a História multiplica-se em exemplos de como do mais negro dos contextos renasce a alegria transformadora da revolta dos humilhados e ofendidos...
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