Faz todo o sentido regressar ao livro do Tim Butcher publicado há quatro anos atrás por uma das subsidiárias da Random House, e surgido logo a seguir entre nós em edição da Bertrand.
Afinal ainda está bem próxima a notícia do assassinato de umas dezenas de mineiros na África do Sul, precisamente pelos mesmos motivos porque a República Democrática do Congo não conhece tréguas nas sucessivas guerras civis por que tem passado nos últimos anos: riquezas naturais importantes, uma classe política incipiente e extremamente corrupta, utilizada como marionete pelos interesses das multinacionais ocidentais, que colhem a fatia mais substancial dos lucros ali criados. Como ele esclarece, todo o país tinha sido efetivamente retalhado por três fações armadas, explorando vários recursos naturais, como diamantes, ouro e cobalto. (…)
Nas chamadas «minas» vingava um processo brutalmente primitivo, que envolvia efetivamente trabalho escravo, arrancando o minério à terra para o expedirem com destino a compradores gananciosos do mundo civilizado, que pagavam em dinheiro. (pág. 43)
Por isso, mais do que temerário, o seu projeto de percorrer todo o curso do Rio Congo desde a nascente junto ao Lago Tanganica até à foz no Atlântico, era suicida. Em Agosto de 2004 reservei lugar num voo de Joanesburgo para o Congo, redigi o meu primeiro testamento e dei à Jane um beijo de despedida. (pág. 46)
Mas para nós leitores, Butcher, procede a um bom enquadramento histórico da descoberta da sua embocadura por Diogo Cão, em 1482, quando a Coroa lusa apostava em encontrar além-mar os recursos, que escasseavam no pequeno retângulo à beira-mar plantado: Diogo Cão virou a sua pequena caravela em direção à foz e cautelosamente começou a subir o rio mais poderoso de África.
Um marinheiro instalado na proa do navio informava da imensa profundidade da água e a caravela teve de lutar contra a poderosa corrente de oito nós que corria em direção ao mar.
Depois de se ter debatido rio acima ao longo de vários quilómetros a partir da foz, desembarcou na margem esquerda, ou sul, do rio e parte da sua tripulação pôs pé em terra: foram os primeiros europeus a pisar o solo congolês. (pág. 50)
Diogo Cão descobria um prodigioso fenómeno natural como até então se desconhecia completamente: Ao chegar ao mar, o “rio que engole todos os rios” despeja no oceano um volume de água doce maior do que qualquer outro rio no mundo, com exceção do Amazonas.
Possui ainda outra particularidade extraordinária. Ao contrário de outros sistemas fluviais importantes, o caudal do Congo mantém-se estável ao longo de todo o ano.
Outros rios - até mesmo alguns importantes, como o Nilo e o Amazonas - possuem uma estação seca e uma estação húmida, conforme o caudal cresce ou diminui, mas o caudal do Congo é constante.
A captação de águas provém de ambos os lados do equador, o que significa que, durante todo o ano, pelo menos parte do sistema fluvial conhece uma estação húmida, pelo que na foz o caudal é prodigioso e permanente. (pág.51)
Mas a Coroa estava pouco interessada em belezas criadas pela Natureza: como o comércio de escravos ainda tardaria a implantar-se, os descobridores portugueses pouco se atardaram nas imediações do rio, seguindo por diante, primeiro a caminho do Cabo, e depois da Índia. Era o rico negócio das especiarias, que D. João II, e depois D. Manuel, estavam desejosos de sonegar aos venezianos.
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