Até onde evoluirá a crise francesa numa altura em que Laurent Joffrin, diretor do «Libération», vê o Macron orgulhoso da sua verticalidade, irremediavelmente, horizontalizado, quase vencido em KO no ringue? Os recuos nas decisões, que haviam estado na origem do movimento social, já não bastam para travar a dinâmica com características insurrecionais, e será inevitável que se desligue do bode expiatório mais à mão: o primeiro-ministro Edouard Philippe, condenado a vestir a fatiota de cordeiro oferecido à imolação para acalmar a fúria divina manifestada pela ira popular.
Ter-lhe-á saído furada a estratégia de anular toda as forças de esquerda e de reduzir a influência das direitas para ficar a sós no confronto com Marine Le Pen,. Teria todos os democratas como reféns, votando nele sem nada receberem em troca, apenas pelo temor de verem a megera da extrema-direita aceder ao Eliseu. Agora os riscos são muito sérios, mesmo que não queiramos aceitar o prognóstico da jornalista brasileira Rosana Pinheiro Machado, que encontra um paralelismo evidente entre este movimento dos coletes amarelos e as grandes manifestações brasileiras de 2013, que redundaram no que se sabe.
Carlos Matos Gomes alinha na mesma lógica: “este movimento é clássico nas ações para criar um clima pré-insurrecional a que se seguirá um pedido de ordem. Isto é, virá um momento em que as jaquetas se transformarão em albardas!”
Para quem vai lendo a evolução dos acontecimentos sob auspícios pessimistas o que vem acontecendo em França, na Andaluzia, no Brasil, em Itália ou nos Estados Unidos com movimentos contestatários infiltrados por gente de extrema-direita, ou a eleição democrática de quem está muito longe de o ser -, tem fundamento na incapacidade do neoliberalismo em aumentar a riqueza das nações, obrigando-se a empobrecer a maioria para sustentabilizar o contínuo enriquecimento dos plutocratas apostados em manterem o status quo, que se vem traduzindo numa realidade assustadora: oito famílias detêm hoje tanta riqueza quanto 50% da população mundial. Explica então Chris Hedges: “O neoliberalismo transforma a liberdade de muitos em liberdade para alguns. O resultado lógico é o neofascismo. O neofascismo abole as liberdades civis em nome da segurança nacional e classifica grupos inteiros como traidores e inimigos do povo. É o instrumento militarizado usado pelas elites dominantes para manter o controlo, dividir e separar a sociedade e acelerar ainda mais a pilhagem e a desigualdade social. A ideologia dominante, não sendo mais crível, é substituída pela bota militar.”
Vivemos tempos complicados, mas o desiderato pode não ser o prognosticado por tais analistas. A corda puxada para um lado, tende a ceder para o lado contrário com força equivalente. Ora já estamos fartos de, sobretudo a partir da destruição do muro de Berlim, ela pender há demasiado tempo para um dos lados. Há que reequilibrar a relação de forças na luta de classe puxando-a decididamente para o outro...
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