A evidência já estava demonstrada nas semanas anteriores, mas a nova manifestação parisiense dos «coletes amarelos» confirma o veredito óbvio: o que está em causa não é esta ou aquela reivindicação em particular, mas o mal-estar da maioria da população causado por este capitalismo crepuscular, que a tende a empobrecer, não lhe dando expetativas de dias mais bonançosos. O aproveitamento desse descontentamento pelos extremismos mais à direita, ou mais à esquerda é, tão-só, a espuma de uma vaga, que ameaça submergir os frágeis equilíbrios dos últimos anos.
O cenário, só do agrado dos niilistas, denuncia a ausência de uma narrativa, que possa ser agarrada pelos milhões de descontentes de forma a saberem para onde querem ir como lá devem chegar.
Completamente desnorteados pela evolução de um mundo que não compreendem e os faz sentir empurrados por violenta enxurrada, sem nada a que se agarrarem, os desesperados querem tudo e o seu contrário, apresentando-se como cordeiros para a degola dos populistas, ansiosos por afirmarem-se como os garantes de uma ordem perdida.
Neste capitalismo apocalítico as esquerdas estão a furtar-se à responsabilidade de apresentarem soluções credíveis e tornarem-se na bússola orientadora de quem se sente à deriva. Há nelas quem ainda acredite nas virtudes dos mercados libertos de constrangimentos, como se não fossem eles os fautores dos desequilíbrios, que tendem a transferir para a Ásia a riqueza anteriormente melhor distribuída nos países ocidentais. Esses são os mais perigosos vendilhões de ilusões, porque elogiam os encantos de uma suposta social-democracia, que deixou de fazer sentido desde que os Trinta Gloriosos Anos tiveram o seu toque de dobre de finados.
Há os defensores da possibilidade de ser reatado o percurso interrompido em 1989 com a queda do muro de Berlim sem quererem tirar as lições do que se tornou num paquidérmico monstro burocrático e autoritário.
E há os que confundem esses dois modelos já ultrapassados e propõem um rodízio ideológico tão confuso, que não se lhes consegue depreender mais do que vão revelando nos seus exercícios de navegação à vista.
Há ainda quem vá dando ideias consistentes - e Picketty fê-lo há um par de anos com algum mérito! - mas tardam a ser assimiladas num tronco estruturado de pensamento, que seja credível a quem anseia encontra-lo.
Estamos, pois, condenados a uma sucessão de governos, mais ou menos fascistas, mas breves na sua duração, porque o ricochete, que sofrerão por não terem nada de novo a oferecer como panaceia, depressa os despejará para o tal caixote do lixo da História (vide as manifestações deste fim-de-semana na Hungria contra a nova Lei do Trabalho, crismada pelos contestatários como mais aparentando às da escravatura!).
Surgirá enfim a evidência de que, nem quem trabalha, nem o próprio planeta - progressivamente insustentável! -, aguenta muito mais tempo com este sistema capitalista, que tem de ser demolido antes de a todos condenar a atroz distopia...
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